23 de set. de 2009

Neuroanatomia - MEDULA ESPINHAL

GENERALIDADES

ETIMOLOGIA : Etimologicamente, medula significa miolo e indica tudo o que está dentro. A medula espinhal é assim denominada por estar dentro do canal espinhal ou vertebral.
CONSIDERAÇÕES : A medula é uma massa alongada, cilindróide, de tecido nervoso situada dentro do canal vertebral, sem ocupá- lo completamente e ligeiramente achatada ântero- posteriormente. Tem calibre não- uniforme, por possuir duas dilatações, as intumescências cervical e lombar, de onde partem maior número de nervos através dos plexos braquial e lombossacral , para inervar os membros superiores e inferiores, respectivamente. Seu comprimento médio é de 42 cm na mulher adulta e de 45 cm no homem adulto. Sua massa total corresponde a apenas 2% do Sistema Nervoso Central humano, contudo inerva áreas motoras e sensoriais de todo o corpo, exceto as áreas inervadas pelos nervos cranianos. Na sua extremidade rostral, é contínua com o tronco cerebral (bulbo) aproximadamente ao nível do forame magno do osso occipital. Termina ao nível do disco intervertebral entre a primeira e a segunda vértebras lombares. A medula termina afilando-se e forma o cone medular que continua com o filamento terminal-delgado filamento meníngeo composto da pia-máter e fibras gliais. Algumas estruturas são de extrema importância na fixação da medula, como o ligamento coccígeo que se fixa no cóccix, a prória ligação com o bulbo, os ligamentos denticulados, a emergência dos nervos espinhais e a continuidade da dura-máter com o epineuro que envolve os nervos.
IMPORTÂNCIA: A medula espinhal recebe impulsos sensoriais de receptores e envia impulsos motores a efetuadores tanto somáticos quanto viscerais. Ela pode atuar em reflexos dependente ou independentemente do encéfalo. Este órgão é a parte mais simples do Sistema Nervoso Central tanto ontogenético ( embriológico), quanto filogeneticamente (evolutivamente). Daí o fato de a maioria das conexões encefálicas com o Sistema Nervoso Periférico ocorrer via medula.

EMBRIOLOGIA

DESENVOLVIMENTO MEDULAR: Aproximadamente na terceira semana do desenvolvimento pré-natal, o ectoderna do disco embrionário, o folheto que está em contato com o meio externo e que origina o sistema nervoso, situado acima da notocorda, se espessa formando a placa neural. Sabe-se que para a formação desta placa e a formação e desenvolvimento do tubo neural, tem importante papel a ação indutora da notocorda e do mesoderma. A placa neural cresce progressivamente e torna-se mais espessa, adquirindo um sulco longitudinal denominado sulco neural, que se aprofunda para formar a goteira neural. Os lábios desta goteira se fundem para formar o tubo neural. Um grupo de células migra para formar a crista neural que dá origem aos gânglios dorsais e autonômicos, medula supra- renal e outras estruturas, também não- neuronais. As células na parede do tubo neural se dividem e diferenciam, formando uma camada ependimária que engloba o canal central e é envolvida por zonas intermediária (manto) e marginal de neurônios primitivos e células gliais. A zona do manto se diferencia em duas regiões, uma placa alar e uma placa basal. A placa alar contém principalmente neurônios sensitivos e a placa basal formada, na maioria, por neurônios motores. Essas duas regiões são demarcadas pelo sulco limitante, um sulco na parede do canal central. A placa alar se diferencia na coluna cinzenta dorsal e a placa basal se transforma na coluna cinzenta ventral.
A substância cinzenta da medula origina-se, portanto, da zona intermediária do neuroepitélio, o manto. Já a substância branca tem origem da zona mais externa, marginal, onde ficam contidos os prolongamentos das células do manto. Depois de serem formados os neurônios, a partir das células precursoras, os neuroblastos; as células precursoras da glia (glioblastos ou espongioblastos) originam a macróglia, formada de oligodendrócitos e astrócitos. Os oligodendrócitos formados a partir da camada marginal e, portanto, presentes na substância branca, responsáveis pela mielinização dos axônios do SNC, o que caracteriza a cor da substância branca. Os astroblastos oriundos dos glioblastos e precursores dos astrócitos, conforme sejam formados na zona intermediária ou na zona marginal se diferenciam em astócitos protoplasmáticos (presentes na substância cinzenta) ou fibrosos (presentes na substância branca), que são diferentes morfologicamente. No final da quarta semana, o SN deixa de ser nutrido pelo âmnio e passsa a receber nutrientes do sistema vascular formado, oriundo do mesoderma. Com o advento da vascularização surgem os microgliócitos, células que constituem a micróglia e que são derivadas dos monócitos ( céllulas de defesa presentes no sangue).
Uma camada de revestimento de células ectodérmicas envolta da medula primitiva forma as duas meninges internas: a aracnóide e a pia-máter. O revestimento externo mais espesso, a dura-máter, é formado de mesênquima.

RELAÇÃO COM O CANAL VERTEBRAL

Noções: A medula está revestida pelo canal vertebral ósseo e os nervos espinhais emergem pelos forames intervertebrais. C1 emerge entre o atlas e o osso occipital, de C2 a C7 emergem acima de sua vértebra correspondente e C8 emerge entre a sétima vértebra cervical e a primeira torácica. Todos os nervos torácicos, lombares e sacros emergem abaixo de sua vértebras correspondentes. No adulto, a extemidade caudal da medula espinhal- o cone medular- fica situada entre a primeira e a segunda vértebras lombares. Os nervos cervicais emergem lateralmente, contudo, quanto mais caudal o nível de emergência, mais o nervo cursa pelo interior do canal vertebral, antes de sair pelos forames intervertebrais. No embrião, inicialmente, todos os nervos espinhais emergem lateralmente. À medida que prossegue o desenvolvimento, a partir do 4o mês de vida intra-uterina, a coluna vertebral cresce mais rapidamente que a medula espinhal, provocando um deslocamento dos segmentos medulares em relação aos locais de emergência dos nervos espinhais do canal vertebral. Estes fenômenos são mais pronunciados na parte caudal, onde as raízes nervosas descem quase verticalmente antes de emergirem da medula, formando a cauda eqüina, que é uma estrutura abaixo de L2, constituída de raízes nervosas e meninges (os envoltórios do SNC) e da Cisterna lombar- o líquor presente neste espaço. Há, portanto, como conseqüência da diferença de ritmos de crescimento entre a coluna e a medula, um afastamento dos segmentos medulares das vértebras correspondentes.
Embora a medula termine próximo ao nível das primeira e segundas vértebras lombares, o saco da dura- máter continua até o nível da segunda vértebra sacral (S2). O cone medular dá origem ao filamento terminal ( filamento terminal interno) que se estende até a base do saco dural. Este filamento atravessa o saco dural, formando o ligamento coccígeo ( filamento terminal externo ou filamento da dura- máter espinhal), que fixa tanto a medula como o saco dural, cheio de líquido, à base do canal vertebral. Entre L2 e S2 só há o filamento terminal e as raízes que formam a cauda eqüina.

Importância : Clinicamente, a área entre L2 e S2 tem importância para a coleta do líquido cefalorraquidiano e para a administração de anestésicos espinhais. A topografia vertebromedular é importante para o diagnóstico, prognóstico e tratamento de lesões da medula. Assim, uma regra prática diz que os segmentos medulares de C2 a T10 correspondem aos processos espinhosos acrescidos de duas unidades, que os cinco segmentos lombares correspondem aos processos espinhosos T11 e T12 e que os cinco sacrais correspondem ao processo espinhoso L1.

