29 de set. de 2010

Pré-Eclâmpsia: Mecanismos Fisiopatológicos e suas Implicações Terapêuticas

Autor: Istênio F. Pascoal
Doutor em Nefrologia pela Universidade de São Paulo, SP
Pós-Doutorado em Hipertensão Arterial pela Universidade de Chicago, USA
Pesquisador Associado da Universidade de Brasília, DF

Introdução
As mulheres são relativamente protegidas de doenças cardiovasculares durante a fase reprodutiva, mas pagam um tributo por isso.  As intercorrências clínicas da gravidez não se expressam apenas nos índices de mortalidade fetal: também sacrificam inúmeras vidas maternas.  Além de poder apresentar todas as doenças que acometem uma mulher não grávida, exceto a infertilidade, a mulher grávida se arrisca a uma série de afecções inerentes à condição gravídica.
Duas formas principais de hipertensão arterial podem complicar a gravidez: pré-eclâmpsia e hipertensão crônica, que ocorrem individualizada ou associadamente.
Hipertensão crônica se refere à hipertensão de qualquer etiologia, que está presente antes da gravidez ou da 20a. semana de gestação.  Hipertensão diagnosticada em qualquer fase da gravidez, mas que persiste além de 6 semanas após o parto é tambem considerada hipertensão crônica.  A denominação “crônica” é utilizada para fazer oposição semântica à natureza súbita e reversível da pré-eclâmpsia.
Pré-eclâmpsia é uma doença hipertensiva peculiar à gravidez humana, que ocorre principalmente em primigestas após a 20a. semana de gestação, mais frequentemente próximo ao termo.  Envolve virtualmente cada orgão e sistema do organismo e é a principal causa de morbidade e de mortalidade, tanto materna quanto fetal.  Caracteriza-se pelo desenvolvimento gradual de hipertensão, proteinúria, edema generalizado e, às vezes, alterações da coagulação e da função hepática.  A sobreveniência de convulsão define uma forma grave, chamada eclâmpsia.  Em mulheres nulíparas, a incidência de pré-eclâmpsia é de aproximadamente 6% nos paises desenvolvidos e 2 ou 3 vezes maior em paises subdesenvolvidos.  Apesar de sua complexidade clínica e natureza potencialmente grave, a pré-eclâmpsia é a forma mais comum de hipertensão “curável” e é inteiramente reversível com a interrupção da gravidez.
A fisiopatologia vascular da pré-eclâmpsia se caracteriza por integral reversão das alterações fisiológicas próprias da gravidez normal(1,2).  Por exemplo, mulheres grávidas normalmente experimentam expressiva vasodilatação periférica, tanto que, a despeito de elevação no débito cardíaco, a pressão arterial sistêmica diminui.  Na pré-eclâmpsia, ao contrário, observam-se pequenas alterações no débito cardíaco, sendo o aumento na pressão arterial fundamentalmente dependente da elevação na resistência vascular periférica.  Além disso, a vasculatura de mulheres grávidas nomais é refratária aos efeitos pressores da angiotensina II, enquanto aquela de mulheres pré-eclâmpticas apresentam aumentada sensibilidade a este peptídeo, mesmo antes das manifestações clínicas(2).
Embora a causa da pré-eclâmpsia ainda esteja por ser determinada, estudos recentes sugerem que seu caráter multissistêmico pode refletir intensa disfunção da célula endotelial.  Primeiro, existem evidências morfológicas e bioquímicas de que a pré-eclâmpsia é precedida e/ou acompanhada por dano endotelial(3,4).  Segundo, há observações sugerindo que a vasodilatação habitual da gravidez normal reflete aumento na produção de fatores relaxantes derivados do endotélio (EDRF), principalmente aqueles dependentes do óxido nítrico (ON)(5-8).  Neste sentido, a inibição da síntese do óxido nítrico provoca hipertensão e proteinuria em ratas grávidas, quando a excreção urinária de nitrato-nitrito, embora diminuida, é ainda igual àquela de animais virgens(9).  Assim, tem sido sugerido que a diminuição na elaboração normal de vasodilatadores endógenos de ação local (primariamente óxido nítrico) é um mecanismo crucial envolvido na patogênese e perpetuação da hipertensão na pré-eclâmpsia.
Genética da pré-eclâmpsia
A susceptibilidade da mulher grávida à pré-eclâmpsia tem um componente genético definido.  A incidência em mães, filhas e irmãs é 2 a 5 vêzes maior do que em sogras, noras e população controle(10).  Dois modelos genéticos se adequam aos dados obtidos dos três maiores estudos: modelo recessivo simples, com os genes agindo na mãe, e um modelo de um gene dominante com 50% de penetrância, novamente agindo na mãe.  Há também evidências de um componente genético fetal.  Entretanto, a ausência de concordância mostrada por gêmeos monozigotos é melhor explicada por um modelo envolvendo penetrância mais reduzida.
Fatores de risco
A pré-eclâmpsia ocorre mais frequentemente durante a primeira gestação, sendo ocasional seu desenvolvimento em gestações subsequentes a uma gravidez normal, ou mesmo após um abortamento tardio.  Há evidências de que fatores imunológicos relacionados a antígenos do esperma paterno são importantes na gênese da pré-eclâmpsia.  Embora primigrávidas jovens apresentem maiores riscos, multigrávidas com um novo parceiro têm alta incidência de pré-eclâmpsia.  Por outro lado, a duração da cohabitação antes da concepção se relaciona inversamente com o risco de pré-eclâmpsia, sugerindo que prolongada exposição materna a antígenos do esperma paterno confere proteção(10).  Pré-eclâmpsia também está associada com a idade materna, aumentando sua incidência em mulheres acima de 35 anos.  Nefropatia, associada ou não a hipertensão crônica, diabetes mellitus, gemelaridade, hidrópsia fetal e mola hidatiforme igualmente aumentam os riscos de pré-eclâmpsia.  Mulheres fumantes aparentemente têm menor risco de desenvolver pré-eclâmpsia, mas quando a desenvolvem o prognóstico é pior do que em não fumantes.
Aspectos fisiopatológicos
A hipertensão da pré-eclâmpsia é caracteristicamente lábil e apresenta uma tendência à reversão do ritmo circadiano normal da pressão arterial, ou seja, intensificação dos níveis pressóricos à noite, ao invés da queda noturna habitual1.
A lesão renal da pré-eclâmpsia pode ser responsável pela aumentada excreção urinária de proteinas, bem como pela diminuição na filtração glomerular e no clearance de ácido úrico, o ultimo causando a característica hiperuricemia.  Desde que o ritmo de filtração glomerular e o clearance de ácido úrico aumentam normalmente durante a gravidez, níveis séricos de creatinina e ácido úrico superiores a 0.9 e 5 mg/dl, respectivamente, são considerados anormais em mulheres grávidas e requerem avaliação complementar11.
A excreção renal de sódio diminui na pré-eclâmpsia, causando retenção hidrossalina, embora formas graves da doença possam ocorrer na ausência de edema.  A maioria do fluido retido se localiza no espaço intersticial, tal que, mesmo na presença de edema, pacientes pré-eclâmpticas apresentam hemoconcentração por diminuição do volume intravascular.  Os níveis de albumina sérica podem ser baixos, não devido à perda renal ou disfunção hepática, mas em decorrência do extravasamento de proteína para o interstício (capillary leak).  Enquanto a maioria dos casos de edema agudo de pulmão observada em mulheres grávidas hipertensas se deve à sobrecarga de volume, algumas pré-eclâmpticas apresentam quadro semelhante à síndrome do estresse respiratório agudo, com pressão capilar pulmonar normal ou baixa, intensa diminuição da pressão oncótica plasmática e possível comprometimento da extração de oxigênio, configurando quadro de edema pulmonar primário.
