17 de set. de 2009

doenças osseas

Raquitismo
RAQUITISMO É UMA DOENÇA ÓSSEA caracterizada pela diminuição da
mineralização da placa epifisária de crescimento e a osteomalacia é caracterizada pela
diminuição da mineralização do osso cortical e trabecular, com acúmulo de tecido
osteóide não mineralizado ou pouco mineralizado. São processos que, em geral,
ocorrem associados. Após o fechamento da cartilagem epifisária, ao término do
crescimento, apenas a osteomalacia permanece.
A formação e o crescimento ósseo dependem da produção da matriz óssea, composta
principalmente por colágeno, e de sua mineralização através da deposição dos cristais
de hidroxiapatita, compostos basicamente de cálcio e fósforo. A falha do processo de
mineralização tem como uma das principais causas, a inadequada concentração
extracelular desses íons, e a falta ou comprometimento da ação dos elementos
responsáveis por sua absorção, particularmente a vitamina D.
A vitamina D no organismo é proveniente da dieta e, principalmente, da sua síntese na
pele a partir da conversão do 7-dihidrocolesterol, sob a ação do calor e dos raios
ultravioleta. Circula ligada à proteína (DBP) e 2 enzimas citocromo P450 mitocondriais
participam de sua bioativação. No fígado, a 25 hidroxilase, cataliza a hidroxilação do
C25, produzindo a 25 hidroxi-vitamina D (25OHD), que é a forma mais abundante na
circulação. Transportada ao rim, é convertida em 1,25 dihidroxi-vitamina D
[1,25(OH)2D] pela ação da 1α-hidroxilase.
Classificação relacionada à concentração de Ca (cálcio), P (fósforo) e vitamina D:
Vitamina D
Redução dos metabólitos circulantes
Exposição insuficiente à luz ultra-violeta
Vitamina D insuficiente na dieta
Síndromes de má absorção
Metabolismo anormal
Hepatopatias crônicas
Insuficiência renal crônica
Acidose sistêmica
Uso de Anticonvulsivantes
Genéticas
Dependente de vitamina D tipo I: mutações no gene da enzima 1α hidroxilase (12q
13), autossômica recessiva (19-27).
Dependente de vitamina D tipo II ou Resistente à vitamina D: mutações no gene do
receptor da vitamina D (12q 14), autossômica recessiva (28-31). Defeitos da proteína
transportadora da vitamina D - DBP (4q) ou do seu receptor (megalina) (32,33).
• Fosfato
Perda renal: tubulopatias, S. Fanconi, oncogênica (fator humoral fosfatúrico -
fosfatonina)
(34-36).
Síndromes
de

absorção
Medicamentos: antiácidos (hidróxido de alumínio).
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Genéticas
Hipofosfatêmico ligado ao cromossomo X (Xp 22): mutações no gene PEX (37-39).
Hipofosfatemia autossômica recessiva, ou dominante (12p 13) (36,41).
Hipofosfatemia com hipercalciúria (3,36)
• Cálcio
Baixa ingestão (1,42)
Síndromes de má absorção
• Defeitos primários da mineralização
Hereditários: hipofosfatasia autossômica recessiva ou dominante (1p 36) (43-45).
Adquiridos: uso de medicamentos como fluoretos, etidronatos, alumínio, chumbo.
Quadro Clínico
Apesar da existência de características específicas, as principais manifestações clínicas
são semelhantes nos diferentes tipos de raquitismo e osteomalacia, sendo mais
precoces nos casos hereditários. Os primeiros sinais e sintomas podem surgir desde o
1° ano de vida e progredir com a idade, principalmente nas regiões de
desenvolvimento mais rápido. Há atraso no fechamento das fontanelas cranianas, no
crescimento, e no desenvolvimento motor; fronte olímpica, craniotabes, retardo na
erupção dos dentes, que apresentam estrias, maior propensão às infecções e
hipoplasia do esmalte. O abaulamento da junção costo-condral determina o
aparecimento do sinal conhecido como rosário raquítico. Os ossos longos apresentam
extremidades alargadas, encurvamentos, genu varo ou valgo, coxa vara. A coluna
vertebral pode apresentar deformidades em "S", cifose, escoliose e acentuação da
lordose lombar. As fraturas não são freqüentes. Outros sintomas são hipotonia,
fraqueza muscular e dores. Convulsões decorrentes de hipocalcemia, assim como os
sinais de Chvostek e Trousseau, são características dos raquitismos dependentes de
vitamina D. A alopecia parcial ou total está presente em 2/3 dos pacientes com
raquitismo dependente de vitamina D tipo II. As infecções respiratórias são freqüentes,
principalmente quando a deformidade torácica é acentuada. Os casos adquiridos
ocorrem em qualquer faixa etária, e os adultos apresentam osteomalacia com fraqueza
muscular, dores e deformidades progressivas em coluna vertebral e nos membros
inferiores.
Radiologia
O raquitismo é caracterizado por epífises e inetáfises alargadas, "em taça", com linhas
de mineralização irregulares, sem contornos definidos e atraso na maturação. Nas
demais regiões observam-se os sinais de osteomalacia, com osteopenia generalizada,
encurvamento dos ossos longos, varismo ou valgismo em membros inferiores, pseudo-
fraturas (zonas de Looser) que são mais freqüentes em colo de fêmur, omoplata e
púbis, fraturas, deformidades na caixa torácica e coluna vertebral: vértebras
bicôncavas, cifoescoliose, lordose acentuada. Flutuações na severidade da doença
durante o crescimento, resultam no aparecimento de linhas radiodensas, paralelas à
metáfise. Nos casos dependentes de vitamin D, com hiperparatiroidismo secundário,
há áreas de reabsorção subperiosteal e cistos.
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Histologia
O raquitismo é caracterizado por alterações na placa epifisária de crescimento, onde a
zona de hipertrofia está alongada e com desorganização da arquitetura das colunas
celulares. A calcificação é retardada ou ausente, a vascularização é irregular através de
canais defeituosos. A camada esponjosa das metáfises mostra barras de cartilagem
não calcificada. O quadro histológico da osteomalacia mostra alterações da
mineralização no osso cortical e trabecular, com aumento da espessura osteóide
(superior a 15µm), deficiente marcação da frente de mineralização com tetraciclina,
diminuição da velocidade de mineralização (MLT - intervalo de tempo de mineralização
- superior a 100 dias). Nos quadros dependentes de vitamina D há áreas com sinais de
ação osteoclástica aumentada.
Raquitismo Hipofosfatêmico
Descrito por Albright em 1937, como uma forma de raquitismo resistente à vitamina D,
por esta ser necessária em doses elevadas para o tratamento. No entanto, atualmente,
o termo resistente caracteriza o raquitismo dependente de vitamina D tipo II. Formas
autossômicas recessiva ou dominante (12p-13) foram descritas, mas o raquitismo
hipofosfatêmico com transmissão dominante ligada ao cromossomo X é o mais comum.
O gene responsável pela patologia está localizado em Xp22-1 e foi denominado gene
PEX ou PHEX -gene regulador do fosfato, com homologia à família das endopeptidases
neutras, localizado no cromossomo X. Sua estrutura consiste de 22 exons que
codificam uma proteína com 749 aminoácidos. Os membros desta família possuem um
domínio amino-terminal intracelular, um único domínio transmembrana e um domínio
maior, extracelular, carboxi-terminal, com 10 resíduos de cisteína conservados. Cerca
de 31 mutações (missense, nonsense ou deleção) foram descritas até o momento
nesse gene, associadas ao raquitismo hipofosfatêmico e 6 casos de polimorfismo.
Vários genes participam da homeostase do P. Sua reabsorção, na borda em escova do
túbulo contornado proximal renal, é feita pelo cotransportador de Na e P (NPT2), cujo
gene codificador está localizado no cromossomo 5 (5q35). O NPT2 sofre ação
inativadora da fosfatonina, um hormônio peptídeo, produzido provavelmente pelos
hepatócitos, cuja estrutura molecular não está totalmente identificada. O transplante
de rins de ratos normais para ratos hipofos-fatêmicos e, também, a realização de
parabiose entre eles, evidenciou a perda de fosfato pelos rins anteriormente normais,
caracterizando a existência desse fator humoral fosfatúrico. A fosfatonina participa
também do metabolismo renal da 1,25(OH)2D através da inibição da enzima 1a-
hidroxilase ou do aumento do seu catabolismo pela ação da enzima 24 hidroxilasc.
Quadro bioquímico: pela redução da reabsorção tubular de P (RTP) verifica-se aumento
da fosfataria e hipofosfatemia. As concentrações séricas de Ca, PTH e 25OHD são
normais. A 1,25 (OH)2D está "inapropriadamente" normal. Os níveis séricos de
fosfatase alcalina e osteocalcina, enzimas produzidas pelos osteoblastos, estão
elevadas. A calciúria está diminuída ou normal. Mais raros são os casos de
hipofosfatemia com hipecalciúria. A concentração urinária de hidroxiprolina, produto do
catabolismo do colágeno, está aumentada. O AMPc urinado, reflexo da atividade do
PTH, está normal.