MACROSCOPIA

MORFOLOGIA: A superfície da medula é marcada por uma série de sulcos longitudinais, que a percorrem em toda a sua extensão: sulco mediano posterior, contínuo, internamente, com o septo mediano posterior, que é uma membrana glial. Na superfície anterior fica a fissura mediana anterior com profundidade de 2 a 3 mm, na qual se invagina a pia- máter ( meninge mais interna). O seu assoalho é a comissura branca anterior. Nas superfícies laterais ficam o sulco lateral posterior ( local de entrada das raízes dorsais) e o sulco lateral anterior ( local de emergência das fibras das raízes ventrais). Na medula cervical, segundo o autor Ângelo Machado, e estendendo- se dos níveis cervicais superiores até os torácicos médios, de acordo com o Burt, existe ainda o sulco intermediário posterior, situado entre o mediano posterior e o lateral posterior e que continua em um septo intermédio posterior, uma membrana glial, no interior do funículo posterior. O padrão básico da morfologia, presente desde o embrião, é mantido no adulto, com a substância cinzenta ocupando posição central e apresentando a forma de uma borboleta ou de um H. A substância branca circundante, de situação periférica é formada, em sua maior parte, por fibras nervosas de curso longitudinal, a maioria mielínicas, que ascendem da medula para o encéfalo ou descem deste para os diferentes níveis da medula espinhal. Há também fibras espino- espinhais intersegmentares que ascendem ou descendem por distâncias variáveis. Tais fibras formam o fascículo próprio. Assim, os segmentos cervicais contêm maior número de fibras, além de maior área de secção transversa da substância branca que os níveis lombares. Estas fibras longitudinais podem ser agrupadas de cada lado em três funículos ou cordões: funículo anterior ( entre a fissura mediana anterior e o sulco lateral anterior), o funículo lateral ( entre os sulcos lateral anterior e posterior) e o funículo posterior ( entre o sulco lateral posterior e o mediano posterior). Este funículo é dividido pelo sulco intermédio posterior e pelo septo de mesmo nome em fascículo grácil, de situação medial, e cuneiforme, mais lateral. A substância cinzenta, por outro lado, é composta de duas porções simétricas unidas na linha mediana por conexão transversa ( comissuras) de substância cinzenta que contém o diminuto canal central ou seu remanescente. Nela, pode- se distinguir três colunas ou cornos: anterior, posterior e lateral. Esta última, entretanto, só aparece na medula torácica e lombar superior, sob a forma de uma projeção triangular lateral. Há vários critérios para a divisão da substância cinzenta. Um deles considera duas linhas que tangenciam os contornos anterior e posterior do ramo horizontal do H, dividindo esta substância em coluna anterior, posterior e substância cinzenta intermédia, que pode ser dividida em substância cinzenta intermédia central e lateral. De acordo com este critério, a coluna lateral faz parte da substância cinzenta intermédia lateral.
CANAL CENTRAL: O canal central da medula ou canal do epêndima se estende por todo o comprimento da medula durante o desenvolvimento. É revestido por células ependimárias e segundo o autor Jack de Groot, este canal é cheio de líquido cefalorraquidiano, contradizendo o Ângelo Machado que afirma que este canal não apresenta líquor. Ele se abre em cima na parte inferior do quarto ventrículo. Em adultos, este canal é muito estreito e parcialmente obliterado e geralmente desaparece, exceto nos níveis cervicais.
INTUMESCÊNCIAS: A medula espinhal, cilíndrica, ligeiramente achatada no sentido ântero- posterior, não apresenta calibre uniforme, devido a duas dilatações características: as intumescências cervical (formada pelos segmentos medulares de C3 a T1) e lombosacra (formada pelos segmentos medulares de L1 a S3), situadas nos níveis de origem dos nervos espinhais que inervam, respectivamente, os membros superior e inferior. Estas intumescências são produzidas pelo maior número de neurônios na substância cinzenta da medula e, portanto, de fibras nervosas que entram ou saem destas áreas e que são necessárias para a inervação dos membros superiores e inferiores. Os nervos do plexo braquial originam- se na intumescência cervical enquanto os nervos do plexo lombossacral originam- se na intumescência lombar.
SEGMENTAÇÃO: Em toda a sua extensão,a medula apresenta padrão ordenado e segmentar de 31 nervos espinhais ( 8 cervicais, 12 torácicos, 5 lombares, 5 sacrais e 1 coccígeo)- padrão segementar esse que não se reflete na sua organização interna. Não existem limites nítidos entre os segmentos na própria medula.
NERVOS ESPINHAIS: Cada segmento da medula pertence a quatro raízes: uma raiz ventral e uma dorsal das metades esquerda e direita. O primeiro segmento cervical não apresenta raízes dorsais em 50% das pessoas. Cada um dos trinta e um pares de nervos espinhais tem uma raiz ventral e uma dorsal e cada raiz é composta de uma a oito radículas. Consiste, portanto, em feixes de fibras nervosas. Na raiz dorsal do nervo espinhal típico, próximo à junção com a raiz ventral, localiza- se o seu gânglio, uma intumescência que contém corpos de neurônios. Cada nervo espinhal se divide para formar o ramo primário posterior e o ramo primário anterior. O posterior inerva a musculatura do tronco e as áreas associadas das costas. O anterior, geralmente maior que o posterior, participa na formação dos plexos braquial e lombossacral ao nível das intumescências cervical e lombar, respectivamente. Nas regiões torácicas, ele permanece segmentar, como nervos intercostais, inervando a musculatura costal e abdominal das superfícies anterior e lateral do corpo. Os nervos espinhais originam também os ramos comunicantes que os unem ao tronco simpático. Apenas os nervos torácicos e lombares superiores contêm um ramo comunicante branco, mas o ramo cinzento está presente em todos os nervos espinhais. Os ramos brancos ligam a medula ao tronco simpático, sendo constituídos de fibras pré- ganglionares, além de fibras viscerais aferentes. Já os cinzentos são constituídos de fibras pós- ganglionares. Os nervos espinhais originam também os ramos meníngeos ou meníngeos recorrentes que são muito pequenos e transportam inervações sensitivas e vasomotoras para as pequenas meninges.
Raiz Ventral: Transporta axônios dos neurônios motores alfa de grande diâmetro para as fibras musculares estriadas extrafusais; os axônios do neurônio motor gama, mais delgado, que inervam as fibras intrafusais; as fibras autonômicas pré- ganglionares nos níveis torácio, lombar superior e mediossacro ( S2- S4); e alguns axônios aferentes que se originam de células nos gânglios da raiz dorsal e transmitem informações sensoriais das vísceras torácicas e abdominais.
Raiz Dorsal: Cada raiz dorsal ( exceto geralmente C1) contém fibras aferentes das células nervosas em seu gânglio. As fibras maiores ( Ia) provêm de fusos musculares e participam nos reflexos espinhais; as de tamanho médio ( A- beta) transportam impulsos de mecanoceptores na pele e articulações. A maioria dos axônios nas raízes dorsais tem pequeno calibre (C, não- mielinizados; A- delta, mielinizados) e transportam informações sobre estímulos nocivos ( ex.: dor) e térmicos.
Tipos de fibras nervosas: a) Fibras eferentes somáticas: estas fibras motoras inervam os músculos estriados esqueléticos. b) Fibras aferentes somáticas: estas podem ser exteroceptivas que transmitem impulsos de temperatura, dor, pressão e tato ou proprioceptivas conscientes ou inconscientes. Estas fibras originam- se em células pseudo- unipolares nos gânglios da raiz dorsal. Os ramos periféricos destas células ganglionares são distribuídos para as estruturas somáticas. Os ramos centrais transmitem impulsos sensitivos por meio das raízes dorsais para a coluna cinzenta dorsal e para os tratos ascendentes da medula espinhal. Os fascículos grácil e cuneiforme ascendem sem fazer sinapse na medula. c) Fibras eferentes viscerais: São as fibras autonômicas simpáticas e parassimpáticas. As fibras simpáticas dos segmentos torácicos e de L1e L2 são distribuídas por todo o corpo para as vísceras, glândulas e músculo liso. As fibras parassimpáticas, presentes nos três nervos sacrais médios ( S2- S4), dirigem- se para as vísceras pélvicas e abdominais inferiores. d) Fibras aferentes viscerais: Estas fibras transmitem informações sensitivas das vísceras, passando pelo ramo comunicante branco e possuindo seus corpos celulares no gânglio da raíz dorsal. No entanto, evidências recentes sugerem que as fibras aferentes viscerais penetrem na medula por meio das raízes ventrais.
DERMÁTOMOS: A formação dos somitos durante o desenvolvimento embrionário estabelece um padrão segmentar de inervação para o adulto. Um nervo espinhal segmentar inerva cada somito. A divisão e a migração de somito e das estruturas dele derivadas, que acontecem depois, determinam, em grande parte, o padrão da inervação do adulto. Cada somito forma um esclerótomo, um miótomo e um dermátomo. O primeiro forma os elementos do esqueleto axial. O miótomo forma o músculo estriado e o dermátomo contribui para o tecido conjuntivo subcutâneo. No adulto, o padrão da inervação reflete esta organização segmentar. Cada segmento cutâneo é um dermátomo. Segundo o Ângelo, o dermátomo é um território cutâneo inervado por fibras de uma única raiz dorsal, recebendo o nome da raiz que o inerva. Já conforme o Burt, existe superposição com cada nervo fornecendo parte da inervação para cada um dos dermátomos imediatamente adjacentes. Deste modo, no ambiente clínico, a perda de um nervo espinhal é de difícil detecção pela determinação da perda da sensibilidade cutânea.