Diminuição do número de plaquetas e dos níveis de antitrombina III podem preceder a expressão clínica da pré-eclâmpsia.  Há também sugestões de que elevações súbitas nos níveis de ferro sérico ou carboxihemoglobina circulantes podem ajudar na diferenciação entre pré-eclâmpsia e outras formas de hipertensão na gravidez12.
Pode-se assumir que a pré-eclâmpsia é uma doença generalizada, sendo a hipertensão apenas uma de suas manifestações.  Observam-se lesões em vários orgãos, incluindo cérebro, fígado e coração.  Há tambem diminuição na perfusão placentaria, o que responde, em parte, pela aumentada incidência de retardo de crescimento intrauterino e de perda fetal.  A restrição ao fluxo placentário provávelmente se deve ao estreitamento dos vasos deciduais, por uma lesão especifica chamada "aterose".  Na gravidez normal, as arterias espiraladas (ramos da arteria uterina) são invadidas pelo trofoblasto, o qual destroi a musculatura, transformando-as em um conduto praticamente sem resistência. Este processo se completa em torno da 20a-22a semana de gestação.  Alguns autores admitem que uma falha neste sequência de eventos, com posterior defeito da conformação estrutural da placenta, contribui criticamente na etiologia e/ou na amplificação das repercussões fetais da pré-eclâmpsia.
O endotélio na gravidez
Devido à ausência de um modelo animal adequado de pré-eclâmpsia e às limitações para se realizar estudos durante a gravidez humana, existe escassez de informações sobre a modulação endotelial da função vascular na pré-eclâmpsia, embora algumas avaliações da habilidade de relaxamento vascular em mulheres grávidas normotensas ou pré-eclâmpticas, têm consistentemente sugerido extensa disfunção endotelial na pré-eclâmpsia.
O endotélio vascular elabora uma miríade de moléculas vasoativas, que contribui criticamente para a regulação do tonos, da permeabilidade e da coagulação vasculares, e cujas ações ou concentrações tendem a se alterar em direções opostas durante a gravidez normal ou pré-eclâmpsia.  Assim, a produção relativa de vasoconstrictores mediados pelo endotélio, tais como endotelina e tromboxane A2, parece aumentar durante a pré-eclâmpsia, enquanto a de vasodilatadores, como os EDRFs, parece diminuir, ambas comparadas com a gravidez normal, indicando que uma função endotelial alterada pode ser de significante importância fisiopatológica na pré-eclâmpsia.
As artérias de resistência contribuem importantemente para e participam ativamente da regulação da resistência vascular periférica.  Vários estudos têm tentado adquirir uma melhor compreensão dos mecanismos pelos quais fatores intrínsecos e extrínsecos se interagem para influenciar seu diâmetro.  De um modo geral, estes estudos têm revelado anormalidades funcionais e estruturais de vasos de pacientes hipertensos quando comparados com aqueles de indivíduos normotensos.  Mais interessante é que o tratamento com alguns agentes anti-hipertensivos pode reverter parte destas alterações, embora os mecanismos destas anormalidades nao estejam ainda completamente conhecidos.
Em uma série de experimentos recentes, descritos abaixo, nós examinamos a modulação endotelial da reatividade microvascular na gravidez normal e hipertensiva em modelos experimentais e em seres humanos, com particular atenção na fisiopatologia vascular da pré-eclâmpsia.
1.Contração e Relaxamento Dependente de Endotélio em Microvasos Mesentéricos de Ratas Prenhes e Virgens.13
Neste estudo, avaliamos a vasoconstricção induzida por Cloreto de Potássio (KCl) e por Fenilefrina (FE), bem como a vasodilatação dependente de endotélio induzida por Acetilcolina (ACh), em microartérias (~150 um de diâmetro interno) mesentéricas de ratas virgens e prenhes, estudadas isometricamente na ausência e na presença de N-nitro-L-arginina (NNLA), um potente inibidor da síntese de Óxido Nítrico (ON).  A resposta vasoconstrictora máxima a KCl e FE, bem como a sensibilidade a FE, foram semelhantes entre vasos de ratas virgens ou prenhes, quer na ausência quer na presença de NNLA.  NNLA resultou em semelhante desvio para a esquerda da curva concentração-efeito a FE nos dois grupos.  O relaxamento vascular induzido pela ACh, enquanto estritamente dependente da presença do endotélio, foi potencializado em vasos de ratas prenhes (EC50 0.25 uM vs. 0.04 uM, ratas virgens e prenhes, respectivamente).  Além disso, na presença de NNLA, o relaxamento máximo foi inibido mais significativamente em vasos de ratas prenhes (62% vs. 31%).  Em suma, a prenhez não altera a síntese basal de ON nestes microvasos isolados, mas aumenta a liberação de ON estimulada por ACh, enquanto aparentemente inibe a ação de um vasodilatador derivado de endotélio, mas independente de ON.
2.Efeitos da Gravidez sobre os Mecanismos de Relaxamento em Vasos de Resistência do Omento Humano14
Neste estudo, realizado em vasos humanos, nós examinamos os mecanismos do relaxamento vascular induzido tanto pela ACh quanto pela Bradicinina (BK) - dois vasodilatadores reconhecidamente dependentes da presença de endotélio - em vasos de resistência do omento humano.  Pequenos anéis vasculares (~200 de diâmetro interno normalizado) foram dissecados de biópsias do omento obtidas de mulheres submetidas a laporotomia (não grávidas, n=12) ou operação cesariana (grávidas, n=12) e estudados sob condições isométricas in vitro.  Todos os vasos previamente contraídos com Arginina-Vasopressina (AVP) foram relaxaram tanto pela ACh quanto pela BK, de uma maneira estritamente dependente de endotélio,.  Entretanto, nem ACh nem BK relaxou vasos precontraídos com Gluconato de Potassio (GK).  A adição de Indometacina (INDO) ou NNLA, ou ambas, não preveniu o relaxamento induzido pela ACh ou pela BK.  Na combinada presença de INDO e NNLA, Charybdotoxina (CTx) ou 1 mmol/L de Cloreto de Tetraetilamonio (TEA) - bloqueadores seletivos de alguns canais de potássio sensíveis a cálcio – também não inibiu o relaxamento induzido pela BK.  Em contraste, a adição de 10 mmol/L de TEA, que inibe inespecificamente a maioria dos canais de potássio, aboliu completamente o relaxamento em vasos de mulheres não grávidas, mas não em vasos de grávidas.  Concluimos que ACh e BK relaxam estas artérias de resistência humanas de uma maneira dependente de endotélio, mas predominantemente através da participação de canais de potássio.  Assim, em flagrante contraste com os mecanismos observados em modelos animais, na gravidez humana o relaxamento pode envolver um vasodilatador hiperpolarizante dependente de endotélio, cuja ação parece diferir em vasos de mulheres grávidas e não grávidas.
3.   Pré-eclâmpsia é Acompanhada por Anormalidades Específicas da Contração e do Relaxamento Dependente de Endotélio em Microvasos do Omento.15