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Osteomalacia Oncogênica
É uma síndrome rara, caracterizada pela presença de um tumor, associado à RTP
diminuída e à osteomalacia. As alterações bioquímicas e os quadros clínico e
histológico revertem com a retirada do tumor, o qual secreta um fator humoral
fosfatúrico e inibidor da atividade da enzima 1a-hidroxilase, com redução da síntese de
1,25(OH)2D. Esse fator humoral seria a fosfatonina, ou seja, o mesmo que participa da
patogênese do raquitismo hipofosfatêmico, que envolve o gene PEX, previamente
analisado. Larga variedade de tumores em ossos e tecidos moles foi encontrada
associada à patologia: mesenquimais, angiosarcomas, hemangiomas, condrosarcomas,
carcinoma de próstata, schwanoma, osteoblastoma, tumores neuroendócrinos e
mistos. Muitas vezes o diagnóstico é difícil, pois são pequenos e de crescimento lento,
não podendo ser localizados ou totalmente removidos. Determinam o aparecimento da
osteomalacia, em geral, como doença óssea adquirida na fase adulta, sendo menos
freqüente na infância. Além do exame físico, a pesquisa envolve todos os exames
diagnósticos por imagem: ultrassonográficos, radiológicos e cintilográficos
(particularmente com octreotídeo).
Hipofosfatasia
É um tipo raro de raquitismo e osteomalacia, caracterizado pela redução da atividade da
fosfatase alcalina tecidual não específica, principalmente em fígado, osso e rim. É
determinada por mutações no gene que codifica a enzima fosfatase alcalina localizado em
1p36 (43-45). Pode se expressar em qualquer fase da vida, inclusive no período
intrauterino e perinatal, quando causa redução da mineralização óssea, polihidrâmnio,
membros curtos e deformados, podendo ser letal. A forma infantil é transmitida através de
herança autossômica recessiva e pode estar associada à hipercalcemia, insuficiência renal e
aumento da pressão intracraniana. A forma que se expressa no adulto pode ter transmissão
autossômica dominante e os níveis séricos de Ca e P são normais. Não é claro se a doença
óssea é devida a um defeito qualitativo na molécula da fosfatase alcalina, somente, ou se
há um defeito generalizado na função do osteoblasto. O gene humano da fosfatase alcalina
consiste de 12 exons, sendo a proteína codificada pelos exons 2 a 12. Cerca de 20
mutações (missense ou deleções) foram identificadas, comprometendo exons distintos, não
sendo possível relacionar o ponto de mutação com a forma da doença. Há 3 hipóteses para
explicar o comprometimento da mineralização: incapacidade de concentrar o fosfato
inorgânico, acúmulo de pirofosfato inorgânico e a perda das pontes entre as fibras de
colágeno e as vesículas da matriz.
Envelhecimento
As alterações no metabolismo da vitamina D verificadas com o avanço da idade são
atribuídas à redução da capacidade de síntese cutânea, redução da hidroxilação
hepática e renal, redução da concentração e função dos receptores intestinais e da
absorção intestinal, associada à menor exposição solar e menor ingestão de vitamina
D. Em nosso serviço, o estudo histomorfométrico ósseo através de biópsia de crista
ilíaca em pacientes idosos com fratura de colo de femur, revelou a presença de
osteomalacia em 2 dos 8 indivíduos analizados. Salientamos a importância do
diagnóstico diferencial com a osteoporose.
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Quadro Bioquímico: há redução da concentração sérica de 25OHD e 1,25(OH)2 D, com
tendência à hipocalcemia, hipocalciúria, hiperparatiroidismo secundário, aumento dos
níveis séricos de fosfatase alcalina e redução da fosfatemia.
Raquitismo e Osteomalacia Nutricionais
Não é comum o diagnóstico de raquitismo nutricional por simples deficiência de
vitamina D ou de Ca em nosso meio. Os casos podem ser subclínicos, com
comprometimento apenas do crescimento, limitados a alterações histológicas ou não
pesquisados. Todavia, a principal fonte de vitamina D no organismo é a síntese
cutânea pelos raios solares, e não a alimentar. Assemelha-se ao raquitismo
dependente de vitamina D tipo I, embora menos acentuado. Pode se instalar em
qualquer faixa etária e responde facilmente ao tratamento com doses baixas de
vitamina D. O nível sérico de 25OHD está reduzido, embora o nível de 1,25(OH)2D
esteja mantido devido a estimulação da enzima 1α-hidroxilase pelo PTH.
Tratamento
A prevenção do raquitismo e osteomalacia, é feita com a ingestão de alimentos que
contenham Ca, P e vitamina D e com a exposição à luz solar. Para pacientes cujo
quadro se instalou pela falta desses fatores, a correção da dieta e a exposição diária à
luz solar, em geral, são suficientes, podendo o tratamento ser auxiliado com lâmpadas
de raios ultra-violeta. As quantidades diárias recomendadas na dieta são: vitamina D
400 UI (10µg), Ca 1000 a 1500 mg e P 400 a 1000 mg.
Para pacientes com terapia anti-úlcera ou gastrite por tempo prolongado, recomenda-
se a substituição de medicações que contenham hidróxidos de alumínio por omeprazol,
ranitidina ou cimetidina.
O tratamento medicamentoso, nos casos hereditários, baseia-se na etiopatogenia do
raquitismo e deve ser iniciado precocemente para evitar a progressão das
deformidades ósseas. Está indicada a avaliação clínica e a análise laboratorial dos
familiares, principalmente crianças. A dose e a freqüência de administração de
medicações devem ser ajustadas para cada caso, dependendo dos níveis séricos de Ca,
P e fosfatase alcalina e dos níveis urinários de Ca, basais e evolutivos. Quando são
administrados derivados da vitamina D, a avaliação periódica da bioquímica urinária
também é importante para previnir a hipercalciúria. O tratamento, em geral, não
corrige satisfatoriamente o ritmo de crescimento, as deformidades ósseas e as
alterações metabólicas.
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Osteoporose
Osteoporose é um sério problema mundial. Admite-se que a incidência anual mundial
da fratura de quadril crescerá de 1.26 milhões em 1990 para 2.6 milhões, em 2025 e
4.5 milhões, em 2050. Estudos baseados em dados hospitalares de países como
Colômbia, Chile, Brasil, México, Panamá, Peru e Venezuela relatam entre 40 e 362
fraturas de quadril por 100.000 pessoas com mais de 49 anos. Com base em dados do
IBGE de 1994, calcula-se que no Brasil existam 2.5 milhões de indivíduos
osteoporóticos e que ocorram 105 mil casos de fraturas de quadril anuais, resultando
num custo aproximado de 630 milhões de reais.
Osteoporose é conceituada como "uma doença caracterizada por deteriorização
microarquitetural do tecido ósseo, com redução da massa óssea em níveis insuficientes
para a função de sustentação, tendo como conseqüência elevado risco de fratura.
Cerca de 50% das pacientes com fratura do quadril perdem a habilidade para viver
independentemente e até 20% morre em 6 meses. Existem vários fatores
considerados de risco para osteoporose: sexo feminino, etnia branca ou asiática,
história familiar, menopausa precoce; função ovariana reduzida antes da menopausa
(amenorréia da atleta, hiperprolactinemia, anorexia nervosa, etc); inadequações
dietéticas (alto consumo de cafeína; baixa ingestão de cálcio); estilo de vida
inadequado (sedentarismo, abuso de álcool, tabagismo).
A evidência para certos fatores de risco é melhor documentada do que para outros,
sendo que a influência dos fatores varia entre os indivíduos. No geral, o uso dos
fatores para predizer o risco de fratura apresenta limitações. Estudo transversal
nacional com 473 mulheres menopausadas mostrou prevalência de 14,7% de
osteoporose, que esteve associada a variáveis como menor escolaridade, maior idade,
menarca tardia, menopausa mais precoce e menor índice de massa corpórea.
Metodologia (artigo científico)
Foi realizado estudo transversal, de março a junho de 1998, por meio da análise do
resultado de 999 densitometrias ósseas consecutivas feitas em laboratório privado da
cidade de São Paulo. Todas as mulheres procuraram espontaneamente o serviço por
indicação do seu médico (em geral ginecologista). Foram incluídos no estudo apenas
os resultados dos exames das mulheres com mais de 49 anos de idade. Formulário
contendo dados sócio-demográficos e do estilo de vida foi aplicado, por pessoa
treinada, antes da realização do exame. Os dados pesquisados incluíam: dados sócio-
demográficos e reprodutivos (etnia, idade, menarca, peso, altura, IMC, calculado a
partir da fórmula IMC= peso/altura2, amenorréia, tempo de amenorréia em anos) e
estilo e hábitos de vida (sedentarismo, freqüência de atividade física por semana,
tabagismo, consumo de café, número de cigarros fumados e xícaras de café
consumidas por dia). O formulário contemplava questão sobre uso de Terapia de
Reposição Hormonal (TRH) (tipo e duração em meses) e histórico de fraturas prévias.