MICROSCOPIA

SUBSTÂNCIA CINZENTA: A organização neuronal na substância cinzenta é a de colunas e lâminas com disposição longitudinal. Há, portanto, duas nomenclaturas. A primeira é a organização tradicional de colunas e de núcleos. A segunda são as lâminas de Rexed- um mapa citoarquitetônico, um mapa que se correlaciona bem com as conexões sinápticas e com os dados eletrofisiológicos.
Núcleos e colunas: A ponta dorsal é um dos locais para o término das fibras sensoriais primárias. Aí existem três núcleos, presentes em todos os níveis da medula espinhal. São o núcleo póstero- marginal, a substância gelatinosa e o núcleo sensorial principal ( núcleo próprio). Também existe, mas limitado aos segmentos C8 e L3, o núcleo dorsal de Clarke ( núcleo dorsal ou núcleo toráxico). Na ponta ventral há a coluna motora medial que se estende ao longo de toda a medula e inerva a musculatura axial. Há também as colunas motoras laterais, presentes nas intumescências cervical ( C5 a T1) e lombossacral (L1 a S3) que inervam os músculos dos membros respectivos. Ela não é uma coluna única, mas uma série de pequenas colunas ou núcleos, dispostas de acordo com os músculos que cada uma delas vai inervar. A coluna de células intermediolateral contém neurônios simpáticos pré- ganglionares e está localizada nos segmentos de T1 a L3. A coluna de células intermediomedial está associada aos reflexos motores viscerais e também se encontra de T1 a L3. A substância cinzenta que cruza a linha média circundando o canal central é a substância cinzenta central ou comissura cinzenta.
Lâminas de Rexed: As lâminas I, II, III e IV de Rexed formam a maior parte da ponta dorsal e são os locais onde geralmente terminam as fibras exteroceptivas primárias. A lâmina I corresponde ao núcleo póstero- marginal e a II à substância gelatinosa. As lâminas III e IV incluem a maior parte dos núcleos sensoriais principais. As V e VI ocupam a base da ponta dorsal, sendo subdivididas em compartimentos medial e lateral. Estas duas lâminas são importantes para a integração da informação motora somática, além de serem centros reflexos de importância e origem principal das fibras espinocerebelares, por serem os locais onde normalmente terminam as fibras proprioceptivas primárias. As lâminas VII e VIII incluem o núcleo dorsal de Clarke e as colunas de células intermediolateral e intermediomedial. Elas se estendem por toda a zona intermédia e as porções ventrais da substância cinzenta. A lâmina IX inclui as colunas motoras lateral e medial e a lâmina X, a substância cinzenta central da medula.
SUBSTÂNCIA BRANCA: Grupos de fibras ascendentes ou descendentes, com curso semelhante e com uma função em comum são os tratos ou fascículos. Existe, contudo, grau considerável de superposição entre os tratos , bem como alguma variação individual.
Tratos Ascendentes: a) Tratos da coluna dorsal ( funículo dorsal): Os fascículos grácil e cuneiforme conduzem informação sensorial primária da propriocepção, consciente dos sentidos de posição e de vibração e do trato profundo (epicrítico ou discriminativo) e estereognosia, originada em receptores do mesmo lado do corpo. São neurônios sensoriais de primeira ordem e as fibras não se cruzam na medula, mas na decussação sensitiva bulbar, deixando um vão, o IV ventrículo. O fascículo grácil conduz a informação originada nos segmentos medulares abaixo de T6 estando presente, portanto, em todos os níveis medulares. O cuneiforme por sua vez, conduz informação originada acima de T6 e só está presente nos níveis cervicais e torácicos superiores. Ramos colaterais destes neurônios formam dois pequenos feixes de fibras que descendem por alguns segmentos antes de fazerem sinapses no interior da medula. São o fascículo septomarginal e o interfascicular. b) Trato Espinotalâmico: Conduz informação sobre dor, temperatura ( lateral), pressão e tato leve- protopático ( anterior) até o tálamo, mas só a originada na metade contralateral do corpo. As fibras de pequeno diâmetro que transportam as sensações citadas cursam em direção superior por um ou dois segmentos (no caso das fibas que originarão o trato Espinotalâmico lateral) ou vários segmentos (no caso das fibras que originarão o trato Espinotalâmico anterior) na periferia da ponta cinzenta dorsal. Estas extensões ascendentes de fibras aferentes, o fascículo dorsolateral ou trato de Lissauer, fazem, então, sinapse com neurônios da coluna dorsal, especialmente nas lâminas I, II e V. Depois de uma ou mais sinapses, as fibras subseqüentes cruzam para o lado oposto da medula para ascender como trato espinotalâmico ou sistema ventrolateral, localizado nos funículos lateral e ventral. c) Via Espinorreticular: Cursa pela região ventrolateral da medula, originando- se de neurônios medulares e terminando ( sem cruzamento) na formação reticular do tronco cerebral. Este trato representa um papel importante na sensação da dor, especialmente a da dor crônica profunda e faz parte da via Paleoespinotalâmica. d) O trato Espinomesencefálico é também uma via cruzada que ascende em associação com o trato espinotalâmico, conduzindo informação nociceptiva. Ficam incluídas neste trato as fibras espinotectais que se dirigem para o tecto do mesencéfalo, e as fibras que conduzem informação para a substância cinzenta periaqueductal e para outras estruturas do cérebro médio. e) Trato Espinocerebelar Dorsal: Contém fibras não- cruzadas do núcleo dorsal de Clarke e conduzem informação proprioceptiva inconsciente, subindo através do pedúnculo cerebelar inferior para terminar no córtex paleocerebelar. f) Espinocerebelar Ventral: Este sistema está envolvido no controle dos movimentos. Transmite informações de propriocepção inconsciente e detecção dos níveis de atividade do trato córtico-espinhal. Este trato é bem menos calibroso que seu homônimo dorsal, apesar de ser mais extenso. As fibras sobem através do pedúnculo cerebelar superior para o córtex paleocerebelar. Como as fibras sobem bilateralmente, este trato é de pouco valor para localizar lesões na medula.
Tratos Descendentes: a) Córtico-Espinhal: A maior via descendente e também a mais proeminente é o trato Córtico-Espinhal lateral, conduzindo informação do córtex motor contralateral do telencéfalo para a medula. Como este trato contém fibras que cruzaram ou decussaram ao nível da parte inferior do bulbo, suas fibras inervam os neurônios motores inferiores do mesmo lado na medula. O Córtico- Espinhal anterior, por outro lado, é bem menos proeminente e formado por fibras que só se cruzam pouco antes de terminar, na própria medula. Sua importância clínica é mínima, devido as suas pequenas dimensões. As fibras do trato Córtico- Espinhal terminam nas colunas cinzentas ventrais e na base da coluna dorsal. Os neurônios motores que suprem os músculos das extremidades distais recebem aferência monossináptica direta do trato piramidal. Outros neurônios motores são inervados por interneurônios. Cerca de um terço das fibras deste trato se projeta para a coluna cinzenta dorsal, a fim de atuar como modificadores da informação aferente, permitindo que o cérebro suprima certos estímulos que chegam enquanto presta atenção a outros. b) Fascículo Septomarginal e Interfascicular: O primeiro só aparece na metade inferior da medula, nos níveis de entrada das fibras que vão formar o fascículo grácil. O Interfascicular, por outro lado, só aparece na metade superior da medula, nos níveis de entrada das fibras que formam o fascículo cuneiforme. São dois pequenos feixes de fibras que descendem por alguns segmentos antes de fazerem sinapses no interior da medula. c) Trato Rubro- Espinhal: Origina- se no núcleo vermelho ou rubro contralateral e cursa pelo funículo lateral. O trato se projeta para os interneurônios nas colunas cinzentas espinhais e tem participação na função motora. d) Trato Vestíbulo- Espinhal: As fibras originam- se do núcleo vestibular lateral no tronco cerebral e descem sem cruzamento pelo funículo anterior da medula. Ele modula a atividade dos neurônios motores inferiores, em resposta à informação sensorial de origem vestibular. Esse trato possui uma divisão medial e outra lateral, ambas descendem pelo funículo anterior e) Sistema Retículoespinhal: Origina-se na formação reticular do tronco encefálico, sendo que a originária da ponte descende pelo funículo anterior e a de origem bulbar, pelo funículo lateral e desce pelos funículos anterior e lateral. As fibras que terminam nos neurônios da coluna cinzenta dorsal podem modificar a transmissão da sensibilidade do corpo, especialmente a dor. As que terminavam nos neurônios cinzentos anterirores influenciam os neurônios motores gama e, por este meio, diversos reflexos espinhais. f) Sistema Autonômico Descendente: Originando- se do hipotálamo e do tronco cerebral, estas fibras se projetam para os neurônios simpáticos pré- ganglionares na medula toracolombar ( coluna lateral) e para neurônios parassimpáticos pré- ganglionares nos segmentos sacros. g) Tratos Tectoespinhais lateral e medial: Origina no tecto mesencefálico. Desce pelo funículo anterior contralateral para terminar nos interneurônios cinzentos ventrais. Ele produz a rotação da cabeça, em resposta a estímulos súbitos, visuais ou auditivos. h) Fascículo Longitudinal Medial: Origina dos núcleos vestibulares do tronco cerebral. Algumas de suas fibras descem pela medula cervical para terminar nos interneurônios cinzentos ventrais. Ele coordena os movimentos da cabeça e dos olhos. Estes dois últimos sistemas de fibras descendentes só estão presentes em cada lado nos segmentos cervicais da medula. i) Trato Rafeespinhal: Origina- se, em grande parte, do núcleo magno da rafe do bulbo, terminando nas lâminas externas da ponta dorsal. Esta via inibe a transmissão da informação sensorial que chega à medula.
Fibras Intersegmentares: A maioria destas fibras curtas ascende ou desce adjacente à substância cinzenta. São o fascículo próprio. As fibras sensoriais primárias, conduzindo informação sobre dor, temperatura e tato, bifurcam- se ao entrarem na medula. Seus ramos ascendem e descendem por diversos segmentos medulares, pelo fascículo dorsolateral de Lissauer, antes de fazerem sinapse na ponta dorsal.
Fibras Intrasegmentares: Estas fibras estabelecem conexões com neurônios na metade oposta da medula e cruzam a linha média pela comissura branca anterior.
DIFERENÇAS REGIONAIS: A organização da substância cinzenta, bem como a presença ou ausência de grupos nucleares específicos, tem grande valor para a identificação de um determinado nível medular onde foi feito o corte. A abundância de substância branca e a presença ou ausência do fascículo cuneiforme são também muito úteis.
Ao nível da intumescência cervical ( C7), ainda existe abundância de substância branca, com os fascículos grácil e cuneiforme bem destacados. A forma geral da medula é oval. As colunas motoras laterais estão bem notáveis, assim como as pontas dorsais. Não existem o núcleo dorsal de Clarke e as colunas de células intermediolaterais.
- Ao nível mediotorácico ( T4), a substância branca parece grande em relação à quantidade bastante pequena da substância cinzenta. As pontas dorsais e ventrais são pequenas. A forma da medula é redonda. Há a presença de um proeminente núcleo de Clarke, além da coluna de células intermediolateral.
Na intumescência lombar ( L4), a medula varia de redonda a ligeiramente oval; as pontas dorsais e ventrais são grandes. A substância branca é relativamente pequena e há ausência do fascículo cuneiforme. Estão ausentes o núcleo dorsal de Clarke e as colunas de células intermediolaterais, enquanto que as colunas motoras laterais são bastante proeminentes. Em nível sacral, a substância cinzenta ocupa a maior parte da área do corte. O aspecto em H não é visível aos níveis sacrococcígeos. A substância branca fica reduzida a um revestimento relativamente fino.

V- MENINGES MEDULARES: A medula possui três revestimentos meníngeos concêntricos: a pia- máter, a aracnóide e a dura- máter. O revestimento mais interno, a pia- máter, é uma fina membrana vascular, intimamente aplicada à superfície da medula e de suas raízes nervosas. A pia- máter forma, de cada lado da medula, uma prega membranosa achatada e longitudinal denominada ligamento denticulado, que se dispõe ao longo de toda a extensão da medula em um plano frontal. A margem medial de cada ligamento continua com a pia- máter da face lateral da medula. A margem lateral apresenta cerca de 21 processos triangulares que se inserem na aracnóide e na dura- máter em pontos que se alternam com a emergência dos nervos espinhais. Os dois ligamentos denticulados são, pois, importantes elementos de fixação da medula. A aracnóide se dispõe entre a dura- máter e a pia- máter. É uma membrana translúcida que reveste a medula como se fosse um saco frouxo. Compreende um folheto justaposto à dura- máter e um emaranhado de trabéculas- as trabéculas aracnóideas, que unem este folheto à pia- máter. Entre a pia e a aracnóide existe o espaço subaracnóideo, o mais importante espaço e o que contém uma grande quantidade de líquor. O revestimento mais externo, a dura- máter, é membrana grossa e fibrosa. Ela reveste a medula de modo frouxo, assim como a aracnóide, com a qual fica em contato, embora separado por um plano teórico- uma fenda estreita contendo pequena quantidade de líquido- o espaço subdural. A dura é separada do periósteo do canal vertebral pelo espaço epidural ou peridural ou extradural que contém tecido adiposo (que forma o ligamento amarelo) e veias que constituem o plexo venoso vertebral interno. À medida que as raízes dos nervos espinhais passam em direção a seus forames intervertebrais, elas evaginam a aracnóide e a dura, formando manguitos nervosos meníngeos, que se estendem até a fusão das raízes dorsais e ventrais. Daí em diante, a dura- máter é contínua com os envoltórios de tecido conjuntivo do epineuro, enquanto a aracnóide e a pia- máter são contínuas com o perineuro e o endoneuro.

VI- PUNÇÃO LOMBAR E ANESTESIA EPIDURAL E RAQUIDIANA: A parte mais inferior do canal medular não contém a medula, de modo que as agulhas ocas podem ser introduzidas com segurança no espaço subaracnóideo, a fim de remover o líquor para fins diagnósticos ( punção lombar), ou injetar substâncias radiopacas para a visualização radiológica do canal medular e do seu conteúdo ( mielografia). Podem também ser administrados anestésicos no espaço epidural nos procedimentos cirúrgicos ( bloqueio epidural), como também no espaço subaracnóideo ( anestesias raquidianas). Como visto, as anestesias medulares são feitas apenas no primeiro ou no terceiro espaços meníngeos descritos. Ambos os tipos de anestesias normalmente são feitos na região entre L2 e S2, na cisterna lombar. A agulha perfura a pele, o tecido celular subcutâneo e o ligamento interespinhoso. Se a anestesia for epidural, o anestesista tem que ter a habilidade de notar a resistência imposta pelo ligamento amarelo. Já na anestesia raquidiana ,ainda há a perfuração da dura- máter e da aracnóide. Percebe- se que a agulha atingiu o espaço subaracnóideo pela presença do líquor que goteja da sua extremidade. O vazamento do líquor e a perfuração da dura- máter na anestesia raquidiana provocam dor de cabeça, incoveniente não presente na anestesia epidural. Além disto, a raquidiana é mais abrangente, pois o anestésico se difunde por todo o SNC através da circulação liquórica; enquanto a peridural atinge apenas as raízes dos nervos espinhais pela difusão do anestésico pelos forames intervertebrais.