Nós estudamos a contração (KCl e AVP) e o relaxamento (ACh e BK) de artérias de resistência maternas, dissecadas de especimens do omento obtidas durante operação cesariana de mulheres com pré-eclâmpsia, postulando que estes vasos exibiriam aumento na contração e diminuição no relaxamento dependente de endotélio.  Para comparação, vasos foram também obtidos dos seguintes grupos de pacientes: grávidas normotensas, gravidas com hipertensão crônica ou com hipertensão crônica e pré-eclâmpsia superajuntada, bem como de mulheres não grávidas em idade reprodutiva. A reatividade vascular, tomada como máxima contração induzida por KCl ou AVP, foi significativamente maior em vasos de mulheres com pré-eclâmpsia, que também exibiram atividade fásica, oscilatória em resposta a doses intermediárias de AVP.   Os vasos de todos os outros grupos apresentaram apenas contrações tônicas, exceto aqueles de grávidas hipertensas crônicas com pré-eclâmpsia superajuntada, que  manifestaram o mesmo grau e padrão da atividade fásica vista em vasos de pré-eclâmpticas “puras”.  As oscilações observadas em vasos de pré-eclâmpticas não foram modificadas com a inibição da síntese de ON, mas foram inteiramente abolidas com a inibição da ciclooxigenase (indometacina ou meclofenamato) ou com a remoção mecânica do endotélio.  Tanto Acetilcolina (ACh) quanto Bradicinina (BK) relaxaram vasos de grávidas normotensas, grávidas com hipertensão crônica e de mulheres não-gravidas, de uma maneira estritamente dependente do endotelio, mas independente do ON e de produtos da cicloxigenase.  BK também relaxou vasos de pré-eclâmpticas completamente, mas ACh foi sem efeito neste grupo.  Em conjunto, estes dados sugerem defeitos específicos na sinalização endotelial de microvasos de pré-eclâmpticas que, se se manifestarem in vivo, poderiam levar à hipertensão e ao vasoespasmo que caracaterizam esta doença.
Considerações  Terapêuticas
O tratamento definitivo da pré-eclâmpsia consiste de interrupção da gravidez e prevenção das complicações maternas.  Se não tratada, a pré-eclâmpsia se associa com maior risco de morte fetal e neonatal e, em pacientes que progridem para pré-eclâmpsia grave ou eclâmpsia (convulsões), pode haver morte materna devido, principalmente, a hemorragia intracerebral.
Hipertensão grave persistente (diastólica acima de 110 mmHg), cefaléia, distúrbios visuais, deterioração da função renal e síndrome HELLP são outros sinais de doença grave que requerem a imediata interrupção da gravidez.  O manuseio conservador em tais casos pode resultar em sérias complicações maternas.
Em casos menos graves, entretanto, o retardamento do parto pode ser adotado para se obter maior maturidade fetal.  Tal conduta deve ser considerada se a pré-eclâmpsia se desenvolve precocemente (antes da 32a. semana) e a hipertensão é discreta/moderada, as funções renal e hepática são estáveis e não há distúrbios da coagulação ou sofrimento fetal.
A abordagem terapêutica consiste de hospitalização com repouso no leito, controle da pressão arterial, profilaxia da convulsão (quando sinais de eclâmpsia iminente estão presentes) e o apropriado término da gestação.  A intervenção terapêutica é paliativa e não altera a fisiopatologia da pré-eclâmpsia. Quando muito, pode retardar sua progressão. Se já houver maturidade pulmonar fetal, a gravidez deve ser interrompida, uma vez que a pré-eclâmpsia é completamente reversível e começa a desaparecer com o parto.  As dificuldades aumentam quando a pré-eclâmpsia se desenvolve antes da maturidade fetal, situação em que é difícil decidir a época adequada do parto.  Se o feto for muito prematuro (<30 semanas), a pressão arterial for apenas moderadamente elevada e não houver outros sinais de gravidade materna, então pode-se tentar retardar o parto. Deve-se ter em mente, entretanto, que a pré-eclâmpsia não remite espontaneamente e, na maioria dos casos, a doença piora com o tempo.  Assim, a monitorização e vigilância materna e fetal diária é mandatória.  Independentemente da idade gestacional, a interrupção da gestação deve ser considerada na vigência de sofrimento fetal (incluindo crescimento intrauterino retardado), ou sinais de risco materno, como hipertensão grave não controlada, hemólise, elevação de enzimas hepáticas e plaquetopenia (síndrome HELLP), evidência de deterioração da função renal, distúrbios visuais, dor epigástrica e hiperreflexia.
Tratamento anti-hipertensivo
O uso de medicação anti-hipertensiva na pré-eclâmpsia é controverso, devido à constatação de que o fluxo sanguíneo utero-placentário está diminuído na pré-eclâmpsia e o impacto da diminuição da pressão arterial sobre a perfusão placentária não é ainda muito bem conhecido.  Desde que a redução da pressão arterial não interfere na fisiopatologia da pré-eclâmpsia, o tratamento anti-hipertensivo deveria ser prescrito visando apenas à proteção materna.  Há considerável desacordo sobre que níveis de pressão arterial deveriam ser tratados, mas em geral se inicia a terapêutica anti-hipertensiva quando a pressão arterial diastólica é igual ou superior a 105 mmHg (fase V de Korotkoff).  Redução excessiva da pressão arterial deve ser evitada, para não comprometer o fluxo sanguíneo utero-placentário e, assim, predispor a complicações, tais como o descolamento prematuro da placenta.
Quando o parto é iminente, agentes parenterais são práticos e efetivos.  A droga de primeira escolha ainda é a hidralazina endovenosa, administrada em dose inicial de 5 mg.  Doses subsequentes são ditadas pela resposta inicial e usadas a intervalos de 20 minutos.  Se um total de 20 mg for administrado sem resposta terapêutica satisfatória, outros agentes devem ser considerados.  Labetolol endovenoso tem sido usado com sucesso na gravidez em paises onde esta droga é disponível, iniciando-se com doses de 10 mg que são repetidas a cada 20 minutos, de acordo com a resposta.  Entretanto, a administração endovenosa de labetolol não tem vantagens óbvias sobre hidralazina.  A administração oral de bloqueadores de canais de cálcio tem sido utilizada na pré-eclâmpsia, e embora haja atrativos nesta opção, tais como a eficácia anti-hipertensiva, a facilidade da administração e o rápido início de ação, a experiência na gravidez ainda é limitada.  Uma outra preocupação a respeito destes agentes é relacionada ao uso concomitante de sulfato de magnésio, que frequentemente é utilizado para prevenir convulsões.  O magnésio pode potencializar os efeitos dos bloqueadores de canais de cálcio e causar queda súbita e intensa da pressão arterial.  Diazóxido endovenoso, em pequenas doses (30 mg) pode ser usado em casos refratários.  O uso de diuréticos não é recomendado na pré-eclâmpsia, exceto em raros casos de edema pulmonar, porque podem agravar a isquemia uterina.
Inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA), que podem agravar a isquemia uterina e causar insuficiência renal no feto, assim como nitroprussiato de sódio, que pode causar intoxicação por tiocianeto na mãe e no feto, são contraindicados durante a gestação.
Quando a decisão for contemporizar, um agente oral é preferivel.  Deve se ter em mente que a terapêutica anti-hipertensiva visa, principalmente, ao benefício materno.  As vantagens potenciais para o feto é que o controle da pressão arterial pode permitir a continuidade da gravidez até um ponto onde haja maior maturidade fetal.  A metildopa é considerada por muitos como a melhor opção, face à ampla experiência com esta droga na literatura.  Se ela não for bem tolerada, beta-bloqueadores, alfa-beta-bloqueadores, bloqueadores de canais de calcio e hidralazina são boas opções aditivas ou alternativas.