A densitometria óssea foi realizada com aparelho da marca Lunar, com avaliação do
sítio femoral e coluna lombar. A Densidade Mineral Óssea (DMO) foi mensurada por
técnica de absorciometria de dupla feixe de raio X (DEXA). Osteoporose foi definida
como diminuição da massa óssea de pelo menos 2.5 desvios padrão, em relação à
média de massa óssea do adulto jovem, de acordo com curva padrão, no exame
densitométrico do fêmur ou do quadril.
A prevalência de osteoporose foi estimada, conjuntamente com o intervalo de
confiança. Estimaram-se as OR (Odds Ratios ou Razão de Chance), e os intervalos de
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confiança de 95%, na avaliação da associação entre osteoporose (desfecho) e demais
variáveis explicativas (fatores de risco). A análise univariada foi realizada por meio do
teste de chi-quadrado de Pearson ou chi-quadrado de tendência, quando indicado. Na
análise multivariada, foi utilizada a regressão logística, considerando candidatas, as
variáveis com p<= 0,20. Um valor de p < dp="8,5)." dp ="1,7)," dp=" 8,6)," dp=" 4,73)." p="0,06)"> 30,0) e negras apresentam redução do risco de osteoporose superior a 90%. A
menarca tardia (após 16 anos) dobrava o risco do desfecho.
Antes de discutirmos os resultados cabem algumas considerações sobre as limitações
do estudo. Primeiro, trata-se de estudo longitudinal que limita considerações sobre
relação causa-efeito. Não podemos distinguir casos de osteoporose primária
(osteoporose pós-menopáusica e a osteoporose senil) das osteoporoses secundárias,
em geral decorrentes de outras doenças e fatores, como distúrbios endócrino-
metabólicos, afecções reumatológicas, renais, digestivas, neoplásicas e uso de certas
medicações (corticóides, anticonvulsivantes, antiácidos, entre outros). Assim, os
resultados não podem ser generalizados para outros grupos de mulheres. As mulheres
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desta amostra são encaminhadas por seus respectivos ginecologistas ou clínicos para
avaliação da DMO, segundo seus critérios clínicos, os quais não constam da nossa
análise. Por se tratar de laboratório privado de análise clínicas e de imagem pode se
supor que estas mulheres apresentem nas suas histórias clínicas fatores de risco para
osteoporose, o que gerou o pedido do exame densitométrico. Neste caso, a prevalência
de osteoporose deve estar superestimada em relação a outros grupos populacionais.
Deve-se considerar também que por se tratar de laboratório privado, que atende
mulheres que possuem planos de assistência médica, o perfil sócio-demográfico desta
amostra não são representativos de outros grupos de mulheres brasileiras. No entanto,
osteoporose neste segmento, conforme demonstram os resultados do presente estudo,
também é problema muito prevalente. Segundo, nossos resultados baseiam-se em
dados colhidos por meio de entrevista. Muitas mulheres podem ter tido dificuldades em
lembrar de certos dados. Mais ainda, mulheres que eventualmente tenham
conhecimento do diagnóstico de osteoporose tenderiam a lembrar mais dos chamados
fatores de risco, tais como fraturas prévias e uso de TRH, aumentando a força da
associação entre as variáveis estudadas e osteoporose. O questionário utilizado
abordou os principais fatores de risco para osteoporose. Apesar de não conter dados
sobre duração dos hábitos pessoais, ele reflete uma situação atual vivida pelas
mulheres, que na maioria das vezes, são indicativas de seus hábitos pregressos.
Finalmente, o número de dados perdidos (missing) variou de acordo com as variáveis
explicativas, sendo que idade da menarca, etnia e tempo de amenorréia, com 945, 956
e 982 registros, respectivamente, apresentaram maior número de informações
perdidas. No entanto, a porcentagem de dados perdidos foi de no máximo 4,3% do
total, como no caso da variável idade da menarca (43 dados perdidos). Apesar destas
limitações, o tamanho da amostra e a adoção de critério padronizado para diagnóstico
densitométrico de osteoporose, em exame realizado pela mesma equipe, são aspectos
positivos do presente trabalho.
Sobre a técnica utilizada, a medida da DMO pelo DEXA é segura, acurada e precisa.
Meta-análise com cerca de 90000 pessoas/ano de observação analisou a habilidade da
mensuração da DMO em predizer fraturas. Os autores concluíram que a medida da
DMO pode predizer a fratura, mas não é capaz de identificar o indivíduo que terá o
problema, não recomendando programa sistemático de rastreamento de osteoporose
para mulheres menopausadas. A utilização de modelos preditores de fratura que
incluam a medida da DMO, com dados antropométricos é defendida por vários autores.
O tema é controverso e a proposta de reservar a medida da DMO para a população
que apresente fatores de risco também é criticada por Sheldon. O autor questiona
aspectos ligados à equação custo-benefício para realização da mensuração da DMO,
argumentando que não existem dados que apóiem a visão de que as decisões acerca
do tratamento da osteoporose, que incluam o resultado da medida da DMO, melhorem
os resultados ou reduzam os custos. Parece haver consenso entre os autores de que
embora a DMO associe-se claramente ao risco de fratura na mulher idosa, outros
fatores clínicos são também importantes preditores de risco longa duração. Estratégias
preventivas devem incluí-los.
Sobre os fatores clínicos de risco, os resultados do presente estudo mostram a
importância dos dados sócio-demográficos e medidas corporais. Dados de outros
estudos destacam os mesmos aspectos. Estudo com 5195 mulheres com mais de 64
anos, na Espanha mostrou que os principais fatores de risco foram menopausa precoce
(< or=" 2,67," or="2,31," or="2,29," normal="40" 24="25%)."> 35)
Doença mieloproliferativa
Contraceptivo – TRH
Câncer em atividade
Puerpério (até 4 semanas)
QT – RT – T. Hormonal
Aborto recorrente
Fonte – Paciente Crítico Diagnóstico e Tratamento p. 75 2006.
Tabela 3 – Evidências para a profilaxia da TVP em pacientes não cirúrgico.
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Afecção
Profilaxia
Evidência
Infarto Agudo do Miocárdio IAM
Heparina – HBPM –
Fibrinolitico – anti - agregantes
I
Acidente Vascular Cerebral
Isquêmico
HNF – enoxaparina
IA
Acidente Vascular Cerebral
Hemorragico
Preconiza-se a utilização de
meios físicos
IIIC
Insuficiência cardíaca Congestiva
– III e IV
Heparina não fracionada e
enoxaparina
IA
Insuficiência Respiratória Aguda -
DPOC
Enoxaparina
IA
Doenças infecciosas agudas
Enoxaparina
IA
Neoplasia
Enoxaparina – varfarina -
III
Pacientes internados na UTI
Heparina não fracionada –
heparina sub cutânea
IIB
TVP e TEP prévio
Enoxaparina HBPM
IIB
Veias Varicosas
Enoxaparina
IIB
Imobilidade
Enoxaparina
IB
Obesidade
Não estabelecida
IIIC
Dentre os procedimentos cirúrgicos, é realizada uma avaliação de risco, relacionada diretamente ao
procedimento cirúrgico a ser efetuado, onde:
- Alto risco: engloba a cirurgia geral em pacientes acima de 60 anos, cirurgia geral em pacientes entre
40 e 60 anos com fatores de risco adicionais, grandes amputações, cirurgias ortopédicas de grande porte,
cirurgia de grande porte em pacientes com história de TEP e TVP pregressa ou trombofilia e cirurgia de
grande porte em pacientes com neoplasia maligna
- Médio risco: engloba as cirurgias de grande porte (abdominal, urológica ou ginecológica) em pacientes
entre 40 e 60 anos, cirurgia abdominal ou ginecológica em pacientes com menos de 40 anos em uso de
estrógeno;
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- Baixo risco: engloba as cirurgias de pequeno porte (com duração inferior a 30 minutos sem
necessidade de repouso prolongado) em pacientes com mais de 40 anos de idade e cirurgias em pacientes
com idade inferior a 40 anos sem outros fatores de risco associados.
É importante salientar que qualquer paciente submetido a internação hospitalar, deve ser avaliado através
de critérios de elegibilidade para prevenção de TEP e TVP, onde existem critérios próprios de estado clínico
do paciente como também os que e relacionam ao procedimento cirúrgico proposto.
Resultados
Álvares F. preconiza que durante o tratamento do TEP o paciente deve ser mantido em ambiente
hospitalar devendo ser fornecido terapêutica com oxigenioterapia a analgesia quando houver necessidade.
Hirsh et al comparou métodos de prevenção para TVP em pacientes com cirurgias ortopédicas de grande
porte e conclui em seu trabalho que a profilaxia com meios farmacológicos é mais efetiva nas cirurgias do
quadril e ressalta a importância da associação com uso de compressão pneumática intermitente.