VII- VASCULARIZAÇÃO MEDULAR: O suprimento sangüíneo para a medula tem duas fontes primárias:

Artérias Vertebrais
Artérias Radiculares
Cada artéria Vertebral, direita e esquerda, originam- se como ramos de sua respectiva artéria Subclávia. Elas ascendem, em forma de arco, pelo pescoço até a Sexta vértebra cervical onde, passam pelos forames dos processos laterais desta vértebra e continuam a ascender pelos forames dos processos transversos das outras vértebras superiores. Chegando na primeira vértebra cervical ( atlas), as artérias passam por trás da articulação atlanto- occipital, voltando- se para a frente para atravessarem a dura- máter, penetrando na fossa craniana posterior pelo forame magno, localizando- se lateralmente ao bulbo. As artérias se deslocam para a superfície anterior do bulbo e se confluem para formar a artéria basilar. Antes das artérias Vertebrais confluírem, elas emitem ramificações para formar as artérias Espinhais anterior e posterior.
A artéria Espinhal Anterior surge quando as ramificações diretas das artérias vertebrais confluem. Assim, ela toma uma localização mediana na fissura mediana anterior e segue a medula longitudinalmente na direção crânio- caudal até o cone medular. Ela emite artérias sulcais e penetram pela fissura mediana anterior, sendo responsável pela irrigação das colunas e dos funículos anterior e lateral da medula.
As artérias Espinhais posteriores partem como ramos das artérias Vertebrais, da parte anterior do bulbo, contornando- o para se localizarem posteriormente e descerem medialmente às radículas das raízes espinhais direita e esquerda. Descem longitudinalmente. Elas vascularizam a coluna e o funículo posterior da medula.
As artérias Radiculares são provenientes dos ramos espinhais das artérias segmentares do pescoço e tronco ( Tireóidea Inferior, Intercostais, Lombares e Sacrais). Estas artérias penetram nos forames intervertebrais com os nervos espinhais. As Radiculares anteriores fazem anastomose com a Espinhal anterior e as Radiculares posteriores com as Espinhais posteriores.As artérias Radiculares têm a função de aumentar o fluxo sangüíneo medular em algumas porções ( principalmente caudal- sacral e cranial- torácica superior). Entretanto, o papel de maior responsável pela vascularização é das artérias Espinhais.
O retorno venoso da medula espinhal é semelhante ao suprimento arterial, apresentando porém, maior variabilidade e quantidade de anastomoses. As responsáveis pela drenagem sangüínea são as veias ântero-medianas e ântero-laterais que drenam para as veias radiculares anteriores; já as veiasposterolaterais e posteromedianas drenam sangue venoso para as radiculares posteriores. As veias radiculares, então, atravessam a dura-máter e realizam anastomoses venosas epidurais. Este plexo venoso extra dural localiza-se no tecido adiposo situado no canal vertebral e encaminha o sangue para as veias seguimentares do tórax e abdomem.
VIII- FUNÇÕES MEDULARES: São duas as principais funções medulares- a de enviar impulsos sensoriais oriundos de receptores periféricos ao encéfalo e a de trazer dele impulsos motores direcionados a órgãos efetuadores, também periféricos. Os neurônios que exercem tais funções são ditos de projeção e os sensitivos, por possuírem seus corpos nos cornos da substância cinzenta, são ditos cordonais.
No entanto, sabe-se que a medula pode participar de reflexos independentemente do cérebro ou mesmo do encéfalo. Duas preparações experimentais demonstram isto: O animal descerebrado e o animal espinhal. Na primeira, uma secção ao nível médio ou inferior do mesencéfalo, há um bloqueio da inativação que o córtex cerebral exerce sobre a medula e o tronco encefálico. Isso faz com que os sinais facilitadores das funções medulares, oriundos do tronco, ajam com maior intensidade o que torna os reflexos mais excitáveis. No segundo, o animal tem um choque espinhal, ou seja, ele perde as funções medulares reversível ou irreversivelmente. Há ainda, casos de recuperações excessivas, com hiperexcitabilidade funcional.
Na filogênese, os anelídeos foram os primeiros seres a apresentarem arcos reflexos, sejam eles simples ( monossinápticos) e intrasegmentares ou compostos ( polissinápticos) e intersegementares. Tais circuitos surgiram pela necessidade de resposta mais elaborada a estímulos nocivos locais ou à distância.
No arco- reflexo simples, um estímulo provocado no receptor é transformado em impulsos, conduzido por um nervo sensitivo e, através de uma única sinapse, chega ao neurônio motor do mesmo segmento medular. Este motoneurônio é responsável pela ação reflexa de contração do músculo localizado na área estimulada. O arco- reflexo composto difere do arco- reflexo simples pelo fato de haver um interneuônio ( neurônio de associação) que percorre longitudinalmente os segementos medulares, interligando nervos sensitivos e motores, a fim de mediar ações reflexas em nervos localizados longe do local estimulado.
No ser humano há reflexos intrasegmentares polissinápticos. Porém, de um modo esquemático, pode- se dizer que os processos descritos se assemelham aos existentes nos humanos, com alguns aprimoramentos que serão vistos nos reflexos que seguem:
O reflexo de estiramento, ou reflexo miotático é mediado por um arco- reflexo simples. Ele depende de informações proprioceptivas de dois receptores encapsulados: os fusos neuromusculares e as esruturas neurotendinosas. Tais informações surgem por estímulos externos sobre fibras musculares intrafusais e sobre tendões. São transmitidos por fibras nervosas aferentes. Penetrando no corno posterior da medula, elas fazem sinapse diretamente com os motoneurônios alfa (a ) e gama( g ), presentes no corno anterior da medula a fim de realizar contração dos músculos agonistas. O neurônio motor alfa é maior, mais calibroso e responsável pela contração das fibras extrafusais. Já o meurônio motor gama é menor, menos calibroso e responsável pela contração das fibras intrafusais, principalmente durante a execução do ato motor, o que regula a sensibilidade do reflexo de estiramento, fenômeno denominado alça reflexa gama. Em um reflexo de estiramento, os neurônios aferentes também excitam interneurônios que inibem neurônios alfa dos músculos antagonistas. Portanto, a inervação recíproca dos músculos agonistas e antagonistas no reflexo miotático. O principal exemplo deste tipo de reflexo é o do quadríceps por abalo patelar.
Reflexo de retirada: Flexor e Extensor cruzado.
Ele é mediado por um arco- reflexo polissináptico, no qual estímulos nociceptivos e termoceptivos são impulsionados por neurônios aferentes e mediados por neurônios de associação que estimulam neurônios de um ou mais segmentos medulares para executar a flexão do membro estimulado. Paralelamente, os mesmos neurônios aferentes emitem colaterais que cruzam a linha média da medula e excitam os motoneurônios alfa. Estes se dirigem aos músculos extensores do membro contralateral. Ex.: mão na chapa e prego no pé.
Reflexo de coçar: Impulsos nociceptivos são conduzidos por neurônios aferentes, transmitidos a neurônios de associação intersegmentares e, a distância, estimulam motoneurônios a fim de executar a ação reflexa.
Reflexos viscerais: Estímulos interoceptivos se transformam em impulsos que são conduzidos por neurônios aferentes que fazem sinapse com neurônios pré- ganglionares, do SNA, a fim de executar a ação reflexa. Ex.: temperatura- tônus vascular, temperatura- sudorese, intestino-intestino, complacência- evacuação, peritônio- intestino.
Há ainda os reflexos de postura ( acomodação e sustentação corporais) e de locomoção ( conhecidos como o da marcha e o do galope). Não entraremos em detalhes em virtude da complexidade do assunto.

LESÕES MEDULARES

LESÃO DOS NERVOS ESPINHAIS: As raízes dos nervos espinhais são vulneráveis à compressão, em decorrência de alterações degenerativas nas articulações da coluna vertebral (espondilose) e do prolapso dos discos intervertebrais. Os discos intervertebrais prolapsados, na medula cervical, provocam dor no pescoço, com radiação para o braço e mão, acompanhada de parestesia, fraqueza e atrofia dos músculos que correspondem à distribuição radicular, perda da sensibilidade da pele que corresponde à distribuição dermatomérica, bem como perda dos reflexos tendinosos, servidos pela raiz em questão. Os discos intervertebrais lombares prolapsados causam dor nas costas e radiação da dor para as pernas, o que é conhecido como ciática. Um grande disco lombossacral prolapsado pode causar paralisia da bexiga e incontinência, exigindo neurocirurgia imediata. .
SÍNDROME DO NEURÔNIO MOTOR SUPERIOR: Fraqueza ou paralisia de músculos específicos, hiperreflexia e hipertonia ( paralisia espástica), decorrente de lesão das áreas motoras do córtex cerebral ou nas vias motoras descendentes.
SÍNDROME DO NEURÔNIO MOTOR INFERIOR: Fraqueza (paresia) ou paralisia ( plegia) de músculos individuais com hiporreflexia, hipotonia e hipotrofia ( paralisia flácida), decorrente da lesão dos neurônios motores da coluna anterior da medula.
POLIOMIELITE: Doença viral, caracterizada pela destruição dos neurônios motores da coluna anterior, levando à Síndrome do neurônio motor inferior.
TABES DORSALIS: Manifestação tardia da infecção sifilítica do Sistema Nervoso Central. Afeta principalmente as raízes dorsais dos nervos espinhais em sua divisão medial que contém as fibras dos fascículos grácil e cuneiforme. Conseqüentemente, têm- se perda da propriocepção consciente, do tato epicrítico, da sensibilidade vibratória e estereognosia (capacidade de perceber com as mão a forma e o tamanho de um objeto). A perda da propriocepção leva a uma marcha instável, caracterizada por elevação exagerada e oscilante das pernas (ataxia sensorial) exacerbada quando os olhos estão fechados (sinal de Romberg).
HEMISSECÇÃO DA MEDULA: Produz no homem um conjunto de sintomas conhecido como síndrome de Brown- Séquard, caracterizada por perda ipsilateral da propriocepção consciente e tato epicrítico ( fascículo grácil e cuneiforme), aparecimento também ipsilateral de sinais da lesão do neurônio motor superior e perda contralateral das sensibilidade térmica e dolorosa.
TRANSECÇÃO: Ocorre choque medular, ou seja, plegia e anestesia nos níveis abaixo a lesão. Se a causa for por compressão, os movimentos voluntários podem ser restituídos. Porém, se a trasecção for abrupta, tais movimentos serão irreversivelmente comprometidos. Em ambos os casos, tanto os reflexos somáticos quanto os viscerais são conservados.
SIRINGOMIELIA: Doença na qual há formação de uma cavidade no canal central da medula, levando a uma destruição das fibras da substância cinzenta intermediária central e da comissura branca, provocando uma perda da sensibilidade térmica e dolorosa dos membros superiores. Entretanto, há preservação do tato leve e propriocepção, recebendo isto a denominação de perda sensorial dissociada. A Siringomielia acomete com mais freqüência a intumescência cervical, resultando no aparecimento dos sintomas na extremidade superior dos dois lados.
COMPRESSÃO POR TUMOR: Normalmente, como ocorre com a siringomielia, o trato Espino-talâmico lateral é afetado, pela sua proximidade com o canal central e com a comissura anterior. Como as fibras responsáveis pela inervação sacral estão lacalizadas mais lateralmente, há a preservação de tais fibras numa compressão a partir do canal central, o que não ocorre numa compressão em direção a ele.
CORDOTOMIA: Procedimento cirúrgico utilizado no tratamento da dor refratária a analgésicos através da destruição seletiva dos tratos espinotalâmicos. Em certos casos de dor decorrente principalmente do câncer, aconselha- se a cordotomia, seccionando o trato espinotalâmico lateral.

PATOLOGIAS ASSOCIADAS

ESCLEROSE MÚLTIPLA: Doença imune, com lesão do fascículo cuneiforme da medula cervical, levando à perda da propriocepção das mãos e dos dedos, com perda da destreza e da estereognosia.
ATAXIA DE FRIEDREICH: Doença degenerativa hereditária, na qual os tratos espinocerebelares são desorganizados, causando incoordenação dos braços (tremor de intenção) e marcha oscilante de base alargada ( ataxia).
PARAPARESIA ESPÁSTICA HEREDITÁRIA: Distúrbio degenerativo hereditário, levando à rigidez da marcha, paraparesia, hiper- reflexia e resposta plantar extensora.