Terapêutica anti-eclâmptica
Desde que a patogênese da convulsão eclâmptica permanece pouco esclarecida, não é surpreendente que a terapêutica para prevenir a primeira convulsão (iminência de eclâmpsia) ou sua recorrência (eclâmpsia estabelecida) tenha se mantido controversa por muitos anos.  Críticos do sulfato de magnésio argumentam que além de cruzar a barreira hemato-encefálica muito lentamente, seu uso não reverte as anormalidades eletroencefalográficas presentes nestas pacientes.  Em grande medida, a defesa do sulfato de magnésio tem sido efetivamente empírica.  A preferência por sulfato de magnésio nos Estados Unidos, em contraposição aos agentes anticonvulsivantes convencionais preferidos na Europa, se baseava nos efeitos observados em várias séries de caso.  Um estudo controlado só foi realizado em 1995 (Eclampsia Trial Collaborative Group) e seus resultados revelaram inquestionável superioridade do sulfato de magnésio, que se consolidou com a droga de escolha na prevenção da convulsão eclâmptica17.
Prevenção
A descoberta da prevenção da pré-eclâmpsia revolucionaria o acompanhamento pré-natal e salvaria muitas vidas maternas e fetais, principalmente em paises subdesenvolvidos, onde as consequências da pré-eclâmpsia são devastadoras.  No passado, a restrição dietética de sal e a administração profilática de diuréticos foram utilizadas com esta finalidade.  Entretanto, não há evidências consistentes de que a limitação de sódio dietético modifica a incidência ou intensidade de pré-eclâmpsia e as orientações nutricionais atuais para gestantes recomendam conteúdo normal de sal.  Uma meta-análise de estudos randomizados de mais de 7000 mulheres encontrou semelhante incidência de pré-eclâmpsia entre pacientes que receberam diurético profilático e placebo18.  Na última década, surgiram duas tentativas de prevenir a pré-eclâmpsia: baixa dose de aspirina (60 a 100mg/dia, comecando na 12a. semana de gestação) e suplementação dietética de cálcio (aproximadamente 2g/dia) durante a gravidez.  A premissa para o benefício da aspirina era que, nestas doses, a aspirina inibiria a produção de tromboxane mais do que a de prostaciclina, mantendo ou restabelecendo a predominância funcional da prostaciclina, uma prostaglandina vasodilatadora.  A despeito de favorável meta-análise dos primeiros trabalhos publicados19, a realização de um grande estudo, envolvendo mais de 9.000 pacientes, não confirmou estes resultados, embora sugerisse a possibilidade de que pacientes com alto risco pudessem eventualmente se beneficiar20.  Entretanto, um estudo brasileiro subsequente não demonstrou qualquer benefício profilátivo da aspirina, mesmo em pacientes consideradas de alto risco para desenvolver pré-eclâmpsia21.  Por sua vez, a estratégia de suplementação oral de cálcio se baseia na observação de que pacientes pré-eclâmpticas são hipocalciúricas22.  A hipótese de que baixa ingesta de cálcio na dieta está associada à hipertensão em geral e à pre-eclâmpsia em particular, motivou estudos de suplementação oral de cálcio para prevenir pré-eclâmpsia.  Uma meta-análise23 destes estudos sugeriu que a suplementação era benéfica, embora houvesse dados conflitivos24.  A conclusão recente de um grande trial, patrocinado pelo National Institute of Health dos Estados Unidos, demonstrou claramente que a suplementação dietética de 2 g/dia de cálcio não está indicada, pelo menos para mulheres americanas, se o objetivo for reduzir a incidência de pré-eclâmpsia ou melhorar o bem-estar fetal25.
Novas Perspectivas Terapêuticas
Reconhecido o comprometimento endotelial na gênese e/ou perpetuação da pré-eclâmpsia e a participação funcional dos canais de potássio na intermediação da resposta vascular à influência vasodilatadora exercida pelo endotélio na microcirculação humana, surge uma extraordinária perspectiva de tratamento e eventual prevenção da pré-eclâmpsia com a utilização de compostos, cuja ação farmacológica primária seja a “abertura de canais de potássio”16.  De fato, a recente utilização de moléculas sintéticas (como por exemplo,  Cromakalin) que diretamente abrem alguns canais de potássio, está viabilizando uma nova direção na farmacologia e a busca de “abridores seletivos” de diferentes subtipos de canais de potássio conduzirá a uma abordagem terapêutica mais racional na hipertensão em geral e na pré-eclâmpsia em particular.
Referências
1. Mancia G, Ferrari A, Gregorini L.  Blood pressure and heart rate  variabilities in normotensive and hypertensive human beings. Clin. Res. 1983;53:96 104.
2. August P, Lindheimer MD.  Pathophysiology of preeclampsia., in Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis, and Management, 2nd ed., J.H. Larah and B. M. Brenner, eds., Raven Press Ltd., New York, pp2407-2426, 1995.
3. Poppas A, Shroff SG, Korcarz CE, Hibbard JU, Berger DS, Lindheimer MD, Lang RM.  Serial assessment of the cardiovascular system in normal pregnancy: Role of arterial compliance and pulstile arterial load.  Circulation, in press.
4. Roberts JM, Taylor RN, Goldfein ª  Clinical and biochemical evidence of endotelial cell dysfunction in the pregnancy syndrome preeclampsia.  Am. J. Hypertens. 4:700-708,1991.
5. Haller H, Ziegler E-M, Hormuth V, Drab M, Eichhorn J, Nagy Z, Busjahn A, Vetter K, Luft FC.  Endothelial adhesion molecules and leukocyte integrins in preeclamptic patients. Hypertension 29[part 2]:291-296,1997.
6. Conrad KP, Joffe GM, Kruszyna H, Kruszina R, Rochelle LG, Smith RP, Chavez JE, Mosher MD.  Identification of increased nitric oxide biosynthesis during pregnancy in rats.  FASEB J 7:566-571,1993.
7. Danielsen LA, Conrad KP.  Nitric oxide mediates renal vasodilation and hyperfiltration during pregnancy in chronically instrumented conscious rats.  J. Clin. Invest. 98:482-490,1995.
8. Williams DJ, Vallance PJT, Neild GH, Spencer JAD, Imms FJ.  Nitric osxide-mediated vasodilation in human pregnancy.  Am. J. Physiol. 272:H748-752,1997.
9. Baylis C, Engels K.  Adverse interactions between pregnancy and a new model of systemic hypertension produced by chronic blockade of endothelial derived relaxing factor in the rat.  Clin. Exp. Hypertens. B11:117-129,1992.
10. Friedman DF.  Pathophysiology of preeclampsia.  Clin. Perinatol. 18(4):661-682,1991.
11. Pascoal IF, Mion Jr D, Sabbaga, E.  Nefropatia e Hipertensão na Gravidez. In Princípios de Nefrologia e Distúrbios Hidroeletrolíticos, 3ª Edição: M. C. Riella (Ed), Guranabara Koogan, p382-390,1996.
12. Weiner CP, Kwann HC, Xu C, Paul M, Burmesiter L, Hauck W.  Antitrombine III activity in women with hypertension during pregnancy.  Obstet Gynecol 65:301-305,1985.
13. Pascoal IF, Lindheimer MD, Nalbantian-Brandt C, Umans JG.  Mechanisms of acetylcholine-induced relaxation in mesenteric microvessels from pregnant rats.  Am. J. Physiol. 269:H1899-1904,1995.
14. Pascoal IF, Umans JGU.  Effects of pregnancy on mechanisms of relaxation in human omentum microvessels.  Hypertension 1996;28:183-7.