Kaempffe em seu estudo com 149 pacientes submetidos a artroplastia do quadril e joelho, onde, dividiu
em dois grupos um com profilaxia farmacológica e outro com compressão pneumática intermitente.
Conclui uma equivalência entre os dois meios de profilaxia.
Nos estudos de Marques 1998 e Álvares 2003 o uso de heparina é essencial para inibição do crescimento
do trombo, sendo que sua administração deve ser endovenosa, com uma dose de ataque seguida de
manutenção por infusão contínua. Sua administração deve ser mantido por um mínimo de cinco dias não
devendo ser suspensa até se atingir níveis adequados de aiticoagulação oral (INR > 2,0). Após o quinto ou
sétimo dia de heparina deve ser iniciado o anticoagulante oral (varfarina), desde que o paciente não tenha
apresentado sinal de sangramento excessivo ou queda nos exames complementares hematócrito com
queda maior que 10 pontos, no período de 5 dias.
Na literatura ainda não há um consenso sobre a melhor heparina (HNF ou HBPM) a ser utilizada no
tratamento do TEP, sendo que por enquanto ambas possuem uma equivalência quanto sua eficácia.
Cassone e colaboradores comentam em seu estudo que a recomendação geral para os pacientes com
cirurgias de baixo risco é a utilização dos meios não farmacológicos com movimentação ativa dos
membros inferiores, deambulação precoce, uso de meias elásticas com média compressão ou a
compressão pneumática intermitente. Para os pacientes com risco moderado e alto recomenda-se
associação dos meios farmacológicos e não farmacológicos. Baruzzi e Cassone também evidenciam que o
filtro de veia cava é indicado para os pacientes com alto risco e com contra indicação para a terapia
farmacológica.
Segundo Agu 1999, Vanek 1998, Wells 1994 e Wille-jorjensen em 1996, comentam que a meia elástica
especial para prevenção da trombose venosa profunda pode ser utilizada nos doentes com risco moderado
e alto em associação com uso de medicamentos. Evidenciam também que a meia para ser útil deve ter
compressão graduada (30 e 40 mmHg) e ser ajustada ao tamanho do membro inferior do paciente.
Para Crenshaw, A.H., 1996, muitos cirurgiões preferem métodos fisioterapêuticos na prevenção de TVP e
TEP pois são bastante tolerados pelos pacientes e não trazem os riscos de anticoagulação profilática, e
que o uso de compressão pneumática intermitente também pode ser utilizado para a prevenção de TVP.
Page 38
Fleming et al demonstrou um aumento do fluxo sanguíneo da veia femoral comum em 102,8% através de
exercícios ativos de flexão plantar e dorsal em posição de trendelenburg reverso. McNally et al observou
um aumento do fluxo sanguíneo venoso em média de 22% com a realização de exercícios metabólicos
ativos em pacientes submetidos à cirurgia de prótese total de quadril.
Sochart e Hardinge demonstraram que os movimentos ativos combinados (flexão e rotação de tornozelo)
produzem um aumento médio de 38%, com pico 58% na velocidade do fluxo sanguíneo venoso, sendo
estes valores significativamente maiores que o pico e fluxo médio produzidos pelos exercícios passivos, 20
e 30% respectivamente.
Em 2001, foi realizado o sexto consenso da conferência de terapia anti-trombótica, padronizando algumas
sugestões profiláticas de acordo com o risco da ocorrência dos fenômenos tromboembólicos. De acordo
com o consenso, indivíduos que se enquadram no grupo considerado de alto risco (submetidos a grandes
cirurgias com idade superior a 60 anos, artroplastia de quadril ou joelho, fraturas de quadril ou de MMII,
ou que tenham apresentado traumas extensos e/ou lesão neurológica, principalmente trauma
raquimedular), devem ser submetidos a cuidados gerais, tais como: deambulação ativa precoce e/ou
movimentação ativa/passiva, elevação dos pés do leito, meias elásticas de compressão graduada;
compressão pneumática intermitente; heparina convencional (5000 UI SC de 8/8 h); exógeno heparina
(40 mg/SC/dia) ou nadroparina (100 UI/Kg SC/ dia até o 3° dia e 150 UI/Kg SC/ dia após o 3° dia).
Aqueles considerados como, grupo de risco intermediário ou moderado (submetidos a pequenas cirurgias
com idade entre 40 a 60 anos, artroscopia de joelho, quimioterapia, ou que tenham apresentado
congestão pulmonar, insuficiência respiratória, uso de contraceptivos orais, paraplegia, tromboembolismo
pulmonar prévio e/ou trombofilia), devem ser submetidos aos seguintes cuidados: deambulação ativa
precoce e/ou movimentação ativa/passiva, elevação dos pés do leito, meias elásticas de compressão
graduada, heparina convencional (5000 UI SC de 12/12 h); exógeno heparina (20mg/dia) ou nadroparina
(100 UI SC/dia). Para pacientes considerados como de baixo risco (submetidos a laparoscopia, repouso no
leito superior a 3 dias, ou que apresentem obesidade, veias varicosas, gravidez, pré-parto e/ou idade
avançada) são recomendados os seguintes cuidados: deambulação ativa precoce e/ou movimentação
ativa/passiva, elevação dos pés do leito e meias elásticas de compressão graduada; não é recomendado o
emprego de qualquer forma de heparina ou profilaxia medicamentosa.
Discussão:
Baseado na literatura estudada, observamos que a Trombose Venosa Profunda e o Tromboembolismo
Pulmonar são possíveis complicações existente em nosso meio. A interação entre os profissionais
Page 39
intensivistas contribuirá muito com a prevenção destes eventos na UTI. Conhecemos diversos meios de
prevenção farmacológicos e não farmacológicos para a doença, onde teremos que indicar a profilaxia no
momento que antecede a possível complicação. A história da moléstia pregressa, os níveis de evidência
dos estudos mais recentes e os protocolos de atendimento nos indicará a terapêutica mais eficaz para
determinado caso. Os estudos levantados, as metanálises abservada nos deixam claro que a área tanto de
prevenção, conscientização dos profissionais que atuam diretamente com o paciente potencialmente grave
assim como os meios diagnósticos estão bem avançados e discutidos entre nós de maneira satisfatória. A
Unidade de Terapia Intensiva nos representa um local especial dentro do complexo hospitalar, todo ato
que realizamos em nosso paciente nos leva a pensar que podemos ser muito mais do que um simples ato
oferecendo assim um maior conforto e uma melhor qualidade de vida.
Bibliografia
Page 40
Duque, F.L.V.; Mello N.A.; Trombogênese – Trombofilia. J. Vasc. Br 2003, 2 (2): 105 – 18. Sociedade
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Kawabata, S.V. e cols. Paciente critico – diagnóstico e tratamento, profilaxia da trombose venosa profunda
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Crenshaw, A.H. Cirurgia Ortopédica de Campbell – I edição. São Paulo.
Atualização do consenso brasileiro no diagnóstico e tratamento
da artrite reumatóide.
Page 41
Descrição do Método de Cpleta de Evidências
Reunião consensual contando com a participação de médicos reumatologistas da
Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR). O texto tomou como base o trabalho
realizado por representantes da SBR, publicado em 2004 na revista brasileira de
reumatologia (Artrite Reumatóide: Diagnóstico e Tratamento), acrescido da
experiência de reumatologistas e complementado por revisão bibliográfica.
GRAU DE RECOMENDAÇÃO E FORÇA DE EVIDÊNCIA
A: Estudos experimentais e observacionais de melhor consistência.
B: Estudos experimentais e observacionais de menor consistência.
C: Relatos de casos (estudos não controlados).
D: Opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em consensos, estudos fisiológicos ou
modelos animais.
Introdução
A artrite reumatóide (AR) é uma doença auto-imune de etiologia desconhecida,
caracterizada por poliartrite periférica, simétrica, que leva a deformidade e destruição
das articulações em virtude de erosões ósseas e da cartilagem(1)(D). Afeta mulheres
duas a três vezes mais do que homens, e sua prevalência aumenta com a idade.
Em geral, a AR acomete grandes e pequenas articulações em associação com
manifestações sistêmicas como: rigidez matinal, fadiga e perda de peso. Quando
envolve outros órgãos, a morbidade e a gravidade da doença são maiores, podendo
diminuir a expectativa de vida em cinco a dez anos(2)(D).
Com a progressão da doença, os pacientes com AR desenvolvem incapacidade para
realização de suas atividades tanto de vida diária como profissional, com impacto
econômico significativo para o paciente e para a sociedade(2)(D).
Diagnóstico
O diagnóstico depende da associação de uma série de sintomas e sinais clínicos,
achados laboratoriais e radiográficos(3)(B)
Critérios clínicos e laboratoriais
A orientação para diagnóstico é baseada nos critérios de classificação do Colégio
Americano de Reumatologia (ACR)(3)(B):
Page 42
1. Rigidez matinal: rigidez articular durando pelo menos uma hora.
2. Artrite de três ou mais áreas: pelo menos três áreas articulares com edema de
partes moles ou derrame articular, observado pelo médico.