BIBLIOGRAFIA:

BURT, ALVIN M.
NEUROANATOMIA
EDITORA GUANABARA KOOGAN S.A., 1995, RIO DE JANEIRO

GROOT, JACK DE
NEUROANATOMIA
EDITORA GUANABARA KOOGAN S.A., 1994, RIO DE JANEIRO

CROSSMAN, A.R.; D. NEARY
NEURONATOMIA ILUSTRADO E COLORIDO
EDITORA GUANABARA KOOGAN S. A., 1997, RIO DE JANEIRO

YOUNG, PAUL A.; PAUL H. YOUNG
BASES DA NEUROANATOMIA CLÍNICA
EDITORA GUANABARA, 1998, RIO DE JANEIRO

MARTIN, JOHN H.
NEUROANATOMIA TEXTO E ATLAS
EDITORA ARTES MÉDICAS, 1998, PORTO ALEGRE

MACHADO, ÂNGELO
NEUROANATOMIA FUNCIONAL
EDITORA ATENEU, 1993, SÃO PAULO

22 de set. de 2009

Vertigem

VERTIGEM

  • Introdução
  • Quadro Clínico
  • Diagnóstico.
  • Prevenção.
  • Tratamento.
  • Qual médico procurar?
  • Prognóstico

Introdução

Vertigem é a percepção ilusória de movimento do corpo ou do ambiente, quase sempre descrita como sensação giratória. A vertigem pode ser um sintoma de quase todos os sistemas orgânicos. As causas mais comuns de vertigem envolvem fatores otológicos (do ouvido interno) e neurológicos, incluindo:

  • Vertigem Postural Benigna — É a causa mais comum de vertigem e é provocada por mudanças bruscas na posição da cabeça causando sensação giratória. Os movimentos desencadeadores mais comuns são o rolar na cama, inclinar-se para frente e olhar para cima. A causa provável é a presença de pequenos cristais que se acumulam nos canais semicirculares do labirinto, no ouvido interno, que estimulam as terminações dos nervos sensitivos em seu interior.

  • Labirintite aguda - Também conhecida como neurite vestibular, é uma inflamação do sistema de equilíbrio do ouvido interno, causada provavelmente por uma infecção viral.

  • Doença de Ménière — Causa episódios periódicos de vertigem, normalmente com zumbido na orelha e progressiva perda de audição às baixas-freqüências. A doença de Ménière é causada por uma mudança no volume do líquido dentro do ouvido interno. Embora a razão para esta mudança seja desconhecida, os cientistas suspeitam que possa estar relacionada ao barulho alto, a uma infecção viral ou a fatores biológicos dentro do próprio ouvido.

  • Causas neurológicas (a serem vistas em outra seção):

§ Enxaqueca associada à vertigem

§ Insuficiência Vertebrobasilar

§ Síndrome do pânico

§ Tumores cerebrais (de fossa posterior)

Quadro Clínico

  • Sensação rotatória (como se a pessoa estivesse girando no ambiente),
  • Sensação de desequilíbrio,
  • Náuseas,
  • Vômitos,
  • Zumbido em um ou ambos ouvidos,
  • Nistagmo (movimento anormal dos olhos que tem um componente rápido e outro lento),
  • Palidez, sudorese e/ou diarréia, nas crises labirínticas mais graves.

Diagnóstico

Apesar de parecer relativamente simples, de se conhecer os mecanismos que levam a doença e de ter o tratamento de fácil condução, o diagnóstico da causa da vertigem nem sempre é fácil devido ás variantes na apresentação da doença.

O diagnóstico é feito baseado na descrição do que a pessoa está sentindo. As causas de vertigem podem ser divididas em duas categorias principais:

  • A vertigem periférica que é a mais comum inclui a vertigem postural benigna, a labirintite e a doença de Ménière. A vertigem postural é diagnosticada quando se move a cabeça e aparece a vertigem, que melhora ao manter a cabeça em uma posição neutra. A labirintite e as crises de Ménière normalmente ocorrem abruptamente e duram de algumas horas a alguns dias. Pode haver náuseas e vômitos intensos além de variável perda da audição.

  • A vertigem central é um problema mais sério envolvendo o cerebelo (órgão que fica atrás do cérebro) ou o tronco cerebral.

O médico irá avaliar os movimentos dos olhos para identificar movimentos anormais (nistagmo). O padrão destes movimentos dos olhos pode ser útil para determinar se o problema é periférico ou central. Normalmente, nenhum exame adicional é necessário a menos que se suspeite da vertigem central.

Prevenção

A vertigem pode acontecer a qualquer pessoa, e não há nenhuma maneira de se prevenir o primeiro episódio. Como a vertigem pode estar associada a uma intensa sensação de desequilíbrio que pode levar a quedas, é importante evitar situações nas quais uma queda poderia causar uma lesão mais significativa, como subir uma escada ou trabalhar em um telhado inclinado.

Tratamento

O tratamento da vertigem compreende:

  • Repousar na cama;
  • Corrigir os erros alimentares que podem agravar a vertigem e os sintomas associados;
  • Modificar os hábitos ou vícios que possam ser fatores de risco, principalmente o consumo de açúcares de absorção rápida, álcool, café e fumo;
  • Usar remédios que suprimem a atividade do sistema labiríntico do ouvido interno, como a Meclizina, o Dimenidrato (Dramin®) ou a Prometazina (Fenergan®);
  • Vasodilatadores como o Dicloridrato de Betaistina (Labirin®) e o Dicloridrato de Flunarizina (Flunarin®, Sibeliun®);
  • Atropina (por via sub-cutânea ou sub-lingual);
  • Medicamentos anti-colinérgicos como a Escopolamina (Buscopan®);
  • Tranqüilizantes, como o Diazepam (Diempax®, Valium®);
  • Exercícios específicos para ajudar reduzir os sintomas, no caso da vertigem postural benigna, conforme esquema abaixo:

Extraído do New England Journal of Medicine

Volume 341:1590-1596 – 18 de Novembro de 1999

Benign Paroxysmal Positional Vertigo

Joseph M. Furman, M.D., Ph.D., and Stephen P. Cass, M.D., M.P.H.

  • Cirurgia: Indicada para casos específicos (tumores, falta de resposta no tratamento clínico em certas doenças), em combinação, ou não, com as outras formas de tratamento clínico.

Os pacientes que têm vertigem de causa central são encaminhados para investigação e tratamento com um neurologista.

Qual médico procurar?

Procure um otorrinolaringologista se você teve um episódio inédito de vertigem, especialmente se for associado com dor de cabeça e problemas de coordenação significativos. Além disso, procure-o se você tiver vertigem moderada que persiste depois de alguns dias.

Nos casos em que há suspeita de uma causa central (neurológica), o neurologista deverá ser consultado.

Prognóstico

Dependendo da causa, a vertigem pode durar só alguns segundos ou pode persistir durante semanas ou meses. Porém, em média, dura de algumas horas a alguns dias.

Os sintomas quase sempre são causados pela labirintite aguda e vão embora sem lesão permanente. Outras causas de vertigem podem resultar em sintomas que são mais persistentes.

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Publicado por

Informedicals Policlin

DEPARTAMENTO DE INFORMÁTICA MÉDICA – HOSPITAL POLICLIN

21 de set. de 2009

PRINCÍPIOS DE TERAPIA ANTIMICROBIANA

PRINCÍPIOS DE TERAPIA ANTIMICROBIANA: ceg, 07/01/2003

PRINCIPAIS BACTÉRIAS PATOGÊNICAS PARA O HOMEM






















GRAM POSITIVAS GRAM NEGATIVAS
AERÓBICAS
COCOS:
- Staphylococcus aureus
- Streptococcus: S. pyogenes
- S. pneumoniae (Pneumococo)
- S.faecalis (enterococo)
AERÓBICAS
COCOS:
- Neisseria gonorrhoea (gonococo)
- N. meningitidis (meningococo)
- Moraxella catarrhalis
BACILOS
- Listéria monocytogenes
- Corynebacterium diphtheriae
BACILOS
- Haemophilus (influenzae e outros)
- Eschirichia coli
- Salmonelas
- Shigelas
- Klebsiella pneumoniae
- Proteus (mirabilis, vulgaris,...)
- Enterobacter
- Pseudomonas sp.
- Serratia sp
- Legionella pneumophila
- Campylobacter sp
ANAERÓBICAS
- Clostridium
- Peptococcus
- Peptostreptococcus
ANAERÓBICAS
- Bacteróides, incluindo o fragilis
Outras: Espiroquetas (Treponema pallidum , Leptospiras...),
Micoplasmas, Clamídias...


Penicilina G e V: atuam sobre cocos gram positivos, cocos gram negativos, bacilos gram positivos, treponema, leptospiras. Inativadas pela beta-lactamase
Ampicilina e amoxicilina: agem sobre as mesmas bactérias que a penicilina G e V e ainda sobre alguns bacilos gram negativos (E. coli, Proteus, salmonelas, shigelas...). Inativadas pela beta lactamase (daí a razão dos compostos em que se associam um inibidor da beta lactamase: amoxicilina+ ac. clavulânico , ampicilina + sulbactam...). O ác. clavulânico é potente estimulador da síntese de beta lactamases.
Oxacilina: resistentes à beta lactamase, indicado para estafilococos. Agem bem sobre estreptococos (exceto o enterococo).
Carbenicilina e Ticarcilina: ação melhor sobre os gram negativos e bacteróides fragilis. A ticarcilina é mais ativa. Existe em associação com o ác. clavulânico.
Piperacilina: associada ao tazobactam; amplo espectro, incluindo estafilococos produtores de penicilinase e enterococos.
Cefalosporinas: as de primeira geração atuam melhor sobre os gram positivos que as de terceira geração; não penetram no líquor. As de terceira geração atuam sobre os bacilos gram negativos, sobre os cocos gram negativos, sobre o pneumococo.... Penetram bem no líquor.
Cefoxitina: de segunda geração, atua sobre Bacteróides fragilis e outros anaeróbios
Ceftazidima e cefoperazona: são as que apresentam melhor ação anti pseudomonas.
Macrolídeos: agem sobre os cocos gram positivos, bacilos gram positivos , clamídeas e micoplasmas. Não penetram bem no líquor.
Clindamicina: age bem sobre os cocos gram positivos, mas sua grande utilidade é a atuação sobre anaeróbios , incluindo o B. fragilis.
Aminoglicosídeos: agem essencialmente sobre os bacilos gram negativos. A gentamicina equivale-se à tobramicina, sendo ambas menos ativas mas menos tóxicas que a amicacina.
Cloranfenicol : antibiótico de largo espectro, de uso mais limitado em função do risco de aplasia de medula. Utilizado em infecções por anaeróbios (incluindo o B. fragilis) , salmonela...
Tetraciclinas: também de largo espectro, sendo a doxiciclina a mais utilizada, principalmente no tratamento de infecções por micoplasma e clamídeas.
Quinolonas: espectro bem amplo, atuam principalmente sobre bacilos gram negativos e estafilococos. A ofloxacina e principalmente a levofloxacina e outras mais novas, agem bem sobre estreptococos e outros patógenos do trato respiratório.
NÃO UTILIZAR EM GESTANTES: TETRACICLINAS E QUINOLONAS
NÃO UTILIZAR EM CRIANÇAS : TETRACICLINAS E QUINOLONAS
AÇÃO SOBRE ANAERÓBIOS DA CAVIDADE ORAL E TRATO RESPIRATÓRIO SUPERIOR: PENICILINAS, CLORANFENICOL, CLINDAMICINA, METRONIDAZOL...
AÇÃO SOBRE BACTERÓIDES FRAGILIS: METRONIDAZOL, CLORANFENICOL, CLINDAMICINA, CEFOXITINA...
NÃO PENETRAM NO LÍQUOR: MACROLÍDEOS, CEFALOSPORINAS DE PRIMEIRA E SEGUNDA GERAÇÃO.