15. Pascoal IF, Lindheimer MD, Nalbantian-Brandt C, Umans JG.  Preeclampsia selectively impairs endothelium-dependent relaxation and leads to oscillatory activity in small omental arteries. J Clin Invest January 15, 1998;101(2):
16.  Lawson K. Is there a therapeutic future for “potassium channels openers”?  Clin Sci 1996, 91:651-63.
17. The Eclampsia Trial Collaborative Group. Which anticonvulsivant for women with eclampsia?  Evidence from the Collaborative Eclampsia Trial. Lancet 1995; 345:1455-63
18. Collins R, Yusuf S, Peto R.  Overview of randomised trials of diuretics        in pregnancy.  BMJ 1985; 290:17-23
19. Imperiale TF, Petrulis AS.  A meta-analysis of low-dose aspirin for the prevention of pregnancy-induced hypertensive disease.  Jama 1991; 266:260-264
20. CLASP: a randomised trial of low-dose aspirin for the prevention and treatment of pre-eclampsia among 9364 pregnant women.  Lancet 1994; 343:619-629
21. ECCPA: randomised trial of low-dose aspirin for the prevention of maternal and fetal complications in high risk pregnant women.  Br J Obstet Gynecol 1996; 103:39-47
22. Taufield PA, Ales KL, Resnick LM, Druzin ML, Gartner JM, Laragh JH.  Hipocalciuria in preeclampsia.  N Engl J Med 1987; 316:715-8
23. Bucher HC, Guyatt GH, Cook RJ.  Effect of calcium supplementation on pregnancy-induced hypertension and preeclampsia: a meta-analysis of randomised controlled trials.  JAMA 1996; 275:1113-1117
24. Roberts JM, D’Abarno J.  Effects of calcium supplementation on pregnancy-induced hypertension.  JAMA 1996; 276:1386-1387
25. Richard J. Levine, John C. Haut, Luis B. Curet, Baha M. Sibai, Patrick M. Catalano, Cynthia D. Morris, Rebecca DerSimonian, Joy R. Esterlitz, Elizabeth G. Raymond, Diane E. Bild, John D. Clements, Jeffrey A. Cutler. Trial of calcium to prevent preeclampsia. N Engl J Med 1997; 337:69-76