3. Artrite de articulações das mãos (punho, interfalangeanas proximais e
metacarpofalangeanas).
4. Artrite simétrica.
5. Nódulo reumatóide.
6. Fator reumatóide (FR) sérico.
7. Alterações radiográficas: erosões ou descalcificações localizadas em radiografias
de mãos e punhos.
Os critérios de 1 a 4 devem estar presentes por pelo menos seis semanas.
Orientação para classificação: Quatro dos sete critérios são necessários para classificar
um paciente como tendo AR(3)(B).
Observação: pacientes com dois ou três critérios não são excluídos da possibilidade do
futuro desenvolvimento da doença, não sendo considerados, contudo, para inclusão
nesse protocolo.
Artrite Reumatóide Inicial
Não há uma definição consensual para AR inicial. A maioria dos autores valoriza a
duração dos sintomas, sendo mais freqüentemente mencionado o período de menos de
três meses a um ano. A possibilidade de AR deve ser considerada com base na
presença de sinovite persistente afetando pelo menos três articulações, ou dolorimento
à compressão das metacarpofalangeanas ou metatarsofalangeanas ou rigidez matinal
de pelo menos trinta minutos(4)(A). Esses pacientes deverão ser avaliados por médico
com experiência no manejo da doença o mais rapidamente possível, o qual poderá
indicar o uso de drogas modificadoras do curso da doença (DMCD) mesmo na ausência
dos critérios de classificação do ACR. O diagnóstico e o tratamento da AR devem ser
feitos tão breve quanto possível, idealmente entre seis semanas e três meses, com
objetivo de induzir remissão e evitar dano radiológico(5,6)(A).
O FR deve ser utilizado para o diagnóstico de AR (sensibilidade de 60% a 80%), mas
tem baixa especificidade, podendo estar presente em outras doenças reumáticas,
infecções e em indivíduos idosos. Por outro lado, o anticorpo antipeptídeo citrulinado
cíclico (anti-CCP), cuja sensibilidade é similar à do FR, é um teste de alta
especificidade e maior custo, podendo ser solicitado nos casos de dúvida diagnóstica,
principalmente nos casos de FR negativo(7)(B).
Ressalta-se que um teste negativo para FR e anti-CCP não afastam o diagnóstico de
AR, especialmente nas fases iniciais(8)(A).
Avaliação Inicial(2)(D)
Page 43
Além de uma história e um exame físico completos, a avaliação inicial do paciente com
AR deve documentar sintomas de atividade da doença, estado funcional, evidências
objetivas de inflamação articular, problemas mecânicos articulares, presença de
comprometimento extra-articular e de lesão radiográfica(2)(D) (Quadro 1). Especial
atenção deve ser dirigida para a identificação dos parâmetros sugestivos de mau
prognóstico (Quadro 2).
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Avaliação Da Atividade Da Doença(2)(D)
Recomenda-se que o médico avalie a atividade da doença preferencialmente em
período não superior a dois meses até a obtenção de um estado de remissão ou baixa
atividade de doença. Reavaliações subseqüentes ficarão a critério do médico-
assistente, com intervalos de cerca de três meses. Os exames radiográficos das mãos,
dos punhos e dos pés devem ser repetidos anualmente, a critério clínico, para avaliar a
progressão ou não da doença(2)(D).
Os parâmetros principais sugeridos estão no quadro 3.
Sugere-se avaliação objetiva da atividade da doença utilizando um dos índices
compostos de atividade clínica (SDAI, CDAI, DAS ou DAS 28)(9-14)(A). Ver tabelas 1 e 2.
Page 45
Os exames radiográficos das mãos, dos punhos e dos pés devem ser repetidos
anualmente ou, a critério clínico, em intervalos menores, para avaliar a progressão ou
não da doença(2)(D).
Page 46
Tratamento
O diagnóstico precoce e o início imediato do tratamento são fundamentais(15)(A) para o
controle da atividade da doença e para prevenir incapacidade funcional e lesão
articular irreversível(2)(D).
Os objetivos principais do tratamento do paciente com AR são: prevenir ou controlar a
lesão articular, prevenir a perda de função e diminuir a dor, tentando maximizar a
qualidade de vida desses pacientes(2)(A). A remissão completa, apesar de ser o
objetivo final do tratamento, raramente é alcançada(2)(D).
O tratamento começa com a educação do paciente e de seus familiares sobre sua
doença, as possibilidades de tratamento, com seus riscos e benefícios(2)(D). O
acompanhamento multidisciplinar é necessário, preferencialmente sob a orientação do
reumatologista(2)(D).
O tratamento da AR deve ser considerado um processo dinâmico, sendo
constantemente reavaliado. As decisões quanto ao planejamento terapêutico devem
ser sempre compartilhadas com o paciente(2)(D).
A avaliação por um reumatologista é altamente recomendável quando o médico
responsável pelo paciente não se sentir seguro no tratamento da doença(2)(D).
TRATAMENTO NÃO-MEDICAMENTOSO
Medicina Física E Reabilitação No Tratamento Da Ar
Considerando o potencial incapacitante da AR, o acompanhamento desses pacientes do
ponto de vista funcional deve ocorrer desde o início da doença com orientação ao
paciente e programas terapêuticos dirigidos à proteção articular, à manutenção do
estado funcional do aparelho locomotor e do sistema cardiorrespiratório(2)(D).
Fisioterapia e terapia ocupacional contribuem para que o paciente possa continuar a
exercer as atividades da vida diária(2). A proteção articular deve garantir o
fortalecimento da musculatura periarticular e adequado programa de flexibilidade,
evitando o excesso de movimento e privilegiando as cargas moderadas(2)(D).
O condicionamento físico, envolvendo atividade aeróbica, exercícios resistidos,
alongamentos e relaxamento, deve ser estimulado observando-se os critérios de
tolerância ao exercício e à fadiga(2)(D).
Restrição dos movimentos – órteses – tem como objetivo aliviar as dores
mioarticulares por estabilização articular, contenção e realinhamento. Sua utilização
deve ser intermitente, exceção feita às órteses para os pés.
O papel do repouso e do exercício deve ser enfatizado, reconhecendo-se que a
degeneração articular na AR é maior quando o repouso é prolongado. A estratégia
terapêutica deverá contemplar períodos alternados de atividades e repouso, este
sempre em posição funcional(2)(D).
Tratamento Medicamentoso
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A terapêutica do paciente varia de acordo com o estágio da doença, sua atividade e
gravidade(15)(A).
Sintomáticos
Para o controle da dor e do processo inflamatório articular o uso de antiinflamatórios
não hormonais (AINHs)(2)(D), associado ou não a doses baixas de glicocorticóides (até
no máximo 15 mg de prednisona), é um importante adjuvante à terapêutica de
base(16,17)(A). Pacientes que usarão glicocorticóides por tempo prolongado (mais de três
meses) devem receber suplementação de cálcio (1.500 mg/cálcio elementar) e
vitamina D (400 – 800 UI) e serem avaliados quanto à osteoporose. Se necessário o
uso de agentes anti-reabsortivos deve ser considerado(18)(D).
Não existem estudos mostrando diferença da eficácia entre os diversos AINHs
disponíveis. Há necessidade de individualizar a escolha de acordo com os fatores de
risco de cada paciente. Os inibidores seletivos de COX-2, de custo mais elevado,
apresentam menos efeitos adversos gastrintestinais (2) 2(D). Com relação aos efeitos
cardiovasculares, os estudos demonstram risco aumentado tanto para os inibidores
seletivos quanto para os AINHs tradicionais, de forma que todos os AINHs devem ser
empregados em menores dose e tempo necessários(19,20)(B).
O uso de opióides pode ser necessário em alguns pacientes(2)(D).
Infiltrações com glicocorticóides estão indicadas nos casos de mono ou oligoartrites
persistentes(2)(D).
Drogas Modificadoras Do Curso Da Doença (Dmcd)
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Drogas modificadoras do curso da doença (DMCD) (Tabela 3) devem ser indicadas
para todo paciente a partir da definição do diagnóstico de artrite reumatóide(2)(D).
a) Hidroxicloroquina, em comparação com placebo, foi eficaz, reduzindo os parâmetros clínicos e
laboratoriais (VHS) analisados, embora isoladamente não alterasse a progressão
radiográfica(21)(A). Resultados similares foram observados com cloroquina(22)(C), a qual tem a
vantagem de ser de baixo custo. São contra-indicadas em pacientes que apresentem
alterações retinianas e de campo visual(2)(D).
b) Sulfasalazina é considerada mais efetiva que o placebo na redução da atividade da doença, no
controle da dor e na avaliação clínica global(23)(A). Recentemente, confirmou-se sua eficácia
clínica e interferência sobre a progressão radiográfica(24)(A). Está contra-indicada em pacientes
com história de hipersensibilidade a sulfas, salicilatos ou a qualquer componente da fórmula
da sulfasalazina, portadores de porfiria, obstrução de aparelho digestório ou geniturinário.
c) Metotrexato é considerado a DMCD melhor tolerada(25)(A). Sua capacidade de reduzir sinais e
sintomas de atividade da AR e melhora no estado funcional foi demonstrada(25)(A). Também
bloqueia a progressão das lesões radiográficas(24)(A). Atualmente vem sendo considerado
fármaco padrão no tratamento da AR(2)(D). Recomenda-se que a dose inicial seja de 10 mg a
15 mg/semana. Caso não se observe melhora ou controle da doença com a dose inicial, deve-
se aumentar progressivamente a dose após cada 4 – 6 semanas de tratamento até alcançar a
dose máxima(2)(D).