PENICILINAS
1.000.000 U equivale a cerca de 600 mg.
Associação de Penicilina com aminoglicosídeo é sinérgica contra pseudomonas, enterococos, estreptococo viridans.
Toxicidade: pequena. Maior cuidado: reações de hiperssensibilidade.
a) faringite estreptocócica PNC G (proc,benzat),PNC V
b) pneumonia pneumocócica PNC G (cr, proc)
c) meningite meningocócica / pneumocócica PNC G (crist), Amp.
d) gonorréia PNC G proc(+probenecide)
e) erisipela PNC G (cr, proc, benz)
f) leptospirose PNC G (crist)
g) sífilis PNC G (benz, proc)
h) febre tifóide Ampicilina
i) infecções urinárias não complicadas Ampicilina
j) estafilococcias Oxacilina
l) infecções urinárias em gestantes Ampicilina
m) endocardite bacteriana sub-aguda PNC G crist + GM ou Ampicilina + GM
n) sinusites, otites, infec.respiratórias Amoxicilina +/- clavulanato
o) profilaxia de febre reumática PNC benzatínica, Pen V
p) profilaxia da endocardite bact. Amoxicilina
q) erradicação do H. Pylori Amoxicilina

CEFALOSPORINAS
1ª Geração: cefalotina, cefazolina, cefalexina, cefadroxil...
a) cobertura de infecções por cocos gram positivos aeróbicos, incluindo o estafilococos: pneumonias, infecç. cutâneas...
b) associado a um aminoglicosídeo em infecções por germes não identificados
c) profilaxia de infecções cirúrgicas
d) alternativa à PNC contra cocos gram positivos (exceto o enterococo e listeria)

2ª geração: cefaclor, cefoxitina, cefuroxima...
A cefoxitina é um potente estimulador da síntese de beta lactamases
a) infecções por Haemophilus influenzae
b) Cefoxitina: boa ação sobre o Bacteróides fragilis
c) profilaxia de infecções cirúrgicas

3ª geração: ceftriaxona, ceftazidima, cefoperazona, cefotaxina, cefizima...
a) infecções graves por bacilos gram negativos ; no caso de infecções por Pseudomonas aeruginosa, a cefoperazona e especialmente a ceftazidima são as mais indicadas.
b) meningites meningocócica, pneumocócica, e por gram negativos
c) ceftriaxona: dose única na blenorragia (125 - 250 mg IM)
d) sifilis

4º geração: cefepima, cefpiroma
Agem bem melhor sobre os gram positivos que as cef. de 2ª ou 3ª geração. Pouca ação sobre anaeróbios.

OUTROS LACTÂMICOS:
- IMIPENEN - CILASTATINA: Espectro muito amplo (gram positivos e gram negativos, anaeróbios) ; permanece como droga de reserva.

- MEROPENEN: similar ao imipenen

- AZTREONAN: Age somente em gram negativos; permanece como droga de reserva.

MACROLÍDEOS
a) como substituto da penicilina G (ou V) na faringite estreptocócica, na pneumonia pneumocócica, na erisipela, na sifilis,...NÃO NA MENINGITE !!! - Questionável se a Azitromicina erradica estreptococos em tratamento de 3 dias.
b) pneumonia por mycoplasma ou clamídia
c) nas uretrites por clamídias (Azitromicina)
d) nas pneumonias por Legionella (+/- rifampicina)
e) blenorragia (azitromicina 1 g em dose única)
f) toxoplasmose: espiramicina (segura na gravidez) e azitromicina
g) erradicação do H. pylori: claritromicina

AMINOGLICOSÍDEOS
a) pielonefrite aguda enquanto se aguarda o resultado da urocultura
b) colecistite aguda (só ou associada a cefalosporina)
c) associada a PNC G ou a Vancomicina nas endocardites bacterianas
d) associada a uma cefalosporina em infecções graves em que o germe não foi identificado
e) associada à clindamicina ou ao cloranfenicol ou ao metronidazol: em infecções por múltiplos germes, em que o B. fragilis provavelmente esteja presente.
f) Espectinomicina: dose única na blenorragia (2 a 4 g IM)
g) via oral (pequeníssima absorção) quando se quer esterilização do colon em pacientes com encefalopatia hepática.

LINCOSAMINAS
a) A clindamicina é o representante mais importante, por ser mais ativa que a lincomicina. Esta última é utilizada com frqüência quando se quer um substituto para a penicilina, em infecções não severas.
b) A clindamicina é utilizada em infecções por cocos gram positivos, incluindo-se as por estafilococos mas, especialmente, em infecções por anaeróbios (incluíndo-se o Bacteróides fragilis) mas é inferior ao metronidazol nesta última indicação
c) toxoplasmose: clindamicina + pirimetamina (pac. alérgicos à sulfa)
d) malária por P. falciparum resistente à cloroquina (+ quinino)

CLORANFENICOL E TIANFENICOL
a) febre tifóide e paratifoide
b) infecções por Bacteróides fragilis
c) Meningite meningocócica e pneumocócica em paciente alérgico à PNC
d) infecções por H. influenzae resistente a ampicilina

TETRACICLINAS (Doxiciclina)
Contraindicados na gestação e em crianças (< 8 anos ??)
a) infecções respiratórias em portadores de DPOC e tratamento de pneumonias comunitárias que não exijam internação
b) uretrites por clamídias (doxiciclina)
c) pneumonias por micoplasma
d) DIP - doxiciclina
e) sifilis

QUINOLONAS
Contraindicados na gestação e em crianças (< 8 anos ?? - utilizado em crianças, não foi relatado problemas)
Ác. pipemídico e norfloxacino: só alcançam níveis terapêuticos na urina, próstata e fezes.
a) infecções urinárias
b) diarréias: dos viajantes, shigelloses...
c) otite externa invasiva e pneumonia em pacientes portadores de fibrose cística (geralmente por pseudomonas)
d) gonorréia (?)
e) pneumonia por legionela
f) DIP: ofloxacino 400 mg 12/12 hs (+ metronidazol ou clindamicina ?)
g) As novas, como a levofloxacina, moxifloxacina e a gatifloxacina , agem bem sobre pneumococo, H. influenzae, Klebsiela, Moraxela, estafilococos, Legionela, Micoplasma, Clamydias...

SULFAMETOXAZOL-TRIMETOPRIM
a) infecções urinárias, prostatites
b) infecções respiratórias em portadores de DBPOC
c) pneumonia por Pneumocystis carinii (profilaxia e tratamento)
d) salmoneloses e outras diarréias agudas (dos viajantes...)
e) sinusites

METRONIDAZOL
a) giardíase
b) tricomoníase
c) infecções por anaeróbios
d) colite pseudomembranosa
e) DIP (+ ofloxacino)
f) encefalopatia hepática

QUINUPRISTINA + DALFOPRISTINA
Associação antimicrobiana recente, reservada para infecções graves, especialmente as causadas por estafilococos resistentes.

LINEZULIDA
Reservado para infecções estafilocócicas resistente à vancomicina

ANESTESIA EM URGÊNCIA E EMERGÊNCIAS MÉDICAS

Ac. Augusto Rafael Barsella

INTRODUÇÃO

Para o estudo das implicações anestésicas em urgências e emergências médicas é preciso conceituar estes dois termos. Urgência significa ser feito com rapidez, indispensável, imprescindível. E emergência refere-se à situação crítica, acontecimento perigoso ou fortuito.
As cirurgias realizadas sejam elas em caráter de emergência ou urgência colocam o anestesiologista frente a situações em que o estado físico do paciente pode ou não estar alterado. Na realidade, tem-se que após indicação de um procedimento cirúrgico, quando este for de caráter de urgência há uma possibilidade limitada de retardar algum tempo a operação em prol do doente a fim de que se possa prepara-lo adequadamente. Já em situação de emergência o tratamento cirúrgico é imediato, pois o paciente corre risco de morte.
Os pacientes que necessitam de procedimentos cirúrgicos, ou de emergência ou de urgência, têm maiores riscos, comparados a pacientes com cirurgia eletiva, devido à própria gravidade da agressão cirúrgica; como também à falta de preparo adequada e ideal do paciente. A estes pacientes a simples possibilidade estômago cheio e conseqüente possibilidade de aspiração pulmonar, ou ainda a situação de choque, aumenta estes riscos. Para as cirurgias de urgência ainda é possível, mesmo que precariamente, avaliar o estado do paciente antes de realizar a cirurgia.
Exemplos comuns de cirurgias de emergência são os politraumatizados, as gestantes com ruptura uterina ou deslocamentos de placenta. Exemplos de cirurgia de urgência estão os casos de apendicite, úlcera perfurada, colescitite, obstrução intestinal e outras.
As particularidades dos pacientes que necessitam de cirurgia de emergência ou urgência influenciam significativamente na escolha da conduta anestésica. Boa observação clínica e capacidade de reconhecer antecipadamente as situações críticas que tais detém pacientes detêm são os mais valiosos dotes do anestesiologista especialistas nessas afecções.

AVALIAÇÃO PRÉ-ANESTÉSICA

A avaliação e o preparo pré-operatórios dependerão da gravidade do paciente e do grau de urgência ou emergência cirúrgicas que possui. Sempre que a situação permitir deverá ser realizada anamnnese e exame físico. Na anamnese são úteis as informações referentes às enfermidades que o doente possui, suas patologias associadas, os medicamentos em uso, a experiência anestésica prévia, a alergia à drogas, tempo de jejum e tipo de alimento ingerido na última refeição. No paciente vítima de trauma o tempo de jejum é o tempo decorrido entre a última ingestão e o momento do acidente, pois o esvaziamento gástrico pára ou diminui após o trauma. No exame físico principal atenção deve ser dada à avaliação da via respiratória, da ventilação, situação hemodinâmica e nível de consciência. Para efeitos didáticos segue abaixo uma avaliação sucinta dos principais sistemas e regiões do organismo que devem ser pesquisados numa avaliação de emergência:
01 – Sistema Respiratório: Observar se a respiração está espontânea ou não; observar ventilação, analisando ritmo e profundidade das incursões respiratórias; verificar presença de dispnéia ou cianose, pesquisar doenças pulmonares obstrutiva crônicas;
02 – Sistema Cardiovascular: Palpar pulsos periféricos avaliando freqüência, ritmo e amplitude; verificar pressão arterial e proceder à ausculta cardíaca; estar atento a possíveis traumas cardíacos diretos, contusos ou perfurantes, podendo evoluir a tamponamento cardíaco a conseqüente Tríade de Beck (hipotensão arterial, abafamento de bulhas, ingurgitamento das vais jugulares);
03 – Sistema Nervoso Central: Observar ferimentos em região craniana, nível de consciência, tamanho e reatividade pupilar. A Escala de Coma de Glasgow permite uma estimativa da gravidade da disfunção neurológica;
04 – Coluna Cervical: Presença de rouquidão, estridor, dor e incapacidade de movimentação dos membros são sinais que podem caracterizar uma lesão cervical;
05 – Abdome: Avaliar o grau de distensão abdominal e o débito da sonda nasogástrica;
06 – Extremidades: Atentar ao fato de que lesões em bacia e coxa podem provocar importantes hemorragias;

EXAMES COMPLEMENTARES PRÉ-OPERATÓRIOS

As razões para solicitação de determinado tipo de exame devem ser baseadas em na história e no exame físico do paciente; tal requisição dependerá, então, da possibilidade ou não de realização destes exames.
Quando a situação permitir esses exames devem ser sempre solicitados: radiografias de crânio, de coluna cervical, de tórax, de pelve; quantificação de glicemia, hematócrito, hemoglobina, creatinina, uréia, sódio, potássio, osmolalidade plasmática e gasometria arterial.