21 de jan. de 2010

COMPLICAÇÕES AGUDAS DO DIABETES

Dra.Jane Feldman


As complicações agudas do diabetes são aquelas que se instalam rapidamente, em horas ou dias. As mais graves são o coma ceto-acidótico, o coma hiperosmolar e a hipoglicemia. Todas elas são graves e implicam risco de vida, caso o paciente não seja tratado a tempo. Por outro lado, são passíveis de tratamentos relativamente simples, mesmo em hospitais ou prontos-socorros também relativamente simples.

As complicações agudas do diabetes em geral são dramáticas, pois os pacientes estão bem e, em pouco tempo, parecem estar gravemente enfermos. O lado bom é que, se bem cuidados, em pouco tempo voltam a estar bem de novo. Dentre as complicações agudas, destacamos as seguintes:

CETO-ACIDOSE DIABÉTICA

A ceto-acidose diabética é uma circunstância que ocorre toda vez que não há insulina em quantidades suficientes para metabolizar a glicose. Ela pode ser desencadeada pela ingestão abusiva de carboidratos e por situações de stress físico ou emocional. Stress físico ocorre quando o paciente é acometido por uma outra patologia, por exemplo uma amigdalite ou uma apendicite. Em situações de stress o corpo libera uma grande quantidade de hormônios hiperglicemiantes, isto é, hormônios que fazem o açúcar sangüíneo se elevar. Como não existe insulina em quantidade suficiente, as gorduras e proteínas armazenadas começam a ser quebradas, produzindo paralelamente substâncias ácidas conhecidas como
corpos cetônicos. Quando isso ocorre a pessoa sente-se muito mal. Pode ficar confusa, sua respiração torna-se mais rápida e profunda, o hálito tem cheiro de acetona, pode apresentar fraqueza intensa, náuseas, vômitos e dores abdominais. A ceto-acidose é uma complicação grave do diabetes. É mais freqüente no diabetes insulino-dependente e pode levar à morte se não for devidamente tratada. Apresentando esses sintomas o paciente deve procurar imediatamente seu médico ou um Pronto Socorro. O ideal é que a pessoa perceba quando a glicemia está subindo, antes de chegar à fase de cetose, através de sintomas como poliúria, polidipsia, polifagia, perda de peso, sensação de fraqueza, mal estar, visão embaçada, etc. e procure o médico.

COMA HIPEROSMOLAR

O coma hiperosmolar não cetótico em geral se apresenta no diabetes tipo II, freqüentemente sendo desencadeado por excessos alimentares ou por uma doença intercorrente. Como esses pacientes tem uma certa reserva de insulina, eles não desenvolvem a cetose. Como o coma hiperosmolar instala-se mais insidiosamente, os níveis de glicemia são muito elevados e as principais queixas se devem à desidratação e alterações a nível de sistema nervoso, que variam, conforme a gravidade do quadro, de um
simples torpor a coma profundo. É também um quadro de bastante gravidade e risco de vida se não for devidamente tratado.

HIPOGLICEMIA

O termo hipoglicemia significa que os níveis de glicose no sangue estão abaixo do normal. A glicose é uma das principais fontes de energia para nossas células, mas para as células do sistema nervoso, é a única fonte. Para essas células, ficar sem energia por tempo prolongado pode produzir danos severos e irreversíveis. Para garantir o bem estar e o bom
funcionamento do organismo, como um todo, a glicemia deve ser mantida dentro de limites estáveis, o que se consegue através da interação entre ingestão de glicose, sua liberação de depósitos endógenos e a liberação de vários hormônios. Hormônios da família dos glicocorticóides, adrenalina, glucagon, hormônio de crescimento e a insulina participam da
regulação dos níveis de glicose sérica. Os dois primeiros são muito importantes em situações de stress. Dentre estes, o mais importante é, sem dúvida nenhuma, a insulina. A insulina, como já foi dito, é produzida pelas células beta, localizadas nas ilhotas de Langerhanz, no interior do pâncreas. O principal estímulo à secreção de insulina é o
aumento dos níveis de glicose no sangue.

Em geral quando há uma queda dos níveis séricos de glicose, o paciente tem manifestações clínicas que variam do imperceptível, passando por sensação de sonolência, fome ou fadiga, cefaléia, tontura, visão dupla, sudorese profusa, tremores, palpitação, mudanças de humor, distúrbios de comportamento, sensação de parestesia ou paresia até chegar, nos casos
mais graves, a apresentar convulsões e coma. A hipoglicemia é um distúrbio evitável. Pode ocorrer nas seguintes situações:

* quando o diabético omite refeições, atrasa suas refeições ou come
muito pouco
* quando apresenta vômitos e diarréia
* quando pratica exercícios físicos excessivos (esportes ou trabalho
pesado), principalmente não estando bem alimentado
* por doses excessivas de insulina ou hipoglicemiantes orais
* por excesso de bebidas alcoólicas, que impedem a liberação de glicose
pelo fígado

Quando o paciente apresentar sintomas, o ideal é que ele faça uma determinação da glicemia, para confirmar o diagnóstico de hipoglicemia. Isso é importante para que ele aprenda a reconhecer os seus sintomas, mas para seu médico essa informação é fundamental na hora de fazer os acertos da medicação. No entanto esse procedimento não deve retardar o tratamento da hipoglicemia, que deve iniciar-se o mais prontamente
possível.