Está contra-indicado em pacientes com insuficiência renal, hepatopatias, etilismo, supressão
da medula óssea e em mulheres em idade fértil que não estejam fazendo anticoncepção. Deve
ser usado com cautela em pacientes com pneumopatias. Sugere-se que a administração do
metotrexato deva ser associada ao uso de ácido fólico (1 – 2 mg/dia) para minimizar efeitos
adversos(2)(D).
d) Leflunomida melhora a atividade de doença, a qualidade de vida(26)(A) e reduz a progressão
radio-lógica(24)(A). Está contra-indicada em mulheres em idade fértil que não estejam
utilizando métodos anticoncepcionais(2)(D), como também em pacientes com insuficiência
renal e hepatopatias(2)(D). Em casos de intoxicação pode ser utilizada a colestiramina na
dosagem de 4 a 8 gramas/3 vezes ao dia, durante cinco dias(2)(D).
e) Azatioprina é uma opção terapêutica(27)(A), entretanto seu perfil de efeitos adversos coloca-a
como uma alternativa em casos excepcionais(14)(D). É contra-indicada em mulheres grávidas.
f) Ciclosporina é eficaz na artrite reumatóide(28)(A). Está contra-indicada em pacientes com
alteração da função renal, hipertensão não controlada e malignidade. Sua toxicidade,
entretanto, limita sua utilização para pacientes com doença não-responsiva a outras
DMCD(28)(A). Se houver o desenvolvimento de hipertensão e aumento de creatinina em 30%
do valor basal, deve ser realizada redução de 25% a 50% da dose. Persistindo hipertensão e
aumento de creatinina, o tratamento deve ser descontinuado(29)(A).
A relação benefício–toxicidade dos diversos DMCDs demonstra que o metotrexato é a
droga de eleição para o tratamento inicial na maioria dos pacientes com AR(2)(D).
Tratamento Da Artrite Reumatóide Inicial(2)(D)

Avaliar o uso de antiinflamatórios não-hormonais e analgésicos;
Page 49

Iniciar DMCD
(metotrexato/cloroquina/hidroxicloroquina/sulfasalazina/leflunomida);

Considerar o uso de glicocorticóide em baixa dose, por via oral, ou infiltração
intra-articular.
Tratamento Evolutivo(2)(D)
Não havendo resposta clínica com doses máximas toleradas de MTX ou na presença de
efeitos adversos, recomenda-se a troca ou, preferencialmente, o uso de combinações
de DMCD. As combinações mais utilizadas são MTX com cloroquina, com sulfasalazina
ou a associação dessas três drogas(30)(A). Pode-se considerar a possibilidade de uso de
MTX com leflunomida(31)(B) ou MTX com ciclosporina(29)(A).
Na presença de manifestações extra-articulares graves podem-se utilizar altas doses
de glicocorticóides por via oral (1 – 2 mg/kg/dia) ou na forma de pulsoterapia(2)(D). A
utilização de ciclofosfamida fica restrita àqueles casos de maior gravidade(2)(D) (Figura
1).
Agentes Biológicos Ou Novas Dmcd
Encontram-se disponíveis comercialmente no Brasil agentes modificadores da resposta
biológica:
- Bloqueadores de TNF: adalimumabe, etanercepte e infliximabe;
- Depletores de linfócito B: rituximabe;
- Moduladores da co-estimulação: abatacepte.
Estão indicados para os pacientes que persistam com atividade da doença, apesar do
tratamento com pelo menos dois dos esquemas propostos no item "Tratamento
evolutivo"(32,33)(D). Recomenda-se que o uso desses fármacos seja indicado e
monitorado por um reumatologista(33)(D). Seu custo elevado e a administração por via
parenteral limitam sua utilização de forma mais ampla(33)(D).
Adalimumabe:
Dose: 40 mg administrados por via subcutânea uma vez a cada duas semanas; pode
ser utilizado como monoterapia ou associado ao MTX. O uso combinado com o MTX
mostrou ser seguro e propiciou rápido benefício no controle da atividade da doença,
comparado ao uso combinado de placebo e MTX(34)(B); também mostrou ser seguro e
benéfico quando associado a outras DMCDs(35)(B).
Etanercepte:
Dose: 25 mg administrados por via subcutânea duas vezes por semana; pode ser
utilizado como monoterapia ou associado a MTX. Os benefícios e a segurança se
mantiveram durante os seis meses de tratamento(36)(B); a associação com o MTX se
mostrou bem tolerada e resultou em benefício adicional comparado ao uso de MTX
isolado(37)(B).
Infliximabe:
Dose: 3 mg/kg administrados via intravenosa, seguida da mesma dose (3 mg/kg) nas
segunda e sexta semanas e, a seguir, a cada oito semanas(32)(D). Deve
Page 50
preferencialmente ser utilizado com metotrexato(33)(D) (dose maior ou igual a 7,5
mg/semana)(38,39)(B), podendo, também, ser associado com leflunomida ou azatioprina,
quando houver contra-indicação ao uso de metotrexato(40).
Contra-indicações dos bloqueadores de TNF:
Contra-indicado em mulheres grávidas ou que estejam amamentando, insuficiência
cardíaca congestiva classe III e IV, em vigência de infecção ativa ou em pacientes com
alto risco para o desenvolvimento de infecções (úlcera crônica de membros inferiores,
artrite séptica nos últimos 12 meses), infecções pulmonares recorrentes, esclerose
múltipla, e em pacientes com doenças malignas atuais ou passada (menos de dez
anos)(33)(D). Em virtude da alta prevalência de tuberculose em nosso meio e dos
relatos de reativação desta, esses agentes devem ser empregados com extrema
cautela em pacientes com susceptibilidade ou história prévia de tuberculose,
recomendando-se, pelo menos, radiografia de tórax antes do início da
terapêutica(41)1(D). Tratamento profilático pode ser considerado(32)(D).
Monitoramento: acompanhar o surgimento de sinais de infecção.
Em termos de eficácia, não existem dados que permitam afirmar a superioridade de
qualquer um dos três agentes anti-TNF no tratamento da artrite reumatóide(42)(B).
Rituximabe:
Indicado em pacientes com AR em atividade moderada à severa que tiveram falha
terapêutica ao agente anti-TNF(43)(A). O rituximabe é administrado na dose de 1.000
mg em duas infusões endovenosas num intervalo de 15 dias, cada infusão é
acompanhada da utilização de 100 mg de metilprednisolona endovenosa 30 minutos
antes, um grama de paracetamol e anti-histamínico para diminuir a gravidade e a
freqüência das reações infusionais.
Na artrite reumatóide, é utilizado preferencialmente em associação com o metotrexato,
podendo ser utilizado em monoterapia(43)(A).
Os indivíduos com boa resposta ao tratamento podem ser submetidos a novo curso de
rituximabe, caso reativem a doença(44)(B).
Os eventos adversos mais freqüentes são as reações infusionais que atingem 35% dos
pacientes na primeira infusão e cerca de 10% dos pacientes na segunda infusão.
Dentre os eventos adversos graves, foram observadas infecções graves em
aproximadamente 2% dos pacientes que utilizaram rituximabe(43)(A).
Embora os estudos até o momento não tenham mostrado um aumento da ocorrência
de casos de tuberculose, recomenda-se a realização de triagem para infecção latente.
É também mandatário rastreamento para hepatite B e C. Até o momento, não existe
evidência que o uso de rituximabe esteja associado ao aumento de tumores sólidos na
artrite reumatóide(45)(D).
Abatacepte:
Page 51
Recentemente foi aprovado pela U.S. Food and Drug Administration (FDA) e pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitára (Anvisa) para o uso em artrite reumatóide
ativa com falha terapêutica a DMCD ou aos agentes anti-TNF. Pode ser utilizado
associado aos DMCD ou como monoterapia. Não deve ser administrado
concomitantemente ao agente anti-TNF, pois essa associação apresenta mais
infecções, incluindo infecções graves(46)(A). O abatacepte deve ser administrado como
infusão endovenosa, durante 30 minutos, na dose de 500 mg nos pacientes com
menos de 60 kg, 750 mg nos pacientes entre 60 e 100 kg e 1.000 mg nos com mais
de 100 kg. A dose seguinte deve ser administrada duas a quatro semanas após a dose
inicial, depois a cada quatro semanas(46)(A).