MEDICAÇÃO PRÉ-ANESTÉSICA

A medicação pré-anestésica pode ser dispensada para pacientes inconscientes ou desorientados. A dor, quando existente pode, e deve, ser combatida com opióides em pequenas doses administrado de forma progressiva até abolição da dor. Como droga de escolha para esta situação está a meperidina, em doses de 1,0 mg/kg. Barbitúricos e benzodiazepínicos devem ser evitados nas situações de emergência, pois exacerbam a dor existente, deprime a consciência, a ventilação e o reflexo protetor da via aérea.
Medidas farmacológicas podem ser tomadas com o intuito de aumentar o pH e reduzir o volume de líquido gástrico, reduzindo assim o risco de síndrome de aspiração pulmonar ou síndrome de Melson. Está indicado o uso de metaclopromida (antagonista do receptor dopaminérgico e antiemético central), exceto para casos de obstrução intestinal; indicado também o uso de antiácidos não particulados, agentes bloqueadores de H2. Contra indicados estão os anticolinérgicos, pois estes diminuem o tônus do esfíncter esofagiano inferior possibilitando refluxo e regurgitação silenciosa.

MONITORIZAÇÃO

Segundo a ASA (American Society of Anesthesiologists) padrões mínimos de monitorização devem ser obedecidos, contudo todos os dispositivos monitorizadores nunca devem substituir o anestesiologista. Ainda segundo a ASA, a monitorização não invasiva básica do paciente traumatizado inclui o eletrocardiograma, a pressão arterial, a freqüência respiratória, a temperatura corporal e a contínua presença de um anestesiologista ou enfermeiro anestesista. Este nível mínimo de monitorização independe do local da anestesia.
Há outros meios de monitorar o paciente que podem, e devem, ser usados mediante a possibilidade da situação e gravidade do paciente:
01 – Pressão Venosa Central: avaliação do débito cardíaco e do retorno venoso, importante via de infusão de drogas;
02 – Sonda vesical: observação da diurese, bom indicador da perfusão renal e do balanço hídrico;
03 – Pressão arterial invasiva: feito através de cateterização arterial, útil para coleta de amostras de sangue;
04 – Oximetria de pulso: observa a oxigenação sangüínea, possibilita a detecção precoce de hipoxemia, avalia também a freqüência cardíaca;
05 – Eletrocardiograma: reconhecimento de arritmias, alterações secundárias á distúrbios hidroeletrolíticos e de isquemia miocárdica;
06 – Cateter em Artéria Pulmonar ou Swan - Ganz: fornece informações das câmaras direita e esquerda do coração, permite medidas do débito cardíaco.

CONDUTA PEROPERATÓRIA

A anestesia geral é a técnica de escolha para os pacientes com ferimentos múltiplos. A anestesia regional pode parecer atraente, pois tem pouca interferência com a função cardiopulmonar do paciente, contudo está contra indicada em casos de depressão respiratória, hipotensão, choque, coagulopatias, traumatismo craniano e raquimedular. Isto porque os pacientes com traumas sérios são beneficiados com a intubação traqueal e a ventilação mecânica. A anestesia regional é indicada para lesão isolada nos membros.
A anestesia geral tem sua administração segura para doentes com múltiplos ferimentos através do uso de drogas que minimizem a hipertensão intracraniana e a depressão miocárdica. Drogas altamente lipofílicas, como o tiopental e o sufentanil, podem ser titulados até o efeito desejado. Pacientes com instabilidade hemodinâmica necessitam de doses reduzidas de anestésicos durante a cirurgia pelo fato de que a redução do volume de sangue, provavelmente, concentre a droga no local ativo do cérebro e o fluxo hepático reduzido pode prolongar a depuração do anestésico. A intoxicação alcoólica aguda também reduz o consumo de anestésicos; enquanto que a intoxicação alcoólica crônica provoca uma um aumento na quantidade necessária de anestésico. As contra indicações são para a quetamina em pacientes com trauma de cabeça, pois aumenta a pressão intracraniana e a pressão arterial. A quetamina pode causar ainda hipotensão em pacientes com tônus simpático elevado. A succinilcolina é contra indicada pela hiperpotassemia que pode causar em pacientes com lesão do neurônio do nervo motor superior. E por fim, o óxido nitroso está contra indicado em pacientes com espaços aéreos potencialmente fechados – como pneumotórax, pneumoencéfalo – nos quais o gás poderia se acumular.

PARTICULARIDADES DO PACIENTE EM ESTADO DE EMERGÊNCIA OU URGÊNCIA

Estômago cheio: Sendo quase impossível determinar quanto tempo o estômago demora a se esvaziar após uma refeição; quando a anestesia geral é necessária esta é uma situação de grande preocupação para o anestesiologista. Pois com a perda do reflexo protetor da via aérea há a possibilidade da aspiração pulmonar do conteúdo gástrico (pneumonia aspirativa). Quando o material aspirado for sólido, existe o risco de obstrução respiratória e morte. Sendo líquido, provoca lesão pulmonar e esta dependerá do pH deste líquido aspirado. Pacientes politraumatizados e gestantes devem sempre ser considerados portadores de estômago cheio. Como precaução tem se:
01 – Intubação traqueal com o paciente acordado: difícil realização, desagradável ao paciente, contra indicada em pacientes com ferimento de ocular aberto, ferimento penetrante no pescoço, lesão de coluna cervical, doença coronariana e hipertensão arterial.
02 – Descompressão gástrica com sonda: não garante o esvaziamento gástrico, mas é de grande valia quando há grande volume de líquido, como nas obstruções intestinais.
03 – Intubação seqüencial rápida: com um relaxamento muscular obtido faz-se a intubação traqueal e infla-se o rapidamente o balonete da sonda traqueal. A compressão cricoesofágica (manobra de Sellick) associada aumenta a segurança da técnica.
04 – Uso de drogas: uso de drogas que diminuam o tempo de esvaziamento gástrico, ou que aumentem o pH do conteúdo gástrico podem ser útil, contudo só podem ser utilizadas em cirurgias de urgência. São exemplos de tais drogas a atropina, a cimetidina e a metoclopramida.
Caso o paciente não possa por si só manter a permeabilidade da via aérea, é necessário auxílio. Este pode ser conseguido pela cânula orofaríngea (Guedel), e a máscara laríngea que mantêm as vias aéreas pérvias, contudo não impossibilitam a aspiração do conteúdo gástrico. A colocação de um tubo traqueal atende a estes objetivos: permeabilidade e proteção da via aérea.
A realização de anestesias em casos de urgência ou emergência requer habilidade, espírito de equipe e experiência. São fundamentais as trocas constantes de informações com a equipe de cirurgiões.

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Tumores Carcinóides e Síndrome carcinóide: Conceitos e Inovações

Tumores Carcinóides e Síndrome carcinóide: Conceitos e Inovações

Autor: Daniel A. Vaena - Residente de Clínica Médica

Os tumores carcinóides fazem parte do grupo dos tumores neuroendócrinos, cujas células de origem são integrantes do sistema APUD (amino precursor uptake and decarboxylation). Estes tecidos produzem uma variedade de peptídeos com múltiplas ações. Os tumores carcinóides são subclassificados de acordo com o orgão em que se originam e se distribuem principalmente ao longo do tubo digestivo. São considerados benignos ou malignos, baseando-se no seu comportamento biológico, sendo esta diferenciação difícil pelo patologista.

A síndrome carcinóide corresponde ao conjunto de sinais e sintomas (mais freqüentemen- te, flusli e diarréia) causados pelas substâncias liberadas pelo tumor. Nem todos os tumo- res carcinóides se apresentam com síndrome carcinóide, e a produção de determinada substância pelo tumor não significa que ocorrerá a síndrome. Em geral, para que ocorra a síndrome carcinóide é necessária a presença de metástases hepáticas, mas há algumas exceções. Além disso, nem sempre que há metástases hepáticas irá haver a síndrome carcinóide.

Classificação e Patogênese

Os tumores carcinóides são tradicionalmente divididos em três grupos de acordo com a embriogênese do orgão em que se encontram: intestino proximal (foregut), que inclui o trato respiratório, entre outros; intestino médio (midgut), que inclui o jejunoíleo e o apêndice, entre outros; e o intestino distal (hindgut), que inclui o reto, entre outros. O tumor carcinóide localizado no apêndice é o mais comum (40%), sendo um achado em uma a cada 200-300 apendicectomias. A seguir vêm os tumores em jejunoíleo, reto e brônquios. Nos estudos de autópsia, os tumores carcinóides são muito freqüentes, sendo a maior proporção para os de jejunoíleo.

Com relação à incidência de metástases para linfonodos regionais e à distância, ela aumenta de acordo com o tamanho do tumor primá- rio. As metástases em geral se fazem presentes se o tumor for maior que 2 cm; no caso do intestino delgado, há inúmeras exceções a esta regra.

As metástases hepáticas ocorrem principalmente com tumores originários do midgut, principalmente do jejunoíleo. Assim, na maioria dos casos (75 a 87%) de síndrome carcinóide trata-se de um tumor do midgut. O carcinóide de apêndice raramente gera metástases hepáticas ou síndrome carcinóide (<2%).

As manifestações clínicas da síndrome carcinóide são principalmente atribuídas à secreção de serotonina pelo tumor. Esta substância só atinge a circulação sistêmica, produzindo sintomas na presença de metástases hepáticas, já que do contrário é lançada na circulação portal e metabolizada pelo fígado. Tumores carcinóides que constituem exceção a esta regra são o brônquico, o ovariano e, por vezes, o pancreático (drenagem para retroperitôneo).

A serotonina está diretamente envolvida na gênese do flush, que ocorre na síndrome carcinóide (veja abaixo), assim como na diarréia e na produção de tecido fibroso, que po- de ocorrer em vários locais do organismo (mesentério, retroperitôneo, corpos cavernosos, válvulas cardíacas direitas). Além da serotonina, postula-se que vários outros peptídeos contribuam para a síndrome, dentre eles a histamina nos casos que cursam com broncoconstrição.