Muitos diabéticos, com o tempo, podem não apresentar sintomas de hipoglicemia, ou apenas uma leve sonolência com a mesma. As razões para isso são complexas. Os diabéticos susceptíveis a essa situação devem evitar manter seus níveis de glicemia abaixo de 100 mg/dl, fazendo monitorizações de glicose com maior freqüência. O objetivo imediato do tratamento é elevar o açúcar no sangue, que se encontra muito baixo, restaurando o bem estar. Para isso o paciente deve ingerir alguma forma de açúcar de fácil absorção:

* açúcar comum ou água com açúcar
* bala, bombom ou outros doces
* sucos de fruta, leite ou outras bebidas contendo açúcar (não adianta
usar bebidas ou outros alimentos indicados para diabéticos pois estes
não contêm açúcar)

Se o paciente estiver inconsciente, não administre líquidos. É preferível colocar açúcar sob a língua ou apenas na boca do paciente. Em caso de hipoglicemia severa, essas medidas podem não surtir efeito. O paciente deve então ser removido a um pronto-socorro, onde receberá Glicose ou Glucagon injetáveis.

Pacientes diabéticos devem sempre carregar balas ou bombons, juntamente com um cartão de identificação de diabético. Além disso, parentes e amigos devem sempre ser orientados quanto ao que fazer nessas circunstâncias.

O paciente portador de diabetes pode também dispor de Glucagon em sua farmácia caseira. O Glucagon também é um hormônio produzido pelo pâncreas, com ação inversa à da insulina, ou seja, ele eleva os níveis de glicose na circulação. Ele é apresentado em 2 frascos, um com o pó Glucagon (a apresentação disponível nas farmácias contém 1mg) e o outro com diluente. Após limpar a tampa de borracha do frasco de diluente com álcool, aspirar com a seringa de insulina 1 cc do mesmo e injetar no frasco que contém o pó. Agitar o frasco para que o Glucagon em pó possa dissolver-se no líquido. Usando a mesma seringa de insulina, aspirar 0,5cc dessa solução e aplicar por via subcutânea, de maneira semelhante à aplicação de insulina. Caso o paciente não se recupere em 10 a 15 minutos, deve ser conduzido a um hospital.

Para evitar a hipoglicemia o paciente deve seguir estritamente as doses de medicação prescritas pelo seu médico. Não deve ingerir outros medicamentos, receitados por outros médicos sem consultar seu diabetologista, pois muitos medicamentos interagem com os
hipoglicemiantes, potencializando sua ação e induzindo hipoglicemia.

Procure seguir as orientações dietéticas, respeitando o número de refeições, jamais deixando de se alimentar. Caso pretenda mudar suas atividades físicas, seja por mudanças no trabalho ou por pretender iniciar a prática de um esporte, converse com seu médico para que proceda uma adaptação em sua dieta e plano terapêutico.



Dra.Jane Feldman
Endocrinologista - São Paulo - SP

Fraturas do Antebraço, Punho e Mão

Dr. Alberto Pydd

Fraturas do Antebraço

Considerações anatômicas e princípios biomecânicos

O radio distal tem uma conformação que permite articulação com os ossos do carpo proximais em sua extremidade distal, e, por meio de sua margem medial ou ulnar articula-se com a ulna distal. O radio tem três componentes articulares: fossa escafóide, fossa semilunar e incisura ulnar. O tendão do musculobraquiorradial insere-se na estilóide radial.
É através da incisura ulnar do radio que ocorre a rotação do radio ao redor da ulna. A ulna distal também possui um processo estilóide que e onde se inserem a fibrocartilagem triangular, importante estrutura de estabilização do carpo.
O radio distal, elíptico e côncavo esta orientado no plano sagital com inclinação media palmar de 11 graus. No plano frontal a inclinação media e de 23 graus.
Na superfície dorsal o radio possui seis túneis fibrocartilaginosos onde estão dispostos os tendões extensores do punho e dos dedos. Na superfície palmar estão os componentes do túnel do carpo com nove tendões flexores e o nervo mediano. Na superfície ulnar medial situa-se o canal de Guyon, que contem a artéria e nervo ulnares.
O radio e a ulna sustentam estruturalmente o antebraço. As diáfises do radio e da ulna são praticamente paralelas, sendo o radio que gira ao redor de uma ulna fixa em termos de rotação. O radio tem uma curvatura lateral, sendo sua manutenção pos tratamento de fraturas crucial para uma prono-supinação completa.
As diáfises do radio e da ulna estão interligadas pela membrana interóssea , estrutura esta importante na transmissão de força entre os ossos.


Fraturas do radio e da ulna distais

São fraturas causadas por diversos mecanismos (angulação, cisalhamento, compressão, avulsão e combinadas).

Fratura de Colles- fratura da metáfise radial distal com angulação palmar. Deformidade em dorso de garfo.
Fratura de Smith- trata-se de uma fratura com angulação dorsal do radio distal, também chamada de Colles invertido.
Fratura de Barton- e uma fratura-luxação com lesão intraarticular, na qual o carpo e a margem do radio distal são desviados em conjunto.
Fratura de chofer- e uma fratura da estilóide radial.


Tratamento

O tratamento das fraturas deve ser determinado pelo padrão da fratura, tendo como objetivo recuperar a anatomia e as superfícies articulares. Para isto consideramos-
a) desvio
b)componentes intraarticulares
c)angulação
d)grau de cominução da fratura
e)idade do paciente(qualidade óssea)
f)nível funcional.