Troca de agentes biológicos anti-TNF:
Pode ser feita a troca de um agente biológico por outro, nas seguintes
condições(47,48)(B):
A. Ausência na resposta ao tratamento inicial;
B. Perda da resposta obtida no decorrer do tempo;
C. Presença de eventos adversos.
Tratamento Cirúrgico Da Artrite Reumatóide
CONSIDERAÇÕES(2)(D)
1. Pode haver indicação de tratamento cirúrgico em pacientes portadores de
artrite reumatóide em situações nas quais medidas clínicas e fisioterápicas não
produzam controle dos sintomas e/ou não permitam níveis mínimos aceitáveis
de AVD (trabalho, atividades domésticas, deambulação por 30 minutos,
independência).
2. No caso de indicação de tratamento cirúrgico, este deve ser feito precocemente.
Não se deve aguardar comprometimento de várias articulações para então
definir intervenção cirúrgica.
3. Artroplastias de quadril e joelho indicadas precocemente apresentam resultados
melhores que aquelas indicadas nas fases mais tardias.
4. Operações bilaterais devem ser feitas na mesma seção cirúrgica em caso de
deformidades acentuadas de quadris e joelhos.
5. Testes de avaliação de qualidade de vida são altamente recomendáveis para
avaliação
da
indicação
cirúrgica
dos
pacientes.
TIPOS RECOMENDADOS DE TRATAMENTO CIRÚRGICO(2)(D):
1. Sinovectomia
Sinovite por mais de seis meses, resistente ao tratamento conservador
Ausência de instabilidades grosseiras.
2. Correção de tendões + sinovectomia
3. Dsebridamento articular + ressecção artroplástica
4. Artrodese
5. Artroplastias totais
Referências Bibliográficas
Page 52
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Fibromialgia
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A fibromialgia é uma síndrome musculoesquelética crônica, caracterizada por dor
generalizada de etiologia ainda não completamente esclarecida. É definida pelo Colégio
Americano de Reumatologia (ACR) como dor generalizada há pelo menos três meses
em combinação com a sensibilidade em 11 ou mais dos 18 pontos sensíveis à palpação
localizados em várias partes do corpo, conhecidos como tender points.
A complexidade de fatores envolvidos, tanto na questão do diagnóstico quanto na
abordagem adequada pelos profissionais de saúde, mostra a necessidade de mais
estudos que se proponham a ampliar o entendimento das temáticas vivenciadas por
esses pacientes. De acordo com Masi, White e Pilcher, modelos conceituais e
metodologias de pesquisa ainda não se encontram suficientemente desenvolvidos para
investigar algumas condições subjetivas ligadas à dor na fibromialgia.
Questionar a dor, avaliá-la, bem como a necessidade de mensurá-la, foi percebida no
trabalho assistencial com esses tipos de pacientes, surgindo assim a motivação para o
desenvolvimento de estudo que tivesse a proposta de fazê-lo de maneira mais precisa,
fidedigna e clara, no intuito de, a partir disso, vislumbrar estratégias de atuação
profissional mais adequadas na atenção e no manejo da dor percebida.
Para Goldenberg, na realização de investigações de fenômenos complexos, a aplicação
de técnicas metodológicas múltiplas possibilita melhor avaliação e compreensão deles.
Assim, com variadas formas de coleta de dados, alcança-se acesso mais amplo à
complexidade do fenômeno.
Com base nessas colocações, foram estabelecidos objetivos do estudo:

Avaliar, por meio de uma técnica metodológica quantitativa e uma qualitativa, a
percepção da dor em tratamento para fibromialgia;

Investigar temáticas referentes à vivência do processo de adoecimento no
contexto familiar, social e no relacionamento com os profissionais da saúde.
Pacientes e Métodos
Foram avaliadas 30 pacientes que, de acordo com os critérios de inclusão empregados,
consentiram a participação no estudo. Elas tinham mais de 18 anos, não apresentavam
condições metabólicas que pudessem alterar a percepção da dor e não apresentavam
condições psiquiátricas ou neurológicas que impedissem a compreensão dos objetivos
do estudo.
A aplicação de entrevista com 12 questões foi realizada com base no modelo proposto
por Sturge-Jacobs, na qual foram coletados dados sociodemográficos e, também,
questionados aspectos da convivência social, familiar, relacionamento com as equipes
de saúde, pensamentos e sentimentos que acompanham a vivência dessas questões. O
conteúdo das entrevistas foi analisado segundo o método de análise de conteúdo
proposta por Bardin, especificamente a análise de conteúdo temática.
Após a entrevista, foi aplicado o Instrumento de Descritores de Dor, proposto por
Sant'Ana et al. que é constituído por 50 descritores de dor, visto que para cada um
deles existe uma definição específica dada ao paciente no momento da aplicação do
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instrumento. É solicitado que o paciente atribua um valor numérico em uma escala
com escores que variam de 0 a 6, em que 0 é atribuído ao menor grau de
caracterização da dor e 6 ao maior grau. As palavras utilizadas estão dispostas
aleatoriamente e pertencem aos grupos sensoriais, avaliativos, afetivos e mistos,
contemplando a multidimensionalidade do fenômeno doloroso.
Resultados
Os dados sociodemográficos estão dispostos na Tabela 1 para ilustrar as características
das pacientes participantes, sendo todas elas do sexo feminino, com idade média de
44,7 anos (± 9,32).
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No que diz respeito às percepções das pacientes, a análise de conteúdo temático
realizada originou o estabelecimento das seguintes unidades: diagnóstico, motivações,
doença, sentimentos, pensamentos e repercussões na qualidade de vida. A Tabela 2
apresenta o panorama das categorias e subcategorias temáticas e a freqüência de
ocorrência de cada uma delas. O amplo espectro de interpretações e relatos
categorizados indica e reforça a complexidade do fenômeno doloroso, bem como a sua
individualidade na expressão.
A análise dos descritores de dor foi realizada por meio do cálculo das médias
aritméticas e dos desvios-padrão, calculados para cada um dos descritores. Em
seguida, foi estabelecido um ranking, no qual foram dispostos os descritores de maior
atribuição e os de menor atribuição. As Tabelas 3 e 4 apresentam, respectivamente,
estes dados, mostrando os cinco descritores mais significativos.
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Discussão
Na categoria diagnóstico, foram sistematizados os dados relativos ao percurso
realizado pelas pacientes. A procura para realização e/ou confirmação do diagnóstico
foi de um a cinco anos para 50% das pacientes, entre cinco e dez anos para 20% e de
mais de dez anos para 3,3%. O número de médicos consultados foi de até três para
46,7% das pacientes, até cinco para 23,3%, até dez para 3,3%, e 26,7% das
pacientes referiram ter consultado vários médicos não conseguindo precisar a
quantidade destes. Os serviços de saúde em que foram realizados os atendimentos
foram até três serviços para 90% das pacientes e de mais de três para 10%, havendo
relatos de procura tanto por médicos do Sistema Único de Saúde (SUS) quanto,
também, por convênios e médicos particulares. Em relação à freqüência atual de
procura por serviços de saúde por causa das crises álgicas, as pacientes relataram que
63,3% procuram o serviço pelo menos uma vez por mês, 13,3% procuram duas vezes,
6,7% procuram três vezes ao mês e 16,7% chegam a procurar quatro vezes ou mais.
Além disso, apresentam dados referentes à percepção de sinais e/ou sintomas
associados, a preocupação gerada tanto pela espera do diagnóstico quanto pelas
preocupações relacionadas a dúvidas ainda não esclarecidas, como exemplifica o relato
a seguir:
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"Ah, eu acho que sim né, porque eu tinha até medo de ser câncer, por exemplo.
Falava, gente, essa dor, essa dor, eu devo tá com alguma coisa. Aí a doutora falou
assim 'pode ficar tranqüila, não tem nada a ver'."
As dificuldades de esclarecimento também foram analisadas e percebeu-se que as
características pessoais tinham grande influência, especialmente no que se refere a
timidez e vergonha de questionar.
Erros diagnósticos foi uma outra unidade temática importante em relação ao
diagnóstico, pois revelou condição amplamente discutida na literatura. Heymann
discute a falta de atenção recebida até hoje por pacientes com fibromialgia nos
consultórios, o que em parte deve-se à falta de conhecimento do profissional e
também pela falta de disposição em aprofundar-se no assunto.
"Foi por causa de dor..., aí o doutor Paulo falou que era má circulação. Falou 'quem sabe se fazendo
cirurgia das pernas não acaba essa dor'. Então a gente faz de tudo pra acabar com a dor, né? O que a
gente quer é tirar as dores. Aí eu fiz a cirurgia. Mas não virou nada, ela não inchava, agora começou a
inchar."
A dificuldade de chegar ao hospital de nível terciário, onde foi realizado o estudo,
também foi comentado pelas pacientes, especialmente pela demora de
encaminhamento.