A serotonina (5-HT) é produzida na célula tumoral a partir do 5-hidroxitriptofano (5- HTP), por meio da enzima dopa descarboxilase. A serotonina é então convertida para o ácido 5-hidroxiindolacético (5-HIAA), que é eliminado na urina e constitui um auxílio diagnóstico (veja abaixo). Alguns tumores têm deficiência de dopa descarboxilase e liberam 5-HTP diretamente na circulação, o que gera uma síndrome carcinóide atípica. Esta síndrome é mais comum com os carcinóides de foregut (especialmente brônquicos). Nestes casos o valor de 5-HIAA na urina é normal, mas há au- mento de 5-HT e 5-HTP

Clínica

Não há faixa etária típica de pacientes com tumores carcinóides. A maioria dos tumores carcinóides que não se acompanham de síndrome carcinóide não produz sintomas, sendo o diagnóstico em geral um achado cirúrgico ou endoscópico. Carcinóides intestinais podem causar dor abdominal recorrente, intussuscepção e até obstrução intestinal em função do tamanho e/ou fibrose mesentérica que acarretam. Pacientes com metástases hepáticas podem se apresentar com um aumento maciço do fígado sem outros sintomas. É digno de nota que muitas vezes estes pacientes têm o estado geral preservado e testes de função hepática normais.

Carcinóides brônquicos podem causar hemoptise, tosse e pneumonia obstrutiva. Raramente tumores carcinóides podem secretar peptídeos variados que causam síndromes clínicas diversas, como por exemplo a secreção de ACTH. De fato, alguns estudos mostram ser os carcinóides de foregut a causa mais comum do Cushing ectópico.

Na síndrome carcinóide, o principal sintoma é o flush facial e de tronco superior, violáceo, associado a prurido, diarréia, palpitações e edema conjuntival. Carcinóides brônquicos mostram um flush atípico, mais prolongado e eritematoso, de corpo inteiro, com as outras manifestações e maior tendência a hipotensão. As crises podem ser espontâneas ou precipitadas por catecolaminas, certos alimentos ricos em tiramina ou exercício físico. Com episódios repetidos de flush, a pele pode adotar uma coloração violácea cronicamente, além de sinais clínicos de pelagra. A deficiência de niacina é comum neste grupo de pacientes.

A diarréia ocorre isoladamente em 15% dos casos, geralmente com fezes aquosas. O comprometimento valvular cardíaco (11 a 56% dos pacientes com a síndrome) em geral ocorre à direita, em função da drenagem venosa do fígado, mas pode ocorrer à esquerda (ex. : carcinóide brônquico). Ocorre fibrose do aparelho valvar e endocárdio, resultante em dupla lesão (predominando insuficiência) tricúspide e estenose pulmonar. Estudos mostram que 80% dos pacientes com lesões cardíacas apresentavam evidências de insuficiência cardíaca. Outros sintomas e sinais da síndrome carcinóide são a broncoconstrição, disfunção sexual, obstrução ureteral por fibrose retroperitoneal e alterações oculares.

Diagnóstico, Localização e Estadiamento

Nos pacientes sem síndrome carcinóide, o diagnóstico do tumor geralmente é firmado pela histopatologia a partir da investigação de sinais e sintomas locais, quando estes existem (ex.: massa hepática, constipação) ou incidentalmente (ex.: endoscopia digestiva alta para sintomas dispépticos). Macroscopicamente, o tumor tem coloração brancacenta, e, no caso de tumores primários, geralmente são nódulos submucosos menores de 3 cm, ao contrário das metástases. À microscopia, são vistos grupos de células arredondadas em volta de um estroma fibroso.

O tumor carcinóide típico é subclassificado em vários padrões de diferenciação que têm importância prognostica. A imuno-histoquímica (ex. : cromograninas) ajuda a definir o tumor como neuroendócrino, e o conteúdo de serotonina celular ajuda a subdefini-lo como carcinóide*.
*Existe um subtipo histológico, denominado carcinóide atípico, que ocorre principalmente no pulmão e consiste numa forma intermediária entre o carcinóide típico e o carcinoma pulmonar de pequenas células [SCLC), cujo estadiamento e tratamento se assemelham ao do SCLC e não será aqui abordado. A histologia atípica não tem correlação com a presença de síndrome carcinóide atípica.

Em pacientes com quadro clínico compatível com síndrome carcinóide, sem sinais de localização do tumor, deve-se primeiro confirmar o diagnóstico da síndrome. Este pode ser feito através da dosagem de 5-HIAA urinário em grande parte dos casos. Várias séries mostram uma sensibilidade em torno de 75% e uma especificidade de 100%. O 5-HIAA é quantificado em urina de 24h, e o coletor deve conter um determinado volume de ácido clorídrico (em geral fornecido pelos laboratórios). O paciente não deve ingerir uma lista de frutas ou medicamentos (incluindo acetaminofen) 48h antes do exame, causas de falso-positivo. Outros testes são a dosagem de serotonina urinária e plaquetária (sensibilidade maior que 5-HIAA) e a dosagem de 5-HTP urinária no caso de síndrome atípica.

Condições clínicas que podem mimetizar a síndrome carcinóide são a mastocitose sistêmica, perimenopausa e o uso de drogas, como clorpropamida, diidropiridinas e ácido nicotínico.

Lembramos que o 5-HIAA pode estar elevado, mesmo em pacientes sem síndrome carcinóide, refletindo uma baixa produção de serotonina pelo tumor, insuficiente para gerar sintomas. Um advento recente na capacidade de localização dos tumores carcinóides foi proporcionado pela cintigrafia de corpo inteiro com somatostatina ou octreotide marcados (Octreoscan), com sensibilidades que variam de 75-95% e especificidade de 100% (para tumores neuroendócrinos em geral). O outro emprego deste teste é no estadiamento de pacientes já com um diagnóstico histológico do tumor (presumívelmente) primário, mesmo se não houver síndrome carcinóide. O estadiamento inclui também uma tomografia computadorizada, útil na visualização de metástases hepáticas e retroperitoneais, mas não do tumor primário. Outros marcadores que podem ser utilizados para localização são o peptídeo intestinal vasoativo (VIP) e a metaiodobenzilguanidina (MIBG), esta com sensibilidade menor que a somatostatina. Metástases ósseas podem ser detectadas com o scan de somatostatina ou com tecnécio marcado. As metástases ósseas são raras nos tumores de midgut.

Carcinóides brônquicos podem ser visualizados como nódulos na radiografia de tórax, e tumores de cólon direito e ceco podem ser identificados no clisteropaco. A descoberta de tumores carcinóides de intestino delgado, através da seriografia, é quase sempre impossível pelo seu reduzido tamanho.

Tratamento

O tratamento curativo dos tumores carcinóides é eminentemente cirúrgico. É idealmente realizado nos pacientes que não apresentam doença metastática a distância. Para tumores de apêndice e reto até 1 cm recomenda-se a ressecção local apenas; tumores maiores e carcinóides de intestino delgado de qualquer tamanho merecem, segundo muitos autores, tratamento cirúrgico mais radical para assegurar margens livres de tumor e retirada de linfonodos possivelmente acometidos. (Hemicolectomia direita, por exemplo, no caso do apêndice).

Metástases hepáticas isoladas têm também indicação cirúrgica caso possível. Não está definida a necessidade de se pesquisar e ressecar o tumor primário nestes casos.

Na doença disseminada, certos grupos advogam o tratamento cirúrgico citorredutor, retirando o máximo de tumor e metástases possíveis, acreditando haver aumento na sobrevida por se tratar de tumor de crescimento lento. Em alguns centros, a cirurgia tem sido empregada juntamente com o octreotide e embolização tumoral pela artéria hepática com benefícios. O transplante hepático foi realizado até hoje em poucos pacientes selecionados. A eficácia de vários quimioterápicos, isoladamente e em combina- ções, contra o tumor carcinóide, foi estudada e é baixa, em se tratando de remissão completa, tendo maior ação nos tumores mais indiferenciados. A radioterapia é empregada no controle das metástases ósseas.

Outros autores reservam a quimioterapia sistêmica e a embolização tumoral via artéria hepática apenas para pacientes com doença disseminada que apresentem manifestações graves da síndrome carcinóide, que pioram a qualidade de vida. A decisão de tratar, visando reduzir a massa tumoral, deve-se ao fato de que a intensidade dos sintomas da síndrome e o nível de 5-HIAA correlacionam-se diretamente com a massa tumoral.

O controle dos sintomas da síndrome carcinóide deve ser tentado com sintomáticos inicialmente, como antidiarréicos e broncodilatadores, além de evitar situações precipitantes de crises. Caso o paciente apresente manifestações graves, o medicamento de escolha atualmente é o octreotide (via subcutânea), de maneira regular. É eficaz no controle do flush e da diarréia em muitos pacientes. Há outras drogas com resultados variados que podem ser utilizadas em pacientes selecionados, como ciproheptadina, ondasetron, alfametildopa, antihistamínicos e prednisona. O tx-interferon tem eficácia comparável ao octreotide, embora com mais efeitos colaterais. Lesões cutâneas pelagróides respondem à reposição de niacina.

Caso não haja controle das crises carcinóides de alta gravidade com as drogas acima, indicase a cateterização da artéria hepática para embolização das lesões metastáticas com a infusão opcional de quimioterápicos. A hepatectomia parcial, visando redução da massa tumoral, mesmo sem intenção curativa, é uma possibilidade.

Pacientes candidatos à terapia citorredutora e com acometimento valvular cardíaco grave têm sido submetidos a cirurgia valvular em alguns centros, o que tem ajudado a aumentar a sobrevida deste grupo. Com relação a pacientes candidatos a cirurgia citorredutora, mas que são assintomáticos do ponto de vista cardiovascular, não está definido o valor do ecocardiograma para screening de lesões valvulares.

Os efeitos antitumorais do octreotide e do interferon foram estudados, e estas drogas podem ser consideradas tumorestáticas por um certo período, embora não tenha se provado aumento na sobrevida com seu uso isolado. Da mesma forma, não parece haver aumento na sobrevida com o controle da síndrome carcinóide per se. Por fim, vale lembrar que procedimentos anestésicos são precipitantes de crises carcinóides, seja no momento da intubação e pelo uso de catecolaminas, devendo-se ter octreotide disponível para infusão venosa nestes casos. A hipotensão deve ser combatida com alfa-adrenégicos.

Prognóstico

A sobrevida em cinco anos para tumores primários ressecados sem evidências de metástases regionais ou a distância é excelente, sendo a mais baixa, 75% para tumores em intestino delgado. Metástases regionais já comprometem a sobrevida, exceto no caso do apêndice, em que esta continua 100% em cinco anos.

Além das metástases a distância, outras variáveis que afetam o prognóstico são o sexo masculino (pior prognóstico) e o grau de diferenciação tumoral (mais indiferenciado = pior prognóstico). A presença de síndrome carcinóide não é uma variável independente, já que reflete o grau de doença metastática. Mesmo no caso de tumores que não necessitam de metástases hepáticas para levar à síndrome, como o brônquico, geralmente quando há a síndrome carcinóide já há também metástases hepáticas.

Pacientes com metástases hepáticas têm uma sobrevida que varia de lo a 23 meses em média, refletindo o comportamento indolente do tumor.

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