Os critérios de instabilidade

a) cominução metafisária dorsal
b) tilt dorsal maior que 20 graus
c) afastamento dos fragmentos maior que 5 mm
d) encurtamento inicial maior que 8 a 10 mm
e) deslocamento intra articular maior que 2 mm
f) associação de fratura da ulna
g) pacientes maiores de 60 anos e osteoporose
h) cominução dorsal excedente a 30%
i) traumas de alta energia

Procedimentos fechados e abertos

1) Redução fechada com tala e aparelho fechado- usada em fraturas extra articulares, sem sinais de instabilidade do radio distal. E efetuada uma redução da fratura após anestesia local ou sedação e a colocação de tala gessada áxilo-palmar, sendo esta trocada por aparelho gessado após a redução do edema.
2) Fixação com pinos percutaneos - podem ser um bom complemento para o tratamento com aparelho gessado ou fixação externa e visam manter fragmentos em posição adequada e evitar colapso ou desalinhamento.
3) Redução aberta e fixação interna - técnica eficaz para o realinhamento articular e manutenção de correta redução da fratura. Com o advento de novos materiais , principalmente as placas LCP, os riscos de perda da fixação tornaram-se pequenos e a reabilitação precoce tornou os resultados mais satisfatórios.
4) Fixação externa – usada para o tratamento de fraturas expostas e fraturas severas, onde a ligamento taxia pode trazer resultados melhores que outros métodos de tratamento.


Complicações(até 70%)
Imediatas- compressão nervosa, ruptura tendinosa, distrofia simpático reflexa
Tardias- compressão nervosa, ruptura tendinosa,distrofia simpático reflexa, consolidação viciosa, instabilidade,artrose e pseudartrose.
Dentre as complicações nervosas encontramos a Síndrome do túnel do carpo como a mais comum(compressão do nervo mediano ao nível do túnel do carpo).

Fraturas da mão.






Fraturas da diáfise dos ossos do antebraço

No adulto é uma fratura cirúrgica, pois a perda da curvatura radial, encurtamento e angulações das fraturas trazem como resultado a perda ou diminuição da prono supinação. Sempre é importante lembrar a importância da membrana interróssea, que com sua parte central espessada é importante transmissora de forças entre o rádio e a ulna.

Fratura isolada da ulna(fratura do cassetete)
Geralmente resulta de um golpe direto sobre a ulna. Quando há pouco desvio é passível de tratamento conservador, com imobilização gessada por cerca de 3 meses. Quando há deslocamento maior que 50% ou angulação maior que 10 graus, considera-se a redução aberta e fixação interna.

Fratura isolada da diáfise do rádio com lesão da articulação radio ulnar distal ( Fratura de Galeazzi).
São fraturas radiais associadas à lesão do processo estilóide da ulna, encurtamento radial> mm e luxação desta articulação. É lesão de tratamento cirúrgico, visando estabilizar a articulação radio ulnar distal.

Fratura de Monteggia
É uma fratura do terço proximal da ulna com luxação da cabeça do rádio, podendo esta luxação ser classificada em 4 tipos de acordo com o sentido da luxação da cabeça do rádio.(anterior 60%, posterior, lateral e fratura de ambos os ossos proximalmente com luxação da cabeça do rádio).
O tratamento em crianças pode ser exitoso com a redução fechada e imobilização. No adulto é indicada a redução aberta e fixação interna. Importante é lembrar da lesão e interposição do ligamento anular ao nível da cabeça do rádio, lesão esta responsável tanto pela dificuldade de redução como instabilidade pós redução.

Complicações
1-infecção
2-lesões nervosas
3-lesões vasculares
4-síndrome compartimental
5-sinostose

Fraturas da mão

Fraturas das falanges
São fraturas muito comuns, que acontecem principalmente na idade produtiva e estão ligadas com acidentes no trabalho na sua maioria dos casos. A maioria das fraturas são estáveis e podem ser tratadas por meio de uso de talas metálicas. Indicamos o tratamento cirúrgico nos seguintes casos- falha na redução da fratura, fraturas intra-articulares e instáveis, associação a lesões extensas de partes moles, fraturas expostas ou com grande perda óssea, fraturas associadas à politrauma ou fraturas epifisiárias em crianças tipo Salter-Harris III e IV.
Devemos atentar para a importância de evitarmos a permanência principalmente de desvios rotacionais e angulares.

Fraturas dos metacarpos
Correspondem a cerca de 30% de todas as fraturas da mão. O objetivo do tratamento é restaurar os arcos longitudinal e dorsal da mão, além de corrigir encurtamentos, desvios angulares e rotacionais. Dividimos as fraturas dos metacarpos em cabeça, colo, diáfise e base para meio de diagnóstico e tratamento.
Fraturas da cabeça devem ter sua superfície articular restaurada. Quando sem desvio, são imobilizadas em tala metacarpo falangiana em flexão de 70 graus.
Fraturas do colo são mais freqüentes no quinto metacarpo(fratura de boxer) e aceitam desvios de até 30 graus de flexão para tratamento conservador. Se desvios maiores devem ser reduzidas aberta ou fechada e fixada por meio de placas e parafusos ou fios de Kirschner.
Fraturas da diáfise causam uma sobreposição de 1,5 cm sobre o dedo vizinho a cada 5 graus de rotação. Portanto qualquer grau de rotação é inaceitável, devendo ser reduzido aberta ou fechada e fixada por meio de fios de Kirschner ou placas e parafusos.
Fraturas da base por serem articulares seguem o mesmo princípio das fraturas da cabeça, devendo ter sua anatomia restaurada.

Luxação carpo metacárpica

Cerca de 70% delas ocorrem na articulação do quinto osso metacarpal com o hamáto, pela maior mobilidade desta articulação. Nos casos de luxação sem fratura, redução fechada e gesso antebraquiopalmar são suficientes na maioria dos casos. Outros casos são tratados de forma geralmente cirúrgica com redução aberta e fixação percutanea com fios de Kirschner.
Devemos atentar para o grande edema destas lesões e o risco de síndrome compartimenta, e lembrarmos que o terceiro raio da mão é a chave para uma redução anatômica.

Fraturas da base do primeiro metacarpo
São tratados em um capítulo separado por serem de difícil manutenção de redução em gesso pela ação da musculatura tênar e ação isolada do abdutor do polegar.
As fraturas de Bennet e Rolando são por regra de redução fechada e fixação percutanea . A manobra de redução destas fraturas são por tração, pronação, adução e extensão do polegar, com tração direta sobre este e então fixação percutanea ao trapézio e segundo metacarpo. As fraturas da base do primeiro metacarpo extra articulares são incapacitantes quando possuem angulação maior que 30 graus.