Na categoria motivações, foram analisadas a percepção da equipe médica atual, com
relatos de percepção positiva e também percepção negativa. Essa unidade de análise
mostra a importância da relação do paciente com o profissional de saúde, e que a
associação de estratégias é necessária, bem como a monitoração e a eficácia
justificando a continuidade do manejo.
Essa percepção também fica clara na unidade referente à mudança percebida após a
confirmação diagnóstica, indicando que as preocupações relacionadas à dor surgem
como algo importante, que são desvencilhadas por meio do conhecimento da doença,
das informações advindas desse processo e da preparação para buscar efetividade no
manejo.
"Faz. Faz porque você sente dor, sem saber o que é, te causa preocupação. Você sabendo o que é,
você sabe o que é 'eu tô com dor porque eu tenho isso. Então vou sentir essa dor, vai ser freqüente,
vai ser sempre'. A médica já me falou que não tem cura, é uma melhora. Vai ser sempre assim, hoje tá
bom, amanhã vai doer, e é assim que eu vou ter de acostumar."
O paciente que desconhece a doença que tem pede por um diagnóstico na tentativa de
evitar o mal-estar crônico que surge com o adoecimento.
As queixas de limitações físicas somaram montante considerável, expondo as
principais queixas que estão descritas na literatura em diversos estudos.
O apoio familiar, de amigos e no trabalho, apresentou-se de maneira bastante variada
na percepção das pacientes, mostrando, em muitos casos, a existência de apoio, e, em
outros, um total descaso, dificultando o manejo.
"E eu já fico nervosa, eu falo 'eu já tô com dor, e vocês ainda ficam tirando o sarro de mim? Eu tô com
dor, não tô brincando, tô falando a verdade'. Eles acham que porque eu tô ali, lavando uma roupa,
fazendo uma comida, limpando uma casa, que é mentira minha que eu tô com dor."
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A diminuição da capacidade funcional é uma das principais conseqüências da
fibromialgia, pois tem implicações sociais, laborais e também familiares.
Na categoria doença, a percepção das causas e influências contou com aspectos tanto
físicos quanto emocionais, confirmando mais uma vez dados trazidos pela literatura.
Outros temas foram relacionados aos recursos utilizados, subdivididos em pessoais (52
ocorrências), medicamentosos (43 ocorrências), religiosos (20 ocorrências), sociais (14
ocorrências) e familiares (11 ocorrências). Percebe-se aqui a preponderância de
recursos pessoais e medicamentosos. A possibilidade de utilizar recursos próprios
contou também com opiniões discordantes, em que algumas pacientes perceberam
essa possibilidade, nos aspectos físicos e emocionais e outras não perceberam tal
possibilidade.
"Pra melhorar mais, no momento eu ainda não encontrei. Não encontrei ainda não, mas não vou deixar
de procurar não, vou estar sempre."
Na categoria sentimentos, a identificação de sentimentos foi relatada por 21 pacientes,
sendo percebida certa dificuldade na expressão destes, tendo a entrevistadora
questionado várias vezes para obter resposta. A carga emocional presente é
perceptível e ilustrada pelo relato seguinte:
"Nossa é só raiva e ódio. Só raiva e ódio. Eu tenho vontade de pôr fogo em tudo, acabar com o
mundo, com a minha vida, nossa! Só penso isso, só. Sempre pensei, que eu falei pra você que eu
tentei até suicidar, né? Eu penso isso."
Os dados explicitados aqui condizem com os encontrados na literatura, que reportam a
sentimentos de menos valia, baixa auto-estima e pessimismo.
O estabelecimento de relação entre causas emocionais e sentimentos resultantes
também fizeram parte da análise, principalmente em relação à veracidade da dor
sentida.
"Ah, eu sinto que tá duvidando de mim, duvidando das minhas dores. Porque eu acho
que ninguém fala uma coisa dessas que não tá sentindo. Tá certo que tem coisas da
cabeça mesmo, mas tem coisas que não é."
Os sentimentos na relação familiar e na relação conjugal expressam o reflexo do
amparo recebido, variando bastante, de acordo com o tipo de apoio percebido, quando
percebido. Alguns relatos relacionados ao luto também fizeram parte da descrição da
percepção dos sentimentos pelas pacientes.
Na categoria pensamentos, foram priorizados relatos que abordassem o entendimento
racional das pacientes em relação aos questionamentos. Assim, os pensamentos em
relação ao futuro indicaram projeções quanto às possibilidades de piora e de melhora
da doença e sua influência no nível de limitações percebidas. A variabilidade nos níveis
de dor tem papel importante na contribuição para essa perspectiva, fazendo que a
paciente perceba a dor de maneira alternada em períodos de melhora e de piora,
dando margem para idéias de agravamento e/ou melhora.
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Os pensamentos em relação às necessidades refletem a visão das pacientes sobre o
que seria necessário, e de ajuda para um manejo mais adequado.
"Ah, acho que na minha casa é falta de amor, né? Acho que meu marido é muito... ah, sei lá, eu acho
que ele vê que eu tô precisando de médico, ele ao invés de me ajudar, acho que ele se afasta de mim,
sabe, e não conversa comigo muito, só conversa o necessário comigo. Não sei se eu tô te
respondendo certo."
Em relação ao tratamento, as pacientes mostram dados relativos à crença no
tratamento e na efetividade deste, o que se relaciona novamente com a atitude do
profissional de saúde diante dessa questão. São necessários, assim, a associação de
recursos terapêuticos para uma resposta, senão mais efetiva, que consiga fazer que
outras possibilidades possam ser encontradas em conjunto na relação das pacientes
com a equipe de saúde como um todo.
As idéias de perfeccionismo e/ou persistência indicam característica de pensamento
investigada em outros estudos também e revelam como as pacientes tentam resistir à
dor, mantendo suas atividades.
A última unidade dessa categoria apresenta os pensamentos em relação à doença em
si, de que forma as pacientes percebem a doença, relatando conformismo em alguns
casos e dificuldade de acreditar no diagnóstico no outro extremo, em razão de
ausência de resultados confirmados por exames laboratoriais.
"Ah, é difícil. Sabe porque, se tivesse alguma coisa que te mostrasse o que é essa fibromialgia, você
já sabia. 'Não é porque saiu no diagnóstico, eu tenho que ter', você entendeu? Mas é uma coisa que
não sai em lugar nenhum, e é uma dor... Como que eu sinto as dores? Porque não sai, não dá pra
entrar na cabeça da gente. Como que existe essa dor, essas doenças, essas coisas ruins que a gente
sente no corpo? Pontada, agulhada."
A categoria repercussões na qualidade de vida mostra o impacto percebido com a
doença e os prejuízos impostos no âmbito familiar (com alterações na dinâmica e nas
relações da família), pessoal (relacionado principalmente com a dependência gerada
pelas limitações e mudanças no estado de humor), sociais e de trabalho (com
diminuição da produtividade e das atividades de lazer) e sexuais (interferindo no
apetite sexual das pacientes). O impacto na qualidade de vida foi discutido em vários
estudos e os dados confirmam os encontrados neste estudo.
A análise do Instrumento de Descritores de Dor revelou que os descritores de maior
atribuição na caracterização da dor foram: incômoda, que espalha, latejante,
desconfortável e persistente. Sendo estes os cinco primeiros descritores utilizados
pelas pacientes na caracterização da dor, o aspecto sensitivo ganha destaque na
percepção que essas pacientes têm de sua própria dor. Dados da literatura confirmam
esses resultados, tanto no que se refere ao aspecto orgânico quanto cultural da
percepção da dor na fibromialgia, segundo Giesecke et al. e Quintner, Buchanan e
Taylor.
Os cinco descritores de menor atribuição na caracterização da dor foram: desgraçada,
demoníaca, maldita, aterrorizante e assustadora. A análise aqui denota forte
componente religioso, no que diz respeito aos três primeiros descritores. O fato de
todas as pacientes entrevistadas referirem ter participação em organizações religiosas
surge como hipótese para justificar o motivo pelo qual justamente esses três
descritores terem recebido menor atribuição.
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Com base na análise dos dados obtidos, acredita-se ser importante para a eficácia do
tratamento que a ênfase das intervenções devam embasar-se na tríade equipe de
saúde, paciente e família, de modo que, inter-relacionando essas três unidades,
possam abarcar o fenômeno de maneira mais completa, trazendo a família para a
realidade da doença, esclarecendo dúvidas, fazendo trabalho de orientação e busca
pela reorganização e o fortalecimento das relações familiares em função da otimização
no manejo da dor.
Além das intervenções relativas à dinâmica da relação do paciente com os demais
envolvidos em uma relação mais direta, encontram-se também possibilidades para
melhor compreensão até mesmo do paciente em relação à dor, incentivando outras
formas de percepção e expressão da dor referida, o que pode, em última instância,
facilitar a compreensão do fenômeno para eles mesmos, assim como para os
profissionais e demais indivíduos que fazem parte de seu convívio.
Há necessidade de continuidade de pesquisas que possam cada vez mais somar
estratégias que possam alcançar o alívio do sofrimento físico, psíquico, social e familiar
gerado pela doença.
Page 62